Documentário acompanha descobertas de paleontólogos em Moçambique
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Moçambique é “uma parte do berço da Humanidade” com extensas florestas fósseis que se mantêm preservadas há mais de 250 milhões de anos. Agora, é a primeira geração de paleontólogos moçambicanos quem está a divulgar esta história, nomeadamente através de um documentário que mostra as suas descobertas, desde uma espécie com 259 milhões de anos à maior floresta fóssil do mundo.
O documentário “Projecto PaleoMoz: Moçambique, uma história por descobrir” dá a conhecer a equipa PaleoMoz, as suas ambições e as suas descobertas. A RFI falou com o seu realizador, Sebastian Crocco, e com o paleontólogo e investigador principal do projecto, Ricardo Araújo.
“O PaleoMoz é uma iniciativa entre Portugal e Moçambique de investigação, sobretudo focada na paleontologia, no sentido de proteger e valorizar o património paleontológico moçambicano e gerar a primeira geração de paleontólogos moçambicanos”, resume Ricardo Araújo, precisando que o projecto começou em 2009, que dois dos estudantes estão em doutoramento e que há uma rede de “várias dezenas de estudantes ao nível de licenciatura e mestrado que trabalharam connosco”.
A equipa tem andado a trabalhar naquela que é “a maior floresta fóssil do mundo”, na província de Tete, e descobriu uma espécie que até hoje só foi revelada em Moçambique, o dicinodonte, que baptizaram como “Niassodon Mfumakasi”, ou seja, “Rainha do Niassa”.
“É um dicinodonte que é uma espécie muito ancestral aos mamíferos. Está na linhagem evolutiva dos mamíferos, mas existiu antes de os mamíferos existirem. Os mamíferos surgem há cerca de 220 milhões de anos e este tipo de animais existiu em Moçambique – por isso é que Moçambique é tão importante – há cerca de 259 milhões de anos”, acrescenta o investigador.
A viagem a este passado com mais de 250 milhões de anos está cheia de surpresas. Além do dicinodonte do Niassa, a equipa chegou à conclusão que “a maior floresta fóssil do mundo está em Moçambique” na província de Tete.
“Isto começou com um trabalho de campo em 2016. Nós já sabíamos que havia lá vestígios de troncos fossilizados – aliás, os primeiros vestígios foram reportados por Livingstone, o famoso explorador em África no final do século XIX e ele próprio já tinha indiciado que existia lá troncos fossilizados que as pessoas utilizavam como tampos de mesas, etc. Nós fomos lá, começámos a tentar perceber a extensão da floresta fóssil e são mais de 100 quilómetros, na província de Tete, de extensão ininterrupta de troncos fossilizados, muitos deles com mais de dois metros de diâmetro, muitos deles com mais de uma dezena de metros de comprimento e alguns em posição original", explica o paleontólogo.
As florestas fósseis da província de Tete remontam a 256 milhões de anos e permitem ver como eram as florestas antes da “pior extinção de sempre” de há 252 milhões de anos. Já as florestas fósseis da província do Niassa têm registadas “o início da extinção em massa”, com sequências sedimentares completas que permitem ver as camadas de rochas para além da extinção.
“É um cenário desolador. Olhando para as rochas: não tem fósseis; os fósseis estão já todos muito fragmentados, muito partidos; não há qualquer indício de carvão, de matéria vegetal. Realmente, o Niassa tem essa capacidade de, nas rochas, contar-nos a história da maior extinção da vida na Terra”, acrescenta.
O investigador alerta que a extinção em massa de há 252 milhões de anos tem pontos em comum com os dias de hoje e deveria servir de aviso: “Há 252 milhões de anos deram-se grandes libertações de dióxido de carbono e metano para a atmosfera e essa libertação desses gases levou eventualmente à extinção em massa. Aquilo que acontece actualmente é exactamente a mesma coisa. Quando pegamos no carro todos os dias e ligamos o motor de combustão ou fazemos qualquer outra actividade que requeira a utilização de combustíveis fósseis. É um alerta que as rochas de Moçambique nos deixam para pensarmos exactamente sobre aquilo que está a decorrer nos dias de hoje”, avisa Ricardo Araújo.
O projecto PaleoMoz vai continuar a investigar o terreno e a ambição é que, um dia, as florestas fósseis de Moçambique sejam reconhecidas pela UNESCO como Património Mundial da Humanidade. O realizador chileno Sebastian Crocco quer, por isso, que o filme seja visto pelo maior número de pessoas para se poder salvaguardar e estudar esse mesmo património.
“É um património muito valioso. A maior floresta fóssil do mundo está ali e é uma coisa que eles têm de cuidar. Por isso, é importante que o documentário seja espalhado por Moçambique e pelo mundo para que as pessoas saibam que em Moçambique há muito material e há muita coisa por descobrir”, explica.
O documentário “Projecto PaleoMoz: Moçambique, uma história por descobrir” foi galardoado com o “Silver Award” no “International Tourism Film Festival 2022” na África do Sul; esteve na selecção oficial do “Wildlife Vaasa Film Festival”, na Finlândia; foi nomeado para o “Sibersalz Science & Media Awards”, na Alemanha; e recebeu uma menção honrosa no festival “Sci-On!”, nos Estados Unidos.
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