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Experiência do usuário como um ideal ético

 
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A experiência do usuário era originalmente um ideal a ser buscado, porém, acabou se tornando uma qualidade de projeto e depois um cargo responsável por esta qualidade. Frente aos desafios éticos que os produtos digitais estão pondo à profissão, faz-se necessário recuperar o ideal original proposto por Brenda Laurel.

Esse foi o tema abordado no meetup Ética em produtos digitais da comunidade Coproduto. A transcrição abaixo foi realizada gentilmente por Bruna Villar e Marina Neta.

Transcrição

Boa noite a todes. Vou falar sobre experiência do usuário como ideal ético. Essa é uma apresentação bem curta, direta, para tentar recuperar algo que a gente está hoje perdendo e que estava nas origens dessa disciplina chamada Experiência do Usuário (ExU). Essa é uma reflexão de um acadêmico falando sobre experiências que acontecem no nosso dia-a-dia no mercado de trabalho, mas que podem também ser transformadas através da nossa conscientização.

A questão fundamental da Ética é: qual é a maneira ideal do mesmo se relacionar com o Outro? Esses conceitos são um pouco filosóficos, mas eles têm uma referência concreta do dia-a-dia muito fácil de entender: o Mesmo é você e as pessoas são próximas a você, parecidas com você; o Outro é o distante, o diferente, aquele que não é igual a você. Então, Ética diz respeito à maneira como você se relaciona com "eles".

Existe a possibilidade de você ou do grupo que você faz parte ignorar esses outros. Pode ser também que você ou o grupo que você faz parte se considere superior ao outro. Ou, pior ainda, você pode se achar no direito, na vantagem, ou na oportunidade de colonizar, escravizar ou precarizar, que é reduzir as condições de trabalho do Outro.

A Ética nos ajuda a questionar se essas práticas podem ser consideradas morais ou imorais, justas ou injustas, mas, em última análise, a ética está se perguntando se isso é ético, porque acontece muito de uma coisa moral se tornar imoral conforme a gente vai mudando nossos padrões culturais.

Enquanto isso não acontece, nós temos a Ética como uma referência do ideal. A Ética confronta aquilo que temos como um comportamento normal, tradicional, até mesmo legal dentro do Direito. A Ética confronta o atual com aquilo que é o ideal, nos ajudando a repensar o Direito, nossos hábitos, nossos costumes e padrões culturais. É para isso que serve a Ética.

Vamos aplicar o pensamento da Ética na área de Design de Produto Digitais. Quem seria o Outro dos designers de produtos digitais? Para perceber isso, é preciso elevar o nível de consciência. No meme abaixo, é somente depois de ultrapassar o nível do fator de projeto que se percebe que o usuário é uma pessoa diferente do Mesmo, é o Outro.

Meme consciencia usuario

Se você expandir ainda mais a sua consciência, você vai perceber que você também é um usuário para outros designers, porque você usa produtos digitais aos quais você não projetou e você sofre, portanto, o que um usuário sofre.

Então, quais seriam os ideais do design de produtos digitais? Bom, nós temos um conceito de Experiência do Usuário que é diferente do conceito de Interface do Usuário, ou UI é diferente de UX.

No meme fica bem claro que as intenções dos designers, o que eles queriam que os usuários fizessem, não corresponde necessariamente ao que os usuários realmente fazem. Se a interface é complicada, o usuário vai buscar uma gambiarra, vai buscar uma maneira de realizar os seus desejos, que não necessariamente é a maneira "oficial", a maneira preferida pelos designers.

Isso é a origem do termo Experiência do Usuário, um ideal que foi perdido devido a um patriarcado. Quem definiu esse termo não foi Donald Norman. Na verdade, é um erro comum e antiético atribuir o crédito desse termo a este homem branco do Norte Global.

What if i told you don norman aint always right

Quem criou o termo Experiência do Usuário foi a designer, professora e pesquisadora Brenda Laurel. Em 1986 ela escreveu um capítulo que fez parte de um livro que o Norman editou e que ela falava que a experiência do usuário deveria ser um padrão ideal, não o que os usuários estão dispostos a aguentar ao interagir com a interface, mas sim a experiência ideal como ela deveria ser, de maneira que o usuário não sofra e que a gente sempre pense nesse ideal, persiga esse ideal.

[...] in seeking design principles for good interfaces, we must, it seems to me, concern ourselves with the best case, and ask, not what the users are willing to endure, but what the ideal user experience might be, and what sort of interface might provide it (Laurel, 1986, p. 72).

Norman utilizou esse termo de Outro jeito a partir de 1993 para definir o que dava para fazer dentro da Apple quando ele foi diretor do grupo responsável por essa área de interfaces e experiências do usuário. Essa informação consta até mesmo no histórico oficial da empresa de consultoria que ele fundou junto com Jakob Nielsen após ser demitido da Apple por ocasião da volta de Steve Jobs ao comando da empresa. Ele transformou o ideal da Experiência do Usuário em um cargo profissional.

Nngroup ux origin

Se recuperarmos o ideal, não importa o cargo profissional. O importante é confrontar constantemente o ideal da experiência do usuário com o atual da experiência do designer. Eu uso esse modelo que ajuda visualmente a pensar sobre essa diferença. A experiência do designer nunca é igual à experiência do usuário, porque se tratam de pessoas diferentes, de grupos sociais diferentes.

Mesmo Outro ux design

Enquanto designers costumam ser pessoas que têm privilégios, que têm várias vantagens dentro da sociedade (tanto é que chegaram na posição em que eles podem definir como vão ser as interfaces do sistema) os outros, os usuários, as pessoas pobres, negras, indígenas, mulheres e demais, muitas vezes só conseguem ter experiências de usuárias, porque é o que cabe dentro da nossa divisão do trabalho na produção de produtos digitais.

Então, é importante colocar-se na posição de reconhecer que você possui privilégios quando você é designer, ao mesmo tempo em que existem outras pessoas que possuem menos privilégios. O que você faz quando se conscientiza de seus privilégios? Você compartilha seu poder para que haja uma equalização gradual dessa relação para que, no futuro, exista uma outra relação de produção digital em que todo mundo seja designer de seus próprios sistemas.

Quando a experiência do usuário é projetada como ideal, acredita-se, então, que sempre é possível fazer melhor para o Outro do que a solução atual. E é assim que eu ensino os meus estudantes de design a se preocuparem com os outros. Na imagem abaixo, vê-se um projeto de experiência de música aumentada, na qual os estudantes criam vários estímulos táteis, sonoros e olfativos, pensando no corpo de outra pessoa, em como ela vai interagir, como ela vai sentir a experiência musical. Assim, vão percebendo como pessoas diferentes vão dar sentidos diferentes para a proposta, nunca da mesma maneira como designers gostariam que fosse.

Experimento musica aumentada

Fazer melhor para o Outro, então, implica sempre em cuidar, aprender e se deixar transformar pela interação com o Outro. Isso é um princípio ético do design de experiência do usuário que está sendo perdido quando o Outro é tratado como um apêndice, uma peça do sistema, ou, principalmente, como apenas um número dentro de uma planilha de estatísticas, com metas para bater.

Obrigado e espero que a gente tenha um diálogo interessante a respeito dessa provocação.

Vídeo

O vídeo abaixo contém o debate completo organizado pela comunidade Coproduto.

Áudio

Experiência do usuário como um ideal ético MP3 8min

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A experiência do usuário era originalmente um ideal a ser buscado, porém, acabou se tornando uma qualidade de projeto e depois um cargo responsável por esta qualidade. Frente aos desafios éticos que os produtos digitais estão pondo à profissão, faz-se necessário recuperar o ideal original proposto por Brenda Laurel.

Esse foi o tema abordado no meetup Ética em produtos digitais da comunidade Coproduto. A transcrição abaixo foi realizada gentilmente por Bruna Villar e Marina Neta.

Transcrição

Boa noite a todes. Vou falar sobre experiência do usuário como ideal ético. Essa é uma apresentação bem curta, direta, para tentar recuperar algo que a gente está hoje perdendo e que estava nas origens dessa disciplina chamada Experiência do Usuário (ExU). Essa é uma reflexão de um acadêmico falando sobre experiências que acontecem no nosso dia-a-dia no mercado de trabalho, mas que podem também ser transformadas através da nossa conscientização.

A questão fundamental da Ética é: qual é a maneira ideal do mesmo se relacionar com o Outro? Esses conceitos são um pouco filosóficos, mas eles têm uma referência concreta do dia-a-dia muito fácil de entender: o Mesmo é você e as pessoas são próximas a você, parecidas com você; o Outro é o distante, o diferente, aquele que não é igual a você. Então, Ética diz respeito à maneira como você se relaciona com "eles".

Existe a possibilidade de você ou do grupo que você faz parte ignorar esses outros. Pode ser também que você ou o grupo que você faz parte se considere superior ao outro. Ou, pior ainda, você pode se achar no direito, na vantagem, ou na oportunidade de colonizar, escravizar ou precarizar, que é reduzir as condições de trabalho do Outro.

A Ética nos ajuda a questionar se essas práticas podem ser consideradas morais ou imorais, justas ou injustas, mas, em última análise, a ética está se perguntando se isso é ético, porque acontece muito de uma coisa moral se tornar imoral conforme a gente vai mudando nossos padrões culturais.

Enquanto isso não acontece, nós temos a Ética como uma referência do ideal. A Ética confronta aquilo que temos como um comportamento normal, tradicional, até mesmo legal dentro do Direito. A Ética confronta o atual com aquilo que é o ideal, nos ajudando a repensar o Direito, nossos hábitos, nossos costumes e padrões culturais. É para isso que serve a Ética.

Vamos aplicar o pensamento da Ética na área de Design de Produto Digitais. Quem seria o Outro dos designers de produtos digitais? Para perceber isso, é preciso elevar o nível de consciência. No meme abaixo, é somente depois de ultrapassar o nível do fator de projeto que se percebe que o usuário é uma pessoa diferente do Mesmo, é o Outro.

Meme consciencia usuario

Se você expandir ainda mais a sua consciência, você vai perceber que você também é um usuário para outros designers, porque você usa produtos digitais aos quais você não projetou e você sofre, portanto, o que um usuário sofre.

Então, quais seriam os ideais do design de produtos digitais? Bom, nós temos um conceito de Experiência do Usuário que é diferente do conceito de Interface do Usuário, ou UI é diferente de UX.

No meme fica bem claro que as intenções dos designers, o que eles queriam que os usuários fizessem, não corresponde necessariamente ao que os usuários realmente fazem. Se a interface é complicada, o usuário vai buscar uma gambiarra, vai buscar uma maneira de realizar os seus desejos, que não necessariamente é a maneira "oficial", a maneira preferida pelos designers.

Isso é a origem do termo Experiência do Usuário, um ideal que foi perdido devido a um patriarcado. Quem definiu esse termo não foi Donald Norman. Na verdade, é um erro comum e antiético atribuir o crédito desse termo a este homem branco do Norte Global.

What if i told you don norman aint always right

Quem criou o termo Experiência do Usuário foi a designer, professora e pesquisadora Brenda Laurel. Em 1986 ela escreveu um capítulo que fez parte de um livro que o Norman editou e que ela falava que a experiência do usuário deveria ser um padrão ideal, não o que os usuários estão dispostos a aguentar ao interagir com a interface, mas sim a experiência ideal como ela deveria ser, de maneira que o usuário não sofra e que a gente sempre pense nesse ideal, persiga esse ideal.

[...] in seeking design principles for good interfaces, we must, it seems to me, concern ourselves with the best case, and ask, not what the users are willing to endure, but what the ideal user experience might be, and what sort of interface might provide it (Laurel, 1986, p. 72).

Norman utilizou esse termo de Outro jeito a partir de 1993 para definir o que dava para fazer dentro da Apple quando ele foi diretor do grupo responsável por essa área de interfaces e experiências do usuário. Essa informação consta até mesmo no histórico oficial da empresa de consultoria que ele fundou junto com Jakob Nielsen após ser demitido da Apple por ocasião da volta de Steve Jobs ao comando da empresa. Ele transformou o ideal da Experiência do Usuário em um cargo profissional.

Nngroup ux origin

Se recuperarmos o ideal, não importa o cargo profissional. O importante é confrontar constantemente o ideal da experiência do usuário com o atual da experiência do designer. Eu uso esse modelo que ajuda visualmente a pensar sobre essa diferença. A experiência do designer nunca é igual à experiência do usuário, porque se tratam de pessoas diferentes, de grupos sociais diferentes.

Mesmo Outro ux design

Enquanto designers costumam ser pessoas que têm privilégios, que têm várias vantagens dentro da sociedade (tanto é que chegaram na posição em que eles podem definir como vão ser as interfaces do sistema) os outros, os usuários, as pessoas pobres, negras, indígenas, mulheres e demais, muitas vezes só conseguem ter experiências de usuárias, porque é o que cabe dentro da nossa divisão do trabalho na produção de produtos digitais.

Então, é importante colocar-se na posição de reconhecer que você possui privilégios quando você é designer, ao mesmo tempo em que existem outras pessoas que possuem menos privilégios. O que você faz quando se conscientiza de seus privilégios? Você compartilha seu poder para que haja uma equalização gradual dessa relação para que, no futuro, exista uma outra relação de produção digital em que todo mundo seja designer de seus próprios sistemas.

Quando a experiência do usuário é projetada como ideal, acredita-se, então, que sempre é possível fazer melhor para o Outro do que a solução atual. E é assim que eu ensino os meus estudantes de design a se preocuparem com os outros. Na imagem abaixo, vê-se um projeto de experiência de música aumentada, na qual os estudantes criam vários estímulos táteis, sonoros e olfativos, pensando no corpo de outra pessoa, em como ela vai interagir, como ela vai sentir a experiência musical. Assim, vão percebendo como pessoas diferentes vão dar sentidos diferentes para a proposta, nunca da mesma maneira como designers gostariam que fosse.

Experimento musica aumentada

Fazer melhor para o Outro, então, implica sempre em cuidar, aprender e se deixar transformar pela interação com o Outro. Isso é um princípio ético do design de experiência do usuário que está sendo perdido quando o Outro é tratado como um apêndice, uma peça do sistema, ou, principalmente, como apenas um número dentro de uma planilha de estatísticas, com metas para bater.

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