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Ep48 | A omertà e a bomba-relógio

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Atendendo à natureza censurável do fenómeno, a corrupção resulta da criação e manutenção de contextos complexos de sociabilização entre os actores, o que diminui, em muito, a necessidade de linguagem explícita.

Cria-se um clima de negócio assente na confiança e na reciprocidade entre as partes (a omertà): subentende-se o que é preciso fazer e conhecem-se os ganhos para cada um dos players implicados.”

Yves Méni, in La Corruption de la République

Nos seus tempos de estudante na escola de juízes, Ivo Rosa deve ter-se baldado às aulas que tratavam da corrupção. O homem deixou cair todas as acusações de corrupção do processo da Operação Marquês.
Todas. Tanto as referentes a Ricardo Salgado (que pensava e operava no mundo dos milhares de milhões de euros), como as dos outros arguidos mais modestos (um deles, patético, fez-lhe o favor de monopolizar a atenção dos media, até teve escolta das televisões desde a sua casa na Ericeira até ao tribunal).
Repito: caíram todas as acusações de corrupção, quer as do ex-dono-disto-tudo, quer as das outras figuras menores. Todas. Para o juiz Rosa, um corrupto só vai preso se registar no notário a promessa de “peita”, com assinaturas reconhecidas e emolumentos pagos.
Na sua decisão instrutória de 9 de Abril, o juiz até desconsiderou o testemunho de Hélder Bataglia, o único facto surpreendente neste processo, que, de certeza, terá causado um calafrio sério a Ricardo Salgado. Um espanto inesperado: Bataglia quebrara a omertà, apesar de, entre nós, não estar prevista na lei a “colaboração premiada”.
Enfim, o perigo passou. O ex-dono-disto-tudo pode voltar a dormir descansado. O juiz Rosa não achou credível aquele testemunho, apesar de ter reconhecido que, no processo, há documentação bancária que comprova a viagem de doze milhões de euros de Ricardo Salgado para Hélder Bataglia, deste para Joaquim Barroca, e do homem do Grupo Lena para os “mercadejadores” Carlos Santos Silva e José Sócrates.
O juiz Rosa não acreditou em nenhuma testemunha da acusação, só aceitou como boa a conversa de figurões socráticos como Paulo Campos, Teixeira dos Santos, Costa Pina ou a dupla a que Hugo Chávez chamava “Pino e Lino, Lino e Pino”.
Tudo isto é uma anedota que deixou o país furioso a buzinar nas ruas e a assinar petições estúpidas para correr com o juiz. Que, evidentemente, e ainda bem, é inamovível.

Em 21 de Dezembro de 2018, escrevi aqui o seguinte: “os inconseguimentos da justiça no combate à corrupção são uma bomba-relógio no coração da terceira república. É necessário criminalizar o enriquecimento ilícito, meter logo na cadeia os corruptos após condenação em segunda instância, instituir a colaboração premiada para quebrar a omertà corrupta.”
Depois de ter despedido a Procuradora-Geral da República e o presidente do Tribunal de Contas que estavam a fazer bem o seu trabalho, o trio Marcelo / Costa / Rio vai agora tentar matar à nascença, ou reprimir, qualquer movimento inorgânico contestário. Os organizadores do buzinão de Viseu e de Lisboa não estranhem se vierem a ter alguns dissabores e os independentes que querem concorrer às próximas autárquicas preparem-se para todos os truques sujos do cartel partidário.
Para tentar aplacar a revolta popular causada por este “lindo serviço” do juiz Rosa, é provável que os partidos venham agora tentar o velho truque leopárdico de Don Fabrizio, príncipe de Salina: “é preciso mexer alguma coisa para que tudo fique na mesma.”
Não haja ilusões: ou os portugueses se mobilizam a sério, ou não vamos ter nem colaboração premiada, nem prisão de corruptos depois de condenação em segunda instância. E mesmo que o parlamento dê à luz alguma lei contra o “enriquecimento injustificado”, ela vai ter mais buracos do que um queijo suíço.
A justiça da terceira república só funciona para os pequenos. O peixe graúdo safa-se sempre. Se ainda havia algumas dúvidas, este episódio de Ricardo Salgado e dos seus “assalariados” acaba de as dissipar.
Descrença. Desânimo. Pântano. Uma bomba-relógio que a ultradireita agradece.

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Cria-se um clima de negócio assente na confiança e na reciprocidade entre as partes (a omertà): subentende-se o que é preciso fazer e conhecem-se os ganhos para cada um dos players implicados.”

Yves Méni, in La Corruption de la République

Nos seus tempos de estudante na escola de juízes, Ivo Rosa deve ter-se baldado às aulas que tratavam da corrupção. O homem deixou cair todas as acusações de corrupção do processo da Operação Marquês.
Todas. Tanto as referentes a Ricardo Salgado (que pensava e operava no mundo dos milhares de milhões de euros), como as dos outros arguidos mais modestos (um deles, patético, fez-lhe o favor de monopolizar a atenção dos media, até teve escolta das televisões desde a sua casa na Ericeira até ao tribunal).
Repito: caíram todas as acusações de corrupção, quer as do ex-dono-disto-tudo, quer as das outras figuras menores. Todas. Para o juiz Rosa, um corrupto só vai preso se registar no notário a promessa de “peita”, com assinaturas reconhecidas e emolumentos pagos.
Na sua decisão instrutória de 9 de Abril, o juiz até desconsiderou o testemunho de Hélder Bataglia, o único facto surpreendente neste processo, que, de certeza, terá causado um calafrio sério a Ricardo Salgado. Um espanto inesperado: Bataglia quebrara a omertà, apesar de, entre nós, não estar prevista na lei a “colaboração premiada”.
Enfim, o perigo passou. O ex-dono-disto-tudo pode voltar a dormir descansado. O juiz Rosa não achou credível aquele testemunho, apesar de ter reconhecido que, no processo, há documentação bancária que comprova a viagem de doze milhões de euros de Ricardo Salgado para Hélder Bataglia, deste para Joaquim Barroca, e do homem do Grupo Lena para os “mercadejadores” Carlos Santos Silva e José Sócrates.
O juiz Rosa não acreditou em nenhuma testemunha da acusação, só aceitou como boa a conversa de figurões socráticos como Paulo Campos, Teixeira dos Santos, Costa Pina ou a dupla a que Hugo Chávez chamava “Pino e Lino, Lino e Pino”.
Tudo isto é uma anedota que deixou o país furioso a buzinar nas ruas e a assinar petições estúpidas para correr com o juiz. Que, evidentemente, e ainda bem, é inamovível.

Em 21 de Dezembro de 2018, escrevi aqui o seguinte: “os inconseguimentos da justiça no combate à corrupção são uma bomba-relógio no coração da terceira república. É necessário criminalizar o enriquecimento ilícito, meter logo na cadeia os corruptos após condenação em segunda instância, instituir a colaboração premiada para quebrar a omertà corrupta.”
Depois de ter despedido a Procuradora-Geral da República e o presidente do Tribunal de Contas que estavam a fazer bem o seu trabalho, o trio Marcelo / Costa / Rio vai agora tentar matar à nascença, ou reprimir, qualquer movimento inorgânico contestário. Os organizadores do buzinão de Viseu e de Lisboa não estranhem se vierem a ter alguns dissabores e os independentes que querem concorrer às próximas autárquicas preparem-se para todos os truques sujos do cartel partidário.
Para tentar aplacar a revolta popular causada por este “lindo serviço” do juiz Rosa, é provável que os partidos venham agora tentar o velho truque leopárdico de Don Fabrizio, príncipe de Salina: “é preciso mexer alguma coisa para que tudo fique na mesma.”
Não haja ilusões: ou os portugueses se mobilizam a sério, ou não vamos ter nem colaboração premiada, nem prisão de corruptos depois de condenação em segunda instância. E mesmo que o parlamento dê à luz alguma lei contra o “enriquecimento injustificado”, ela vai ter mais buracos do que um queijo suíço.
A justiça da terceira república só funciona para os pequenos. O peixe graúdo safa-se sempre. Se ainda havia algumas dúvidas, este episódio de Ricardo Salgado e dos seus “assalariados” acaba de as dissipar.
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