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Conteúdo fornecido por Jorge Correia. Todo o conteúdo do podcast, incluindo episódios, gráficos e descrições de podcast, é carregado e fornecido diretamente por Jorge Correia ou por seu parceiro de plataforma de podcast. Se você acredita que alguém está usando seu trabalho protegido por direitos autorais sem sua permissão, siga o processo descrito aqui https://pt.player.fm/legal.
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Como comunicar eficazmente em crises de saúde? Graça de Freitas

58:39
 
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Há dois tipos de comunicação especialmente difíceis e arriscados.

Porque são complexos, porque acontecem em conta-relógio e porque a audiência está particularmente sensível nesse espaço de tempo.

Esses dois tipos de comunicação, são a comunicação de crise e a comunicação de risco.

Trocando por miúdos, a comunicação de crise é aquela que temos de usar quando algo correu mal: um acidente, um incêndio, um qualquer evento onde existe um dano real ou potencial a pessoas, ou bens. Principalmente pessoas.

A comunicação de risco em saúde pública é aquela que todos beneficiamos aquando da pandemia de COVID-19.

Essa comunicação teve como face principal Graça de Freitas, médica de saúde pública e ao tempo diretora-geral da saúde.

Esta conversa é sobre a dificuldade de planear, reagir e responder de forma credível a uma das maiores ameaças que vivemos na nossa vida coletiva.

Um manual do uso da comunicação tem tempos sem livro de instruções.

Todos sentimos:

A incerteza era o dia-a-dia.

Quando chega a pandemia?

Quando chega o vírus?

Vai matar-me?

Como me salvo desta?

Lembram-se?

Era este o ambiente que todos vivemos quando percebemos que a anunciada pandemia chegou.

Vivemos o receio, o medo, a dúvida.

Vivemos a angústia de ficar presos em casa por decreto geral.

Das escolas que fecharam. Dos lares com dezenas de idosos doentes.

Com hospitais cheios. Com ambulâncias em marcha.

Isto foi o que todos vimos em casa.

Mas no olho do furacão pandémico, no centro de crise e resposta está Graça de Freitas. Não está sozinha, mas tem uma equipa muito curta.

A ela cabe-lhe conseguir consensos entre cientistas e boas explicações e prognósticos para os decisores políticos.

No meio de tudo isto há que explicar aos cidadãos o que está a acontecer, como nos protegemos, como vivemos com isto.

No tempo das redes sociais.

Onde a opinião do mais sabedor dos cientistas parece valer tanto ou menos que o cidadão dedicado à arte nacional da opinião gratuita sobre tudo.

Mas mesmo no centro de comando, onde toda a informação chegava, onde todos os pensadores filtravam e tentavam entender o mundo, mesmo aí, havia demasiada informação, demasiadas contradições e um avassalador relógio que corria mais do que qualquer evidência.

Mais do que nunca o teste à credibilidade das fontes é critico. Mas a rapidez da comunicação digital e localizada não podia ser ignorada.

A pandemia deveria ser por si só um objeto de estudo detalhado da comunicação de risco. Eu já comecei a ler esse livro.

A Comunicação em Tempos de Informação Imperfeita

Um dos temas mais fascinantes abordados neste episódio é o desafio de comunicar quando a informação está longe de ser completa ou perfeita. “A informação era imperfeita, os dados mudavam a toda a hora”, lembra Graça Freitas, explicando que, muitas vezes, as diretrizes que comunicava ao público eram baseadas em informação que podia ser revista ou até desmentida pouco depois. “O grau de imperfeição era grande”, confessa, num tom honesto que caracteriza toda a sua participação no podcast.

Este cenário reflete um dos maiores dilemas da comunicação em saúde pública: como ser honesto e transparente quando as certezas são escassas? Graça optou sempre pela clareza e pela sinceridade. Reconhece que, em muitos momentos, teve de comunicar incertezas e explicar o que ainda não se sabia. Este equilíbrio entre a informação e a cautela foi uma linha ténue que teve de trilhar durante todo o período pandémico.

Medo, Resiliência e o Lado Pessoal da Pandemia

Outro ponto alto da conversa é quando Graça Freitas reflete sobre o medo. No início, confessa, não teve tempo para sentir medo pessoal, pois estava absorvida em compreender o que estava a acontecer. No entanto, à medida que o número de casos aumentava, especialmente em Itália, e o mundo começava a fechar as suas portas, o medo tornou-se uma realidade inevitável.

Mas talvez o relato mais surpreendente seja o momento em que a Dra. Graça começa a receber proteção policial devido a ameaças. “Nunca pensei que precisaria de proteção”, revela, descrevendo o choque de saber que um segurança estaria à porta da casa todos os dias. Este episódio mostra o lado mais humano da crise: a carga emocional e pessoal que quem esteve na linha da frente teve de carregar.

Memes e Piadas: Rir para Não Chorar

Num tom mais leve, Graça Freitas fala sobre os memes e piadas que circularam nas redes sociais a seu respeito durante os momentos mais difíceis da pandemia. Ela admite que achou graça a muitos deles. O humor, para ela, foi uma forma de a população lidar com a tensão constante, e, em alguns momentos, também serviu para ela própria aliviar o peso da responsabilidade. No entanto, Graça confessa que o que mais a magoou não foram as piadas, mas a ausência de defesa de algumas pessoas que a conheciam bem e que, durante os momentos de maior crítica, escolheram o silêncio. “Doeu mais não ouvir um ‘ela não é assim tão má’ do que as críticas em si”, diz com honestidade.

Lições sobre Comunicação em Saúde Pública

Este episódio deixa lições claras sobre o que significa comunicar em tempos de crise. Graça Freitas sublinha a importância de ser transparente, mesmo quando as respostas não são certas. A honestidade foi a sua bússola durante toda a pandemia, sabendo que esconder a realidade ou suavizar as mensagens poderia ser ainda mais prejudicial a longo prazo. Esta abordagem honesta, contudo, não foi fácil de manter. Graça admite que, se pudesse voltar atrás, teria dedicado mais tempo a refletir sobre as decisões, reservando momentos para pensar com mais calma e ouvir mais opiniões externas.

Outro ponto interessante que ela aborda é o equilíbrio entre as recomendações dos cientistas e as decisões dos políticos. Como Diretora-Geral da Saúde, Graça tinha a responsabilidade de fornecer as melhores recomendações científicas, mas reconhece que os políticos, ao tomarem as decisões finais, lidavam com uma pressão diferente. Eles não só estavam preocupados com a saúde pública, mas também com as implicações sociais, económicas e políticas. Esta tensão entre ciência e política é um elemento central nas crises de saúde pública e, segundo Graça, foi um dos grandes desafios da pandemia.

Fechar as Escolas: Uma Decisão Crucial

Um dos momentos mais dramáticos da pandemia foi a decisão de fechar as escolas. Graça Freitas descreve este episódio como um dos mais rápidos e intensos que viveu durante aqueles meses. Ela lembra que, num domingo, estava em casa de uma amiga quando recebeu o telefonema da Ministra da Saúde, Marta Temido. Poucas horas depois, já estava numa conferência de imprensa, anunciando uma das medidas mais duras e impactantes para o país.

Para ela, este é um exemplo claro de como as decisões políticas, mesmo quando baseadas em recomendações científicas, são tomadas de forma muito rápida e, por vezes, sem o tempo necessário para refletir sobre todas as implicações. No entanto, Graça reconhece que, em muitos casos, essa rapidez era essencial para salvar vidas e minimizar o impacto da crise.

Reflexões Finais

O episódio termina com Graça Freitas a refletir sobre o seu papel durante a pandemia e o impacto que teve no país. Ao olhar para trás, ela admite que faria algumas coisas de forma diferente, mas mantém a convicção de que fez o melhor que podia com a informação disponível. O legado que deixa não é só o de uma profissional de saúde pública dedicada, mas também de uma comunicadora que, mesmo em tempos de incerteza, soube manter a calma, a integridade e a transparência.

Este episódio do “Pergunta Simples” é uma verdadeira aula sobre comunicação em tempos de crise, repleta de momentos humanos e reveladores. As histórias e as lições de Graça Freitas oferecem uma perspetiva única sobre os desafios enfrentados por quem esteve na linha da frente da pandemia e, ao mesmo tempo, mostram o lado mais vulnerável e pessoal da comunicação em saúde pública.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

00:00:12:23 – 00:00:38:24
JORGE CORREIA
Olá! Viva um Bem vindos ao Pergunta simples do vosso full cast sobre comunicação. Há dois tipos de comunicação especialmente difíceis e arriscados, mas necessários e importantes. São complexos porque acontecem em contrarrelógio e porque a audiência está particularmente sensível nesse espaço de tempo ou local. Estes dois tipos de comunicação são a comunicação de crise e a comunicação de risco.

00:00:39:05 – 00:01:11:01
JORGE CORREIA
Parecem a mesma coisa, mas não são exactamente a mesma coisa. Trocando por miúdos, a comunicação de crise é aquela que temos de usar quando algo corre mal um acidente, um incêndio, um qualquer evento onde exista um dano real ou potencial para pessoas ou bens, principalmente pessoas. Um outro tipo de comunicação difícil é a comunicação de risco, em particular a comunicação de risco em saúde pública é aquela que todos beneficiamos quando aconteceu a pandemia de Calvi 19.

00:01:11:03 – 00:01:34:12
JORGE CORREIA
Esta comunicação teve como face principal Graça de Freitas, médica de Saúde Pública e, ao tempo Directora Geral de Saúde. Esta conversa é sobre a dificuldade de planear, reagir e responder de forma credível a uma das maiores ameaças que vivemos na nossa vida colectiva. Não só responder à ameaça propriamente dita, mas também comunicar sobre aquilo que nos estava a acontecer.

00:01:34:14 – 00:01:52:03
JORGE CORREIA
No fundo, como escrever um manual de uso da comunicação de risco em saúde pública em tempos sem livro de instruções?

00:01:52:05 – 00:02:14:06
JORGE CORREIA
A incerteza era o dia a dia. Quando chega a pandemia, quando chega, o vírus Vai matar me com um salve desta. Lembram se? Estas eram as perguntas que todos fazíamos todos os dias. Era este o ambiente que todos vivíamos quando percebemos que a anunciada pandemia chegou. Vivemos o receio, o medo, a dúvida, a esperança e depois o conseguir passar à frente.

00:02:14:12 – 00:02:35:15
JORGE CORREIA
Vivemos a angústia de ficar presos em casa, por decreto geral das escolas que fecharam dos lares com dezenas de idosos doentes de uma só vez, com hospitais cheios, com ambulâncias em marcha. Isto foi o que todos vimos em casa, mas no olho do furacão Pandemic, no centro de Crise e resposta está a Graça de Freitas. Ela não está sozinha, mas tem uma equipa francamente curta.

00:02:35:20 – 00:03:04:04
JORGE CORREIA
A ela cabe lhe conseguir consensos entre cientistas e boas explicações e prognósticos para os decisores políticos. No meio de tudo isto, há que explicar aos cidadãos o que está a acontecer, como nos protegemos e como vivemos Com isto tudo no tempo das redes sociais, onde a opinião do mais sabedor dos cientistas parece valer tanto ou menos do que a do cidadão dedicado à arte nacional, da opinião gratuita sobre tudo e sobre nada ao mesmo tempo.

00:03:04:06 – 00:03:33:16
JORGE CORREIA
No centro de comando, onde toda a informação chegava, onde todos os pensadores filtravam e tentavam entender o mundo, mesmo aí havia demasiada informação, demasiadas contradições e um avassalador relógio que corria mais do que qualquer evidência. Havia fontes, mas as fontes muitas vezes contradiziam se. Mais do que nunca, o teste à credibilidade das fontes é crítico, mas a rapidez da comunicação digital é localizada e não podia ser ignorada.

00:03:33:18 – 00:03:46:09
JORGE CORREIA
A pandemia deveria ser, por si só, um objecto de estudo detalhado da comunicação de risco. E eu já comecei a ler este livro nesta edição.

00:03:46:11 – 00:04:15:19
JORGE CORREIA
Viva Dra. Graça de Freitas, Médica de Saúde Pública. Se calhar nem sequer é preciso apresentá la. Decidiu ser directora geral da Saúde no período mais assustador para a nossa saúde nos últimos anos. Para aquela pergunta que é onde é que estava no 25 Abril 1974, neste caso, e onde é que estava no dia E no momento em que leu a notícia ou alguém comunicou da OMS que a pandemia vinha aí?

00:04:15:21 – 00:04:42:24
GRAÇA DE FREITAS
Eu não sei onde é que estava nesse dia, porque para mim tudo começou muito antes e sei onde é que estava. No dia 31 de dezembro de 2019. Estava muito bem, muito contente e muito optimista em relação ao ano 2020. Estava com uma fezada que 20 20 ia ser um ano fantástico, números redondos repetidos, não era bem uma capicua, mas estava mesmo como uma, pois não acreditava que 20 20 ia ser um ano fantástico.

00:04:43:01 – 00:05:01:19
GRAÇA DE FREITAS
E depois, como sabe, no dia seguinte percebeu se que havia um novo vírus. Mas não é a primeira vez que havia o novo vírus. Nós que trabalhamos em saúde pública e quem tem acesso a estes dados vi emergirem. Vírus de uns nunca chegam a ser problemáticos, outros evoluem para pequenos problemas, outros são cometidos bem.

00:05:01:21 – 00:05:05:18
JORGE CORREIA
E era quase uma matemática certa de que um dia, um dia.

00:05:05:20 – 00:05:23:23
GRAÇA DE FREITAS
Chuvisca e eu já tinha passado. E noto bem, por uma pandemia como profissional de saúde, eu passei pela pandemia de gripe A, que estava à espera de uma coisa terrível e que depois, apesar de ter sido uma pandemia, ocupou todo o mundo. Foi ligeiro, o vírus não era assim tão agressivo e.

00:05:23:24 – 00:05:26:10
JORGE CORREIA
Isso, isso foi dez anos antes da pandemia, até.

00:05:26:11 – 00:05:55:04
GRAÇA DE FREITAS
Mais do que dez anos antes. A gripe A, creio, se a memória não me falha, foi em 2009 e, portanto, foram 11 anos antes. Mas de qualquer maneira, foi uma pandemia para a qual estávamos altamente preparados. Tínhamos feito um livro inteiro na DGS, escrevemos um livro para vírus respiratórios, para a temida gripe. O professor Correia de Campos, durante um ano, autorizou uma task force que ocupou um país inteiro da DGS, com gente da privada, do público.

00:05:55:05 – 00:06:29:24
GRAÇA DE FREITAS
Todos os sectores que só fizeram aquele livro trabalharam para aquele livro e muitos especialistas colaboraram connosco. Bem, dito isto, sei onde é que estava na noite da véspera do ano de 2020, muito satisfeita com o novo ano e sei onde é que estava no dia 21 de Janeiro. Foi quando criei as forças como diretora geral, Quando eu percebi que era irreversível, grande ou pequena, não sabia as características exactamente, Também não, mas que o melhor era internamente, com ascendente direcção da DGS da OMS, a DGS.

00:06:29:24 – 00:06:30:14
GRAÇA DE FREITAS
Preparar se.

00:06:30:18 – 00:06:39:11
JORGE CORREIA
O que se pensa nessa altura? Pensa se ok, vamos fazer isto porque estamos preparados para o fazer. Ou Ohmeudeus, saiu uma fava.

00:06:39:13 – 00:07:05:21
GRAÇA DE FREITAS
Não? Eu na altura ainda estava. Eu estava calma e controlada, mas tinha a sensação que podia ser pior do que nas outras alturas. Tanto isso que fiquei bastante desconfortável com a placidez com que alguns dos meus colaboradores estavam. Eu já estava em estado não plácido por isso e cortei. Decretei a criação daquela task force, mas havia muita gente que estava ainda muito a dizer o vai ser como é.

00:07:05:21 – 00:07:26:02
GRAÇA DE FREITAS
Já tivemos outras emergências, os Marburg, já sabes, não era a primeira emergência que tínhamos, não era a primeira vez que a ativava nos motores Force no meu tempo ou no Dr. Francisco Jorge e portanto, havia alguma calma. Olhe para mim nesse dia também. Nunca mais me esqueço. Foi a primeira vez que eu mandei vir comida para a DGS de levar por motorizadas e estafetas.

00:07:26:02 – 00:07:36:24
GRAÇA DE FREITAS
Nunca tinha usado aquele método, o mundo era outro e foi a primeira vez que me dei comigo a escolher comida para fazer uma refeição à noite nocturna na DG.

00:07:37:02 – 00:07:58:15
JORGE CORREIA
Há um choque mediático, lá está, para lidar com essa incerteza que é a pergunta, repete se quando começamos a saber que há um vírus algures lá no Oriente e é Rebanhão. A Dra. Graça de Freitas num sítio qualquer. E perguntam então a pandemia? É desta que vem aí que é séria? Eu lembro que a resposta foi, por um lado, tranquilizadora.

00:07:58:17 – 00:08:23:02
JORGE CORREIA
A minha perceção dessa altura foi calma, que ainda não é desta ou ainda não é agora, ou não é iminente que o vírus da vaca vai chegar. E isso, isso depende. Isso é porque não há informação suficiente, porque não é antecipada ou que aconteça, ou porque o raio destes cientistas teimosos da task force na realidade estavam a dizer calma que isto vai ser igual a sempre.

00:08:23:04 – 00:08:33:10
GRAÇA DE FREITAS
Não foram, creio eu, três coisas distintas. Pensando agora na sua pergunta, a primeira foi toda a experiência passada, nomeadamente de facto com a gripe.

00:08:33:15 – 00:08:34:16
JORGE CORREIA
A, o Pedrinho.

00:08:34:18 – 00:08:59:08
GRAÇA DE FREITAS
O Pedro e o Lobo. Nós estávamos preparados em 1997 com o professor Constantino Sartori. Despedimo nos quase na véspera de Natal. Eu dizia Deus queira que já não seja. Este Natal tinha sido a matança das gripes e das galinhas em Hong-Kong. Foi a nossa primeira proto pandemia. Portanto, estávamos à beira de um abismo e estávamos apavorados. O vírus era do pior, era o H5N1 aviário das galinhas.

00:08:59:08 – 00:09:00:00
JORGE CORREIA
E esse matava.

00:09:00:00 – 00:09:40:21
GRAÇA DE FREITAS
Me. Letalidade brutal. Matava mesmo. Matou muita gente em Hong Kong e, portanto, estávamos muito assustados e a partir daí não havia preparação nenhuma. Em quase país nenhum eu encontrei um plano contingência para a dita da gripe de duas páginas da Bélgica e foi uma coisa maravilhosa que nos guiou e ajudou a fazer um plano para Portugal. Tanto. Por um lado, tínhamos essa experiência toda do H5N1, gripe das galinhas, a gripe das aves, uma grande expectativa, enfim, aquela célebre comissão de acompanhamento da gripe aviária, cujo acrónimo o Jorge Correia fez o favor de me dizer, logo cinco minutos depois da nomeação em Diário da República.

00:09:40:21 – 00:09:42:21
JORGE CORREIA
E não era capaz de ser um nome bom.

00:09:43:00 – 00:09:48:23
GRAÇA DE FREITAS
Não era um nome bom, atendendo a circunstâncias bom CH. E portanto.

00:09:49:03 – 00:09:53:15
JORGE CORREIA
A comissão chamava se Caga Convenção, acrónimo Ipso facto, é verdade em termos de comunicação ninguém.

00:09:53:15 – 00:10:17:07
GRAÇA DE FREITAS
Reparou, atendendo que metia galinhas e que caca de galinhas não foi uma boa ideia. Bem, dito isto, havia esse passado o SARS. Não se esqueça que o vazar daí sim, um susto terrível. Este vírus se chamava Chaves, como dois já outros vídeos do SARS e o primeiro SARS verdadeiramente perigoso foi o de passar de 2003, mas esse apareceu.

00:10:17:09 – 00:10:28:12
JORGE CORREIA
Matou muita gente no lado oriental. De resto, o MS declara que é desta que era a pandemia a verdadeira pandemia. E subitamente o vírus desapareceu.

00:10:28:14 – 00:10:47:19
GRAÇA DE FREITAS
Não foi? Subitamente levou muitos meses. O que é que acontece com esse vírus? Houve aqui várias circunstâncias de sorte. Uma delas é que ele sai da China e vai para o Vietname usar um da pneumonia atípica. Ao deixar em Portugal, o Dr. Francisco gostava de batizar as coisas com nomes portugueses. Chamou lhe pneumonia.

00:10:47:19 – 00:10:49:03
JORGE CORREIA
Atípica e fazia de manhã.

00:10:49:05 – 00:11:09:24
GRAÇA DE FREITAS
E à tarde. O que é que acontece com cão com esse vírus? Ele sai de facto da China e vai para o Vietname, dá um soco no Vietname. E há aqui uma coisa importante morre o médico francês no Vietname e aí soam muitos alertas e depois os focos que houve no mundo. Passa se primeira fase dos planos de contingência que é conter?

00:11:09:24 – 00:11:39:19
GRAÇA DE FREITAS
É a fase da contenção. E aqui chegados, chegamos a pandemia da 19 e ao início do ano de 2020. Eu venho com este histórico H5N1 SARS que foi possível conter fazer os grandes planos de contingência, pois a pandemia da gripe A que se chamou a porque ninguém queria ficar com o ónus ter aquela gripe porque ainda foi do México e ainda foi dos Estados Unidos, depois era das Américas e acabou por ser gripe A porque o vírus lá há muito tempo.

00:11:39:19 – 00:11:45:02
JORGE CORREIA
Depois havia a dúvida onde é que o vírus pode ter nascido? Isso? Isso era uma gripe a.

00:11:45:03 – 00:12:10:18
GRAÇA DE FREITAS
Ficar com aquele vírus, Ainda por cima porque em material suíno, material aviário, tudo o que mete material suína, as pessoas não querem fama. O vírus fica. Ficou conhecido como gripe, o que não dá jeito nenhum, porque os vírus da gripe, alguns são mesmo vírus. Pronto. Mas a pandemia chamou se eu vinha desse passado e quando aparece o ser que se chamava Sasha, ele chamava se outra coisa.

00:12:10:18 – 00:12:46:19
GRAÇA DE FREITAS
No início da pandemia, quando aparece esse vírus no que nós, no Ocidente e em todo o mundo sabemos desde as primeiras horas de 2020, não era a primeira vez que nos acontecia. Havia variadíssimos desfechos possíveis o da gripe das galinhas, o azul do Mar Morto. E já só falando dos mitos respiratórios, havia vários desfecho de um dos desfechos podia ser um desfecho ou de contenção dos focos ou de contenção na China, ou de ser mais um dos vírus que aparecia depois de combater, dizia, desaparecia pelo menos aparentemente desaparecia e, portanto, havia muitos cenários possíveis.

00:12:46:19 – 00:12:53:01
GRAÇA DE FREITAS
Isto numa fase inicial. E depois tudo se precipita, porque depois tudo isto é muito rápido.

00:12:53:01 – 00:12:58:07
JORGE CORREIA
Aparece em Itália um caso, dois casos, dez casos em que havia que um perde se, perde o controle.

00:12:58:08 – 00:13:03:20
GRAÇA DE FREITAS
Perde se completamente o controlo. A Itália faz aquela importação da China.

00:13:03:20 – 00:13:07:18
JORGE CORREIA
Como consegue se perceber hoje como é que o vírus chega a Itália.

00:13:07:20 – 00:13:30:12
GRAÇA DE FREITAS
Como consegue se por viagens, por cadeias epidemiológicas. Ele não salta, nem o INEM vem sozinho. Habitualmente são pessoas, outras pessoas, outras pessoas. E depois descobriu se supostamente a pessoa, a pessoa chinesa, que foi transportando o vírus até que o vírus chega à Europa. Depois, a questão de Itália tem muito a ver com a preparação. E foi um impacto terrível nos serviços de saúde.

00:13:30:12 – 00:13:57:01
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, nós fomos dominados em simultâneo. Isto leva, enfim, a uma intensidade que gera, sim, de todo o fenómeno pandemia que é a China em Lockdown e em confinamento fechada. Milhões e milhões de pessoas, uma região inteira, uma cidade e depois as imagens de Itália. A partir daqui. Não era só uma questão do vírus, é como é que era o vírus que extravasou completamente.

00:13:57:03 – 00:14:02:02
JORGE CORREIA
Passamos aí a viver uma coisa. Todos em sociedade, que é o medo.

00:14:02:04 – 00:14:04:01
GRAÇA DE FREITAS
O medo. Exactamente.

00:14:04:04 – 00:14:27:22
JORGE CORREIA
E eu gostava de, Na crise anterior, no Vietname, morre o médico francês. É como é que a médica Graça de Freitas, perante um vírus que está a matar como matou na fase inicial em Itália e com os sistemas de saúde todos a estourar, que foi aquilo que nós vimos no norte de Itália. Tem medo? Se sente medo pessoal?

00:14:27:24 – 00:14:29:16
GRAÇA DE FREITAS
Bem, eu nesta fase.

00:14:29:17 – 00:14:31:11
JORGE CORREIA
Não há tempo sequer para pensar nisso.

00:14:31:13 – 00:14:52:23
GRAÇA DE FREITAS
Nessa fase inicial, mesmo no início eu não senti esse medo pessoal. No início eu só tinha uma, uma vontade enorme de perceber o que se estava a passar. E depois, quando comecei a ser chamado a explicar o que estava a passar, tinha uma preocupação imensa, porque eu sabia que tinha informação imperfeita e que tinha que comunicar a impressão imperfeita.

00:14:52:23 – 00:14:55:02
GRAÇA DE FREITAS
E sempre a informação é sempre imperfeita.

00:14:55:06 – 00:14:56:17
JORGE CORREIA
Falta lhes o quê? O que é que informação.

00:14:56:17 – 00:15:32:10
GRAÇA DE FREITAS
Imperfeita é exactamente isso. Havia muitas fontes de informação. Havia muito ruído, note bem os timings. O tempo da tecnologia, o tempo das redes sociais. Há um antes e o depois. Com a vida assim e desse e, portanto, o mundo de certa forma, até ao ano anterior, a comida era um mundo que nós de alguma forma percebíamos. As fontes de informação, o tipo de informação, os canais onde essa informação vinha, se era mais ou menos credível, se era científica ou não, era científica e de repente era uma verdadeira avalancha de informação.

00:15:32:12 – 00:15:56:06
GRAÇA DE FREITAS
Havia a informação da ciência e com os seus pergaminhos e requisitos. Depois havia tudo, tudo o resto do mundo, as imagens, todas aquelas imagens dos carros militares em Itália, dos caixões de ano fechado e depois de muita informação e que agora sabe se, não é para o lado, mas que a altura era quase paralela a das redes, a dos órgãos de comunicação.

00:15:56:06 – 00:16:18:19
GRAÇA DE FREITAS
Tudo um bocadinho perdido, portanto, com muitas, muito poucas certezas. E eu diria que o grau de imperfeição da informação era grande. Ao contrário do grau de preparação. O que eu quero aqui dizer na minha cabeça a preparação. Eu tinha feito tal livro com outra colega. Editamos o livro para a Direção-Geral da Saúde. Na minha cabeça existe achar se anterior à inicial.

00:16:18:21 – 00:16:47:10
GRAÇA DE FREITAS
Existia uma fase de contenção, existia uma fase de mitigação. Se a contenção falhasse, os hospitais de referência tanto do ponto de vista da preparação, eu não estava assim tão impreparada. O que não estava era à espera que a comunicação fosse tão complexa e a complexidade começava logo nas fontes. Eram fontes imperfeitas e imperfeitas. Isto tudo efémeras. Eu lembro me que eu acabava de saber uma coisa qualquer, uma novidade.

00:16:47:12 – 00:16:59:21
GRAÇA DE FREITAS
Fosse lá o que fosse. E dentro de minutos, 01h00, duas horas, era o tempo que eu levava a sair da DGS. Era um estudo de televisão, estava em todo o lado, não era assim ou estava em todo o lado, ou já não era bem assim. Era de outra forma.

00:16:59:21 – 00:17:02:06
JORGE CORREIA
Como é que se gere isso? Como é que geriu isso?

00:17:02:08 – 00:17:25:24
GRAÇA DE FREITAS
Bem, eu tentei fazer uma coisa e acho que isso se deve à minha formação médica e à minha formação como doente. Eu também sou uma doente bastante bem documentada, encartada em doenças, que é eu, quando eu tenho informei, me licenciei me sim e comecei a fazer clínica. Fui, tive bons mestres e um deles dizia me assim entre, estava por vir esse nível.

00:17:25:24 – 00:17:47:16
GRAÇA DE FREITAS
Gracinha, você não tem. Busque os doentes mais do que eu. Já estão, que os doentes já estão assustados, já estão mal e, portanto, não é preciso ser tarde, ainda mais vai morrer em 15 dias, vai morrer e eu? Aquilo para mim foi uma lição muito importante. Estas pessoas estão assustadas. Tem uma doença além da doença, tem o tal do medo.

00:17:47:18 – 00:17:55:13
GRAÇA DE FREITAS
Não sabem o prognóstico, portanto não estão aqui à espera que haja um médico que lhes diga isto é pior do que você pensa. E vai piorar tanto.

00:17:55:18 – 00:17:58:17
JORGE CORREIA
Ter tempo que muitas vezes o próprio médico, nalgumas circunstâncias, também.

00:17:58:17 – 00:18:20:23
GRAÇA DE FREITAS
Também não tem certeza se a tal comunicação, a tal informação imperfeita e, portanto, impensada. E daí? O que quer que eu diga, não posso mentir, tem de ser clara, nem tem grande vocação para mentir. Se quer que lhe diga isso das pessoas menos vocacionadas para dizer mentiras. Mas venha assim agora, para mentir assim, de propósito, não. E portanto, tinha a preocupação de não preocupar.

00:18:21:00 – 00:18:39:15
GRAÇA DE FREITAS
E depois, também pensando em mim própria, como alguém que recebe más notícias, também me lembrava de como é que eu gostava que as notícias me fossem dadas com verdade, com clareza, com algum prognóstico, mas com alguma serenidade. Também nunca gostei de doente, de receber notícias de supetão e drásticas.

00:18:39:18 – 00:18:58:21
JORGE CORREIA
Portanto, implicava alguma comunicação que preparasse o contexto que conseguisse explicar a realidade até ao ponto em que ela antecipava que fosse rigorosa e que, ao mesmo tempo fosse vertida nos media. Que tenha um filtro. Ele próprio é que tem uma forma de contar a história.

00:18:58:23 – 00:19:21:18
GRAÇA DE FREITAS
E tudo isso só foi tudo isso. E volto à mesma coisa, portanto. E eu não tive grande controlo sobre a situação, no sentido em que ela era muito e muito tensa. O que esta pandemia para mim teve de completamente diferente foi e quanto à idade? Eu era criança. Falar de informação e comunicação, a quantidade e a rapidez como tudo se passou.

00:19:21:18 – 00:19:34:03
JORGE CORREIA
E como é que se filtra, como é que se arranja um contexto, como é que se é, como é que se percebe o que é importante, do que é que o acessório ou até quando é que, quando o acessório está a contaminar a agenda pública?

00:19:34:05 – 00:19:59:01
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, eu vou lhe dizer que será com alguma intuição e com tudo o que se aprendeu até aí. E eu acho que, obviamente, eu fui o reflexo da minha educação, da minha preparação e do meu treino. E lembro agora há pouco tempo de uma amiga minha que um dia responder a uma pergunta desse género, dizendo assim, dizendo a pessoa que lhe perguntou há uns 40 anos, com bom senso e imaginação e diz lhe a pessoa está bem, mas então e o que é que O que é que baliza o bom senso?

00:19:59:01 – 00:20:20:15
GRAÇA DE FREITAS
Ela responderia imaginação. E perguntei lhe o outro Então e o que é que baliza a imaginação? Ela respondeu lhe o bom senso. Bem, e não saímos daí. Mas basicamente eu tentei fazer o que foi possível dentro de princípios que eu tinha de ser o mais rigorosa possível do ponto de vista técnico. Sabia de não ter de mentir, de ser transparente, não esconder.

00:20:20:17 – 00:20:35:18
GRAÇA DE FREITAS
Mas muito foi vir ao de cima o que eu tinha aprendido, a intuição. E hoje, hoje que já passou, tenho a sensação hoje que a maior parte do tempo que vive sem qualquer rede por baixo, portanto.

00:20:35:20 – 00:20:36:20
JORGE CORREIA
Era sentido isso.

00:20:36:20 – 00:21:00:06
GRAÇA DE FREITAS
Não estar na altura. Eu acho que nem senti na altura. Pragmaticamente, as coisas que tinham que ser feitas tem que ser ditas, tenham de ser comunicadas. Houve uma coisa que abonou a meu favor. Eu de facto não era uma pessoa. Como é que eu ia dizer, com pouca cultura de epidemias e de pandemias e de doenças infecciosas e de contágios, e isso, de alguma forma, dava me algum conforto.

00:21:00:06 – 00:21:26:18
GRAÇA DE FREITAS
O que eu pensava é mas eu não sou uma ignorante. Eu tenho um passado na área da saúde pública, na área das vacinas, na área das epidemias. Eu passei por todas as epidemias, desde 2000, desde 1996. Todas as que houve e passei na primeira linha da frente, eu vou para Diretora-Geral da subdirectora Geral, exatamente para tomar conta da questão pandemia, que o Dr. Francisco precisava de alguém que o ajudasse nessa matéria.

00:21:26:19 – 00:21:46:06
JORGE CORREIA
E então, como é que lidou com esta curva? No fundo, que é primeiro estamos todos assustados e sabemos que há uma má e uma gripe endémica e queremos saber o máximo de informação. Mas fundamentalmente temos aquela pergunta que é vamos morrer disto ou não vamos morrer disto? O que é que vai acontecer? Que é que não aconteceu? Portanto, estamos alguém com credibilidade.

00:21:46:08 – 00:22:13:01
JORGE CORREIA
Depois começamos a ouvir com esta graça de Freitas, que é, no fundo, uma cara e uma voz de uma instituição que nos vai salvar desta crise. É essa a sensação. E nessa navegação da incerteza, como é que se lida com o momento em que deixa de ser uma figura tão, tão popular e é tão, tão bem vinda a dizer Olha, lá está a Graça Freitas a dar nos más notícias.

00:22:13:01 – 00:22:20:08
JORGE CORREIA
Olha, lá está a decidir fechar as escolas. Olha lá, está a obrigar nos a usar o raio de uma máscara. Como é que? Como é que é?

00:22:20:10 – 00:22:51:08
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, eu ao contrário de algumas pessoas que dizem se eu olhasse para trás eu fazia tudo igual, eu não. Eu fazia muitas coisas de maneira diferente. E um dos problemas que eu acho que posso ter tido e que tive de certeza foi que me deixei de tal maneira pela intensidade das coisas na hora, no dito online que eu tive poucos inputs, poucos poucos momentos para reflectir no que verdadeiramente se estava a passar.

00:22:51:10 – 00:23:13:14
GRAÇA DE FREITAS
Se eu passasse por uma situação semelhante, obviamente que é muito fácil falar agora, eu reservaria uma parte, provavelmente da minha manhã e uma parte da minha tarde e uma parte da minha noite para pensar, para pensar e para ouvir algumas pessoas darem me. Enfim, o a sua opinião do que estava a passar à volta, o ter uma espécie de um conselho com pessoas.

00:23:13:14 – 00:23:14:17
JORGE CORREIA
Fora da bolha de.

00:23:14:18 – 00:23:41:22
GRAÇA DE FREITAS
Estado, fosse porque entre alturas estávamos, cada um de nós foi por nossa conta. Eu não sei o que é que as pessoas pensam que a Direção-Geral da Saúde e a Direcção Geral do Estudo e uma grande instituição, fez hoje 125 anos e uma instituição pela qual eu tenho uma admiração máxima, porque fiz coisas absolutamente extraordinárias, pois era uma instituição pequena em recursos de todas as formas, em recursos digitais e recursos humanos.

00:23:41:24 – 00:24:02:10
GRAÇA DE FREITAS
Tudo. Nós não éramos um nós, eu éramos os seres. Esse eu sei dizer não, não somos nada disso. Não éramos nem somos. Todos nós éramos uma casa muito mais pequena e, portanto, com tantas tarefas que nós tínhamos para fazer, uns tinham que estudar, outros nunca comunicar ou tinham de fazer campanhas ou tinham que exercer o papel de autoridade de saúde.

00:24:02:10 – 00:24:26:07
GRAÇA DE FREITAS
Eu sou a Autoridade de Saúde, era a Autoridade de Saúde nacional, tinha uma carga, uma responsabilidade nesse papel para o para os cidadãos, para os meus colegas, para as outras agências do ministério. Isso brutal. Se nós estávamos assoberbado nos cada um a tentar fazer a sua tarefa e poucas vezes tínhamos apoio uns dos outros, isto é, falar da fase inicial.

00:24:26:07 – 00:24:28:19
JORGE CORREIA
Como como é que eram, como é que era um dia atípico?

00:24:28:21 – 00:25:07:10
GRAÇA DE FREITAS
Era atípico, Não havia dia típico. A única coisa que nós sabíamos é que lutávamos contra o tempo para ter boa informação epidemiológica a melhor possível. Como? Enfim, com instrumentos rudimentares até a nível das tecnologias básicas da vida, da potência dos computadores e, portanto, e dos recursos humanos, lutávamos para ter boa informação e tempo. Mais ou menos. Lutávamos por saber o que é que os outros países estavam a pensar, porque era importante, sobretudo os europeus, as agências europeias, o MS, o órgãos de referência, CDC americano, enfim, todas essas coisas que nos davam também bons contributos para o estado da arte.

00:25:07:12 – 00:25:21:21
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, eram, eram de absolutamente alucinantes. Portanto, nós não sabíamos nunca como é que aquele dia ia ser e nada acontecia na hora programada. Vocês que estiveram do lado de lá, que eu não vi nunca nenhuma conferência de imprensa, amigas e nem hoje, Como.

00:25:21:21 – 00:25:24:04
JORGE CORREIA
É que é? Como é que foi aparecer todos os dias?

00:25:24:04 – 00:25:31:20
GRAÇA DE FREITAS
Não sei porque quando as pessoas me dizem isso, eu digo você viu me todos os dias, mas eu não vi todos os dias. Eu não sei como é ver me.

00:25:31:21 – 00:25:32:21
JORGE CORREIA
Não ir ver.

00:25:32:23 – 00:25:52:24
GRAÇA DE FREITAS
Eu não. Mas alguma vez eu ia ver gravação. Eu chegava a casa e continuava a trabalhar e as poucas horas e não me estou a queixar. Foi assim se factual e as poucas horas que restavam era uma luta para conseguir ler duas páginas que esquecia completamente e não lembrava, não saía da mesma do mês. Mas ao.

00:25:53:01 – 00:25:54:13
JORGE CORREIA
Ler outra coisa que não seja.

00:25:54:15 – 00:26:10:07
GRAÇA DE FREITAS
Mas não saía da mesma zona do livro, não progredia porque eu esquecia me, já estava a dormir e consegui e consegui dormir. Eu tinha depois um padrão de colaboradores que era noctívago até às 02h00. Mandava mensagens, sms a dizer um artigo não sei onde, mas na China não sei o quê.

00:26:10:07 – 00:26:12:01
JORGE CORREIA
E às 07h00, quando acordava.

00:26:12:03 – 00:26:33:15
GRAÇA DE FREITAS
Às sete, onde não desligava, eu tinha dois telemóveis ligados pipipi e via pessoas caching que meia da manhã começava a ver notícias e a mandar e dizia já morreram mais não sei quantos. Vou fechar a fronteira, vamos fazer assim, vamos fazer assado. O vírus sobrevive nas superfícies, não sobrevive. Era uma avalanche. Já gera uma avalanche de informação e, portanto.

00:26:33:17 – 00:26:35:22
GRAÇA DE FREITAS
Era uma avalanche pronta, uma forma de dizer como.

00:26:35:22 – 00:26:46:06
JORGE CORREIA
É que se lida com isso, como é que se lida com isso pessoalmente? Ou o enésimo telefonema e não sei quem é quem, aquilo que falava, mas imagino que toda a gente que falava.

00:26:46:08 – 00:27:11:02
GRAÇA DE FREITAS
Chega se a uma altura que eu tinha um colaborador que dizia Senhora diretora, já estou, vai ou vai aí e pronto. E chega só uma altura é que é mesmo o vai o vai ou nós meses que íamos e os quilos, dizíamos ao senhor doutor a senhora Ministra da Saúde e o senhor primeiro ministro, porque nós não temos capacidade para fazer isto, ou se era para fazer, tínhamos que.

00:27:11:04 – 00:27:12:11
JORGE CORREIA
Não era uma opção segura.

00:27:12:13 – 00:27:39:22
GRAÇA DE FREITAS
De mim. Não foi uma opção. Eu tinha o meu lugar à disposição sempre. E, portanto, sabia também que no dia em que me deitava duríssimo, podia não ser a diretora geral, mas pensava enquanto eu tiver alguma fé em mim própria, alguma convicção em mim própria de que tenho alguma preparação, se calhar maior do que da maior parte das pessoas, de que estou a fazer um trabalho honesto e, tanto quanto possível, bem feito.

00:27:39:24 – 00:27:48:19
GRAÇA DE FREITAS
Eu vou ficar aqui. E foi essa convicção que se calhar me manteve, sendo que tinha sempre lugar à disposição.

00:27:48:19 – 00:27:51:24
JORGE CORREIA
E como é que eram nos dias das neuras, nos dias em que aquilo.

00:27:52:01 – 00:28:18:12
GRAÇA DE FREITAS
Para os dias das neuroses, das neuras eram difíceis? Eram os dias em que e além daqueles minutos, num dia em que todos os dias, a certa altura, eu pensava amanhã vou me embora e sai. Mas pronto, já passava que eu passava os dias das neuras, as neuras passavam e não havia nada que no dia seguinte acordasse, porque havia outra neura diferente.

00:28:18:16 – 00:28:28:07
GRAÇA DE FREITAS
As neuras eram sempre diferentes, a neura com que eu me deitava, os grandes problemas com que eu me deitava já não eram exatamente as Eu não estou a exagerar. Foi assim que eu senti.

00:28:28:09 – 00:28:29:12
JORGE CORREIA
Já havia um outro problemas.

00:28:29:13 – 00:28:36:00
GRAÇA DE FREITAS
Que eu, por exemplo, gostava de dizer isso. Eu não tinha a noção de das redes sociais, do que estavam a dizer ou fazer, não tinha.

00:28:36:01 – 00:28:36:17
JORGE CORREIA
De grande ruído.

00:28:36:19 – 00:28:55:06
GRAÇA DE FREITAS
E um dia cheguei ao Ministério da Saúde e depois à conferência de imprensa. Se eram nascido Dona Marta Diniz, a senhora ministra está ali naquele gabinete e quando a senhora ministra sair, vai entrar a senhora directora já eu esperei. Não era o hábito, isso não era o padrão. Eu acabava a conferência e habitualmente ia para a direção de dar as conferências.

00:28:55:06 – 00:29:24:01
GRAÇA DE FREITAS
Era o ministério. Esperei que saísse a senhora ministra, que vinha com uma cara enfim, agreste, agreste e preocupada. E eu entrei e vi os senhores. E ai eu falo muito e fiquei sem palavras porque foi bonito. A senhora vai passar a ter proteção policial? A polícia eu disse.

00:29:24:03 – 00:29:26:02
JORGE CORREIA
Porque via havia uma ameaça.

00:29:26:04 – 00:29:32:09
GRAÇA DE FREITAS
Pois deve ter havido e eu não tive capacidade sequer.

00:29:32:11 – 00:29:34:05
JORGE CORREIA
Não partilharam detalhes, não disseram.

00:29:34:05 – 00:30:03:06
GRAÇA DE FREITAS
Disseram me algumas coisas e eu não tive nem capacidade de perguntar, nem capacidade de entender. E, portanto, eu cheguei a casa e vagamente perguntei E isso vai acontecer? Quando é disseram me a partir de amanhã vai estar sempre uma pessoa à sua porta, disse ao pé da garagem. Disseram não à sua porta. A senhora não sai à porta sem estar a acompanhar e eu vou aqui partilhar com os portugueses, porque é rigorosamente verdade.

00:30:03:10 – 00:30:04:24
JORGE CORREIA
Portanto, passou a estar um polícia.

00:30:05:01 – 00:30:27:04
GRAÇA DE FREITAS
Com um sentido prático que eu tenho da vida. E eu que nunca me atrasei até sair de casa cheia do axé de meia da manhã para ir trabalhar. Mas pensei então e se o senhor ou senhora que me vier esperar? E se eu me atrasar? Eu vou pôr aqui uma cadeira no hall de entrada? E eu caí no ridículo de pôr uma cadeira no hall de entrada, uma das cadeiras de abrir e fechar encarnada para.

00:30:27:04 – 00:30:27:21
JORGE CORREIA
A pessoa descansar.

00:30:27:21 – 00:30:30:00
GRAÇA DE FREITAS
Ela descansar como se aquelas pessoas descansassem.

00:30:30:05 – 00:30:30:18
JORGE CORREIA
Claro que não.

00:30:30:18 – 00:30:49:11
GRAÇA DE FREITAS
É como se eu me atrasasse, nem atrasava, nem elas descansavam e a cadeira foi retirada do solo já depois de eu estar reformada, porque eu deixei lá ficar a cadeira onde ninguém nunca se sentou. Mas é para ter a ideia de como os dias foram complexos e eu hoje até penso que não aconteceu comigo.

00:30:49:13 – 00:30:50:03
JORGE CORREIA
E portanto.

00:30:50:08 – 00:30:52:20
GRAÇA DE FREITAS
Que aconteceu comigo ter proteção policial.

00:30:53:00 – 00:30:57:07
JORGE CORREIA
Portanto. E sentiu o risco sentido de alguma maneira uma ameaça.

00:30:57:07 – 00:31:03:21
GRAÇA DE FREITAS
O tempo que um dia eu tinha dois senhores e uma senhora que eles faziam, que viam tudo, que.

00:31:03:21 – 00:31:04:14
JORGE CORREIA
Revezavam, que.

00:31:04:14 – 00:31:15:09
GRAÇA DE FREITAS
Revezavam. E eu, um dia, das pouquíssimas vezes em que num fim de semana eu resolvi ir andar um bocadinho a pé e sair um bocadinho de casa para mexer as pernas para fazer algum exercício.

00:31:15:09 – 00:31:17:16
JORGE CORREIA
Ainda sozinha. Hoje não.

00:31:17:16 – 00:31:38:09
GRAÇA DE FREITAS
Já está já com as pessoas já claras, com os senhores da PSP que foram já agora extraordinários ao ponto de eu nem me lembrar que eles existiam. Eram discretos e eram discretos. E eu assimilei aquilo muito bem. Era uma coisa que eu pensava que não, mas eram bastante. E eu saí e combinei. De manhã fui vindo a cobrir se de imprensa.

00:31:38:10 – 00:32:02:24
GRAÇA DE FREITAS
Distrair se Não se importa. Eu hoje preciso de ir andar um bocadinho até aqui ao pé do rio. Preciso de ir andar sozinha, sozinha e a senhora não vai andar. Mas eu vou andar consigo. A senhora não anda sozinha. A senhora era já. E eu disse Então tá bem, Então venha comigo. E assim foi e fomos andar um bocadinho e é um transeunte, um pião, uma pessoa normalíssima da vida.

00:32:03:01 – 00:32:08:08
GRAÇA DE FREITAS
Faz. Não havia ninguém na rua. Foi naqueles dias pós confinamento de deserto em.

00:32:08:10 – 00:32:08:24
JORGE CORREIA
Que dizem que.

00:32:09:00 – 00:32:30:06
GRAÇA DE FREITAS
Conhecem um cidadão que provavelmente quereria dizer alguma coisa. Não sei. Sei que o senhor vem vagamente na minha direção, sem mais ninguém. E a senhora que me estava a acompanhar, a proteger ele abre os braços para o senhor parar. Bloqueou para bloquear, mas longe dele não bloqueou. Em cima do acontecimento o senhor ainda tinha uma distância que logo.

00:32:30:06 – 00:33:06:01
GRAÇA DE FREITAS
O problema é que eu nem sequer tinha. Não tinha consciência, não tive tempo para interiorizar tudo e obviamente a senhora estava armada e eu nesse momento disse Olhe, eu vou voltar para casa, porque enfim, apanhei um enormíssimo susto porque não tinha nem sequer pensado que obviamente aquelas pessoas estavam armadas. Não tinha pensado só quando vim e que queria ir para casa e não voltar a sair de casa, a não ser fui para a Direcção-Geral da Saúde trabalhar, fazer o movimento pendular casa direção Geral, Direção Geral, Ministério.

00:33:06:01 – 00:33:07:24
GRAÇA DE FREITAS
Ministério, Direção Geral, Direção Geral, Casa.

00:33:08:05 – 00:33:41:00
JORGE CORREIA
Os jornalistas têm outro tipo de armas. Fazem normalmente perguntas. Noutro tempo em que eu fazia de jornalista. Fomos juntos. Lá estava quando se começou a falar da pandemia e já OMS pensava em mim, na nossa preparação, numa célebre reunião de Copenhaga em que fomos os dois subdirectora geral da Saúde, na altura já na preparação e eu como como novelista da rádio pública e temos uma conversa sobre a relação entre fontes e jornalistas.

00:33:41:02 – 00:33:46:13
JORGE CORREIA
E eu fiz, fiz, fiz. Ao contrário do médico que que que cria pânico na sua.

00:33:46:13 – 00:33:52:04
GRAÇA DE FREITAS
Forma de ver, o Jorge contribuiu para a minha formação, que também me fez o.

00:33:52:06 – 00:33:53:07
JORGE CORREIA
Meu. Senão você não.

00:33:53:09 – 00:34:12:15
GRAÇA DE FREITAS
Dorme. Naquele dia nós fomos do mesmo avião porque estão, creio eu, também para vocês, jornalistas, mas pelo menos é de poupança de dinheiro, porque o dinheiro é para ser bem gasto. É mais barato nós irmos passar o fim de semana em Copenhaga para a reunião de segunda feira do que depois de voarmos num dia de semana.

00:34:12:15 – 00:34:14:02
JORGE CORREIA
Bendita bendita poupança!

00:34:14:02 – 00:34:37:09
GRAÇA DE FREITAS
Fomos de facto para Copenhaga e Copenhaga. Não é assim uma cidade muito grande e tem aqueles que, pelo menos na altura, os bares das docas, onde as pessoas acabam todas por se encontrar a beber umas cervejas, sobretudo o trabalho só começar dois dias depois e já ficou noutro sítio do avião. E saiu o primeiro dia. E quando eu saí você estava à minha espera.

00:34:37:09 – 00:34:47:22
GRAÇA DE FREITAS
Na saída da porta da manga da porta da manha e disse com ar muito sério Doutora Graça, comigo não faz.

00:34:47:24 – 00:34:49:01
JORGE CORREIA
O que está dito, está dito.

00:34:49:01 – 00:34:50:05
GRAÇA DE FREITAS
O que está dito, está dito.

00:34:50:11 – 00:34:51:24
JORGE CORREIA
O que é diferente é ser bom.

00:34:52:01 – 00:35:06:24
GRAÇA DE FREITAS
Tal e qual. Se. Eu fui para o hotel e pensei eu não bebo cerveja este fim de semana porque eu tenho de estar completamente atenta para não dizer rigorosamente nada que não se possa ouvir. Diria umas horas.

00:35:07:04 – 00:35:07:11
JORGE CORREIA
Fora.

00:35:07:11 – 00:35:20:23
GRAÇA DE FREITAS
Daqui, fora daqui e portanto. Mas foi uma grande lição. Foi mesmo uma grande lição de vida, de contenção, de cuidado, de respeito e, portanto, e isso fez parte do tal aprendizado em como que eu chega a pandemia.

00:35:21:03 – 00:35:33:22
JORGE CORREIA
Como é que se faz isso? Depois, numa sequência de dias em que se está sempre numa conferência de imprensa, sempre a responder a perguntas, sempre com essa torrente de notícias que estão a aparecer aí.

00:35:33:22 – 00:35:55:24
GRAÇA DE FREITAS
As fronteiras não são nítidas entre o off e o one, o que é e o que não é para dizer. Depois há ali uma zona em que não há fronteiras nítidas. Quer dizer, eu não conseguia e ainda hoje, quando olho para trás e me lembro de alguns episódios das conferências, não conseguia fazer aquilo em estado puro, bem feito, como ensinou os livros para mim.

00:35:55:24 – 00:36:01:09
GRAÇA DE FREITAS
Ensinou a experiência como me ensinou o Jorge ou como me ensinava a Ariana Mendes, que era a minha.

00:36:01:11 – 00:36:03:22
JORGE CORREIA
Era sempre ela sempre fazer e sempre andar para a frente.

00:36:03:22 – 00:36:15:03
GRAÇA DE FREITAS
Era sempre a aprender. A sensação era exactamente isso. Quando estávamos naqueles tapete rolante a fazer as provas de força nos não para a menos que deu um grito e dizer para mim isto.

00:36:15:03 – 00:36:15:14
JORGE CORREIA
Ou vai ou.

00:36:15:14 – 00:36:22:09
GRAÇA DE FREITAS
Vai, vai, vai. Era um dos lemas que foi sempre o lado da minha Direcção Geral da Saúde. Ou vai ou vai.

00:36:22:11 – 00:36:43:19
JORGE CORREIA
Eu tenho um episódio muito curioso quando, quando todos nós estávamos a perguntar como é que raio este vírus pega tudo, se nós nas superfícies ou não, aquele cuidado que nós tínhamos nas garrafas de água, o que é que cada um bebia? Cada um tinha a sua garrafa de água e a uma imagem de uma conferência de imprensa Antes de começar, que é Dra.

00:36:43:19 – 00:36:47:15
JORGE CORREIA
Graça de Freitas, com um lenço de papel a abrir uma garrafa em Vilarinho.

00:36:47:15 – 00:36:48:10
GRAÇA DE FREITAS
Deprimente.

00:36:48:10 – 00:36:50:00
JORGE CORREIA
E eu pensei Sim, meu Deus.

00:36:50:02 – 00:36:51:00
GRAÇA DE FREITAS
Um tesourinho triste.

00:36:51:02 – 00:36:53:10
JORGE CORREIA
Pega se assim com essa facilidade.

00:36:53:12 – 00:37:21:17
GRAÇA DE FREITAS
Eu também digo eu disse mesmo. Eu tive os meus tesourinhos deprimentes e esse foi um deles. E vou lhe dizer porquê? Porque eu em determinada altura também tive os meus medos e eu em determinada altura também percebi que havia muita incerteza, sobretudo a questão das superfícies e vou partilhar consigo. Eu estava em fases de pleno medo e nós tínhamos água posta na mesa da da conferência de imprensa.

00:37:21:17 – 00:37:23:03
GRAÇA DE FREITAS
Tínhamos uma garrafa.

00:37:23:05 – 00:37:23:13
JORGE CORREIA
Cada um na.

00:37:23:13 – 00:37:42:11
GRAÇA DE FREITAS
Sua cama e tinha me dito garantido. Um dia tinha perguntado qualquer coisa, mas na altura havia mesmo ideias que nos deixavam. Eu lembro. O meu irmão deixava as compras à porta de casa da minha mãe dentro do saco e pois os sacos ficavam em quarentena e depois vinha toda aquela coisa de incerteza. Houve também essa fase das nossas vidas e eu também sou uma cidadã e uma pessoa.

00:37:42:11 – 00:38:04:02
GRAÇA DE FREITAS
E que tinha na altura também tive os meus medos de subir. Sobrevivia muito tempo na superfície e tinham me dito eu tinha perguntado inicialmente e tinham me dito não pode ter a vontade, as garrafas e os copos e está tudo sempre desinfectado e por aquelas coisas estranhas que acontecem naqueles milésimos de segundo, vamos começar a compreender alguém que eu não sei quem foi, Nem sei.

00:38:04:02 – 00:38:23:20
GRAÇA DE FREITAS
Na verdade, eles não eram eles. Mas olhe que as garrafas não estão desinfetada e estupidamente eu tenho aquele reflexo. Então como é que eu vou pegar numa coisa que não está desinfetada e que estas horas está cheia de vírus? Então eu aí portei me mesmo como uma pessoa normal, com os meus medos, com os meus fantasmas e pronto, tive o meu tesourinho deprimente.

00:38:23:22 – 00:38:42:24
GRAÇA DE FREITAS
Depois tive quase a ter um chorinho deprimente. E eu vou contar a primeira vez que eu consegui pensar que conseguiria ter um dia ou dois para ir ao Alentejo. Isso, o meu marido e olhe, vamos, vamos lá para o hotel pequenino onde costumamos ficar e eu arrumo o quarto e faço as camas e o meu marido está para aí.

00:38:42:24 – 00:38:54:10
GRAÇA DE FREITAS
Ficamos em casa. Porque eu não queria que alguém viesse a mexer nos coisas. Foi aquilo. Durou pouco tempo. Essa nossa fase durou pouco tempo, mas o certo é que existiu.

00:38:54:10 – 00:39:28:02
JORGE CORREIA
E a ligação entre a comunicação e o medo é muito claramente sentida quando quando nós não temos essa segurança ou quando alguém com autoridade, neste caso da Directora geral da Saúde, não é completamente assertiva a dizer um sim ou não. Nós, pelo sim pelo não, vamos lá esperar um bocadinho. Então estou a pensar, por exemplo, recentemente, recentemente, já um par de anos, quando quando houve esta crise importante da legionella nos arredores de Lisboa e quando não se sabia ainda qual era a origem de de ouvir políticos locais de dirá e o suspeito que se calhar é da água que bebemos.

00:39:28:02 – 00:39:30:10
JORGE CORREIA
Ou é isto ou aquilo e esse efeito.

00:39:30:12 – 00:40:03:05
GRAÇA DE FREITAS
Mas aí foi a ver e era uma coisa para nós, os profissionais, completamente controlada, porque nós sabemos tudo o que é possível saber sobre as janelas e desde o início, surto em Vila Franca desde as primeiras horas, duas ou 3/1 horas que todos sabíamos como é que tinha sido propagado. E vou dizer porquê? Porque o meu colega que fez os inquéritos epidemiológicos foi brilhante e percebeu que uma senhora que estava acamada num terceiro andar, que a única coisa que fazia era respirar o ar que lhe entrava pela janela e tinha contraído legionella.

00:40:03:07 – 00:40:22:09
GRAÇA DE FREITAS
E portanto aquilo era uma coisa, como se veio a confirmar mais tarde no ar, pelo o ar que saiu por uma toda reconhecimento. É que a nível do terceiro andar que são conhecidos os terceiros andares por estarem expostos a estes fenómenos, enfim, inalou as gotículas para entre nós e os graus de incerteza. Eram poucos os graus de liberdade e os graus de incerteza.

00:40:22:09 – 00:40:33:24
GRAÇA DE FREITAS
Aqui, os graus de incerteza numa doença conhecida sabe todo o padrão de comportamento que sabe são completamente diferentes, independentemente do que a população pensa. Estou a falar do ponto de vista profissional.

00:40:33:24 – 00:40:53:13
JORGE CORREIA
E como é que uma cientista, Graça Freitas, uma cientista, lida com o facto de a opinião mais relevante de um cientista que estudou um tema e tem toda a informação vale tanto, ou se calhar menos do que o Zé dos Bitaites, que acabou de escrever uma barbaridade no seu Facebook ou no seu Twitter.

00:40:53:15 – 00:41:18:18
GRAÇA DE FREITAS
Essa foi uma das grandes descobertas. Isto de facções da pandemia foi mesmo porque nós estávamos habituados. E quando digo nós, sou eu e os meus antecessores, quer a nível do directores gerais, subdirectores, mas também técnicos e activistas, todos nós estamos habituados a de facto tínhamos um conhecimento e uma autoridade, uma narrativa e uma autoridade. Exatamente. Era por esta ordem.

00:41:18:23 – 00:41:51:04
GRAÇA DE FREITAS
Conhecíamos as coisas, tínhamos uma narrativa e tínhamos uma autoridade. E era assim e a vir haveria outras pessoas que o saberiam. Mas isto era equilibrado. Era um ambiente de certa forma controlado e protegido. E depois nada. Foi assim, nada foi assim. Essa foi calhar. Isso foi à medida que foi percebendo o grande choque, habituara 40 anos quase de profissão, exatamente a isso.

00:41:51:06 – 00:42:06:22
GRAÇA DE FREITAS
E depois, de repente, qualquer pessoa, em qualquer latitude de como qualquer conhecimento, dizia qualquer coisa. E isso tinha mais ou menos o mesmo valor. Isso sim é um grande e um grande desconforto e um grande desassossego.

00:42:06:22 – 00:42:34:24
JORGE CORREIA
E eu tenho uma grande curiosidade que é saber no comité dos peritos, lá está, daqueles que sabem, que lêem, que pensam e pegam se uns com os outros, são teimosos quando defendem uma tese ou outras. Como é que imagino que é a função de Director geral da Saúde, Director geral da Saúde? É um bocadinho tentar o mínimo denominador comum, tentar mitigar, aliás, as birras dos cientistas.

00:42:35:01 – 00:42:50:03
GRAÇA DE FREITAS
Há alguma teimosia, mas há sobretudo argumentação e argumentação científica. E uma das coisas que acho que fiz bem é que eu identifiquei quem eram aqueles em que eu confiava acima de tudo.

00:42:50:04 – 00:42:53:14
JORGE CORREIA
Então, que características têm esses aí?

00:42:53:16 – 00:43:24:14
GRAÇA DE FREITAS
Primeira coisa por acaso tinham isto em comum? Que lhe vou dizer? Eram pessoas relativamente novas. Eram pessoas que dominavam as fontes de informação, as digitais e as analógicas. E todas têm uma capacidade de captar informação. Eram capazes de filtrar essas fontes. Tinham um respeito profundo pela ciência profunda, por tudo o que era evidência científica. Os estudos que iam saindo não quer dizer que não lessem outro tipo de literatura, as redes sociais.

00:43:24:14 – 00:44:00:00
GRAÇA DE FREITAS
Fosse preciso, mas eram pessoas altamente fiáveis do ponto de vista da procura do conhecimento, da forma como obtinham e da forma como me transmitiu e a partir dessa fase, já numa fase mais calma ainda durante o ano 2020, a minha vida sofreu um grande salto qualitativo, porque eu, de facto rodeei me de pessoas e que tem que mencionar uma está agora na Web MS, nos escritórios da Organização Mundial da Saúde em Atenas, e o Valter Fonseca e o Valter Fonseca era a pessoa do ponto de vista científico e técnico em que eu mais confiava.

00:44:00:00 – 00:44:02:07
GRAÇA DE FREITAS
E tive outros. Tive o Diogo Cruz que muita gente.

00:44:02:07 – 00:44:13:21
JORGE CORREIA
Portanto, era um mastiga dois da ciência que conseguiu encontrar nas fontes, conseguiam fazer uma transição. O que que é importante, o que é que não é importante? É criar, no fundo, a papinha toda feita para uma base numa decisão.

00:44:13:23 – 00:44:21:24
GRAÇA DE FREITAS
Mais ou menos a papinha toda feita, porque aí entrava, nem eu era uma receptora passiva, nem eles eram passivos.

00:44:21:24 – 00:44:23:08
JORGE CORREIA
Entrei alguns.

00:44:23:10 – 00:44:24:13
GRAÇA DE FREITAS
Fazíamos umas perguntas.

00:44:24:13 – 00:44:25:23
JORGE CORREIA
Era uma pergunta difícil.

00:44:26:00 – 00:44:56:03
GRAÇA DE FREITAS
Não, eu acho que não era difícil, sobretudo porque as pessoas a quem eu perguntava eram muito sabedoras e eu nunca fiz nenhuma pergunta que não fosse difícil. O que eles faziam, e eu acho que foi muito bom, foi ter um princípio de extrema cautela, ou seja, quando me transmitiam com algum grau de assertividade uma informação, estavam certos que a probabilidade, aquela informação ser correta do ponto de vista técnico e científico.

00:44:56:03 – 00:44:56:09
JORGE CORREIA
Estavam.

00:44:56:09 – 00:45:21:14
GRAÇA DE FREITAS
Escorados, estavam bastante escorados, eram muito cuidadosos. Vou dizer, eram todos mais novos que eu e eu ficava até nervosa com o que eu achava que era quase um excesso de cuidado. Mas não era. Porque rapidamente também se percebe, depois de passar aquela fase inicial, que há um fator muito importante, que é a segurança de todas as ações futuras medicamentosas e estão ecológicas, desde as vacinas.

00:45:21:16 – 00:45:35:13
GRAÇA DE FREITAS
E, portanto, eu, depois de outra lição aprendida, se algum dia tivesse hipóteses de andar para trás, era criar logo um conselho de pessoas muito sapientes, com muito bom senso, muita capacidade de procurar informação boa.

00:45:35:17 – 00:45:56:06
JORGE CORREIA
Bom, do outro lado, dum lado estão os cientistas. Deste lado estamos nós aqui, espectadores, pessoas, cidadãos que não dominamos o que está a acontecer, mas temos perguntas para fazer. De um lado estão os cientistas e do outro lado estão os políticos. E os políticos têm duas críticas principais. A primeira tem a responsabilidade fundamental de tomar as grandes decisões.

00:45:56:08 – 00:46:11:02
JORGE CORREIA
Tem uma intuição muito forte, mas nem sempre são muito científicos. Como é que foi essa tensão, essa, esse entre entre a necessidade dos políticos tomarem decisões e fazerem perguntas? E os cientistas?

00:46:11:04 – 00:46:31:13
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, se você se lembrar, até a dita para Não se falava em linhas vermelhas. Havia um fio muito interessante americano sobre quão ténue é uma linha vermelha, mas não se falavam. Começou se a falar do ponto de vista epidemiológico e é tudo verdade. Quem toma as últimas decisões são os políticos. Quem vai ser eleito ou não eleito são os políticos.

00:46:31:15 – 00:46:40:14
GRAÇA DE FREITAS
Quem tem outras metodologias para avaliar riscos e impactos desses riscos. Impactos sociais Os impactos económicos não são só impactes. Não são os políticos.

00:46:40:16 – 00:46:50:07
JORGE CORREIA
Vai muito para além daquilo que é a epidemiologia, que aqui é um vírus que é diferente a economia. O que é que acontece na nossa vida? A nossa perceção é, no fundo, em que é que vamos votar ou não vamos votar.

00:46:50:08 – 00:47:15:10
GRAÇA DE FREITAS
Evidente e, em última análise, são os grandes decisores. Então estão legitimados democraticamente para serem os grandes decisores. Qual é o nosso papel? No outro dia, eu diria uma coisa engraçada que é que cada aranha na sua teia, cada aranha, tece a sua teia e cada uma deve ficar lá por ela e depois encontrar o que é que havia.

00:47:15:12 – 00:47:29:21
GRAÇA DE FREITAS
Havia uma grande preocupação em descodificar e passar a informação correta, tanto quanto possível e assertiva e clara. Quem ia tomar a decisão que eram os os os políticos?

00:47:30:00 – 00:47:33:09
JORGE CORREIA
E quando o político perguntava então é prognóstico?

00:47:33:11 – 00:48:02:17
GRAÇA DE FREITAS
Ora bem, então havia duas coisas. Havia uma, que eram as célebres linhas vermelhas que nós, digo nós são todos técnicos, médicos e não só médicos, epidemiologistas, farmacêuticos, enfermeiros, linha e que era inocente, não se sendo nós não fazíamos cedências, pedíamos que se todos demitidos numa noite, se houvesse um braço de ferro que não houve, felizmente. Mas nós não seguíamos na segurança das vacinas.

00:48:02:19 – 00:48:03:24
JORGE CORREIA
Estava lá. Era uma linha.

00:48:04:02 – 00:48:28:13
GRAÇA DE FREITAS
Era uma linha vermelha. E se há uma dúvida razoável, nós seguiremos. É uma linha vermelha que nos sentamos e daqui não passamos para onde havia de facto, essas linhas vermelhas? Em relação aos prognósticos, jogava se muito com as probabilidades, porque é isso que a ciência nos diz. A probabilidade e esta probabilidade é aquela. Em França foi assim, na Alemanha foi doutra forma.

00:48:28:15 – 00:48:46:02
GRAÇA DE FREITAS
Nos países onde já fizeram isto ou aquilo, começou se a trabalhar muito por analogia com os outros países. Portanto, aí foi muito importante o trabalho da academia, da retaguarda. Todas essas pessoas começaram a ter tempo para ver o que se passava noutros países e para digerirem essa informação comparativa.

00:48:46:07 – 00:48:49:20
JORGE CORREIA
E aprender com aprender com os erros e aprender com as coisas que foram feitas.

00:48:49:24 – 00:49:14:01
GRAÇA DE FREITAS
Porque a pandemia não estava no mesmo, na mesma fase, em todo o lado. Portanto, havia sítios onde aquilo estava aspire sítios estabelecidos. O tiro já estava na nova variante, Outros estavam na variante antiga. Portanto, se houvesse capacidade de varrer o mundo, isto ao fim de cinco, seis meses. Bem, não foi lá o início. Se houvesse essa varredura do mapa, nós conseguimos aprender com os erros e as virtudes de cada um.

00:49:14:03 – 00:49:32:06
GRAÇA DE FREITAS
Também é mais fácil dizê lo agora do que na altura, porque a mesma história e informação era demasiado, nem sempre. Das fontes também mais credíveis. Os países, nem todos também, ou quase nenhum, para dizer a verdade, tinha capacidade para estar a fazer e ao mesmo tempo publicar e informar os outros e disponibilizar.

00:49:32:09 – 00:49:33:03
JORGE CORREIA
Mas iam falando a.

00:49:33:03 – 00:49:41:12
GRAÇA DE FREITAS
Verdade, íamos falando Fartava nos de falar isso, as videoconferências e essas coisas todas. Foi um avanço.

00:49:41:14 – 00:49:48:07
JORGE CORREIA
Eu tenho uma curiosidade a propósito dessas decisões. E os prognósticos, quem é que tomou a decisão final de fechar as escolas?

00:49:48:09 – 00:49:59:10
GRAÇA DE FREITAS
Foi tudo muito rápido, muito rápido. Olhe, essa foi dos momentos mais rápidos que eu num domingo, estava eu em casa de uma colega que já tinha andado. Já agora.

00:49:59:10 – 00:50:01:02
JORGE CORREIA
Há escolas, empresas, escolas.

00:50:01:04 – 00:50:27:13
GRAÇA DE FREITAS
Escolas. Estava eu em casa de uma colega, médica, médica de saúde pública e, apesar de ter mais experiência de vida e ser mais velha que eu, tinha sido minha interna, tinha feito outras coisas na vida a acompanhar a evolução da região Norte a nível da população escolar e dos clubes nas escolas, a acompanhar a cientista com toda a calma, com os dados para a informação, juntávamos outros ao grupo da videoconferência.

00:50:27:13 – 00:50:54:06
GRAÇA DE FREITAS
Perguntávamos um parecer de um que sabia muito de uma coisa de outro doutor. Estávamos assim quando a senhora ministra Marta Temido, me disse que tínhamos que ir para o ministério fazer uma conferência para dizer o que é que fazíamos às escolas. E só me lembro bem disto porque eu estava vestida a domingo em casa de uma colega e portanto fiz aquilo que acabei por fazer umas semanas todas seguida para mim foi pegar no lenço, porque não?

00:50:54:06 – 00:51:13:23
GRAÇA DE FREITAS
Claro que não eram eles e pedir umas coisas assim e pus sobre uma roupa de domingo e fomos as duas. E curiosamente a ministra deve ter feito a mesma coisa porque não estava a mentir para mim. E depois em poucas horas todas aquelas decisões se atropelaram e a última acaba por ser sempre uma decisão política baseada nas coisas técnicas.

00:51:14:00 – 00:51:44:07
GRAÇA DE FREITAS
Há aqui uma coisa que é bom e é bom que assim seja, porque, de facto, há uma responsabilidade e um poder político que, baseado nas opiniões dos técnicos que temos a obrigação, o dever, lealdade e a obrigação de dar a melhor informação possível às últimas decisões serão sempre dos políticos. É evidente que às vezes os políticos podem quase delegar em nós que ninguém elegeu aí nesse assunto de vida, porque nós não conseguimos sair deste impasse.

00:51:44:07 – 00:52:04:06
GRAÇA DE FREITAS
O que é que você acha que deve fazer? Mas mesmo assim, e eu acho que que é certo é que é bem, porque, volto a dizer, foram eleitos e têm mais responsabilidades que os técnicos não têm. Os técnicos têm uma obrigação diferente da obrigação dos políticos e uma delas é ser leal aos políticos com quem se trabalha. E outra dar lhes a melhor informação possível.

00:52:04:08 – 00:52:08:16
GRAÇA DE FREITAS
A terceira ter lugar à disposição e quarta sair, se for caso disso.

00:52:08:18 – 00:52:18:15
JORGE CORREIA
Houve algum momento em que em que a demissão foi considerada não como uma fantasia, mas como uma decisão tomada?

00:52:18:17 – 00:52:46:23
GRAÇA DE FREITAS
Eu acho que houve aqueles pequenos momentos que eu lhe estava a dizer há pouco. Houve vários dias e foi mais talvez no início e era por por por ondas, olhar. E como eu me era por ondas. Havia uma altura em que estava tudo aparentemente calmo, pois precipitavam se acontecimentos. Eu por vezes digo lhe sou sincera, metia a cabeça na almofada e pensava Olha aí, amanhã de pronto o diga a ministra que arranje outro.

00:52:46:24 – 00:53:09:03
GRAÇA DE FREITAS
Ela diz mim qualquer coisa, mas depois, no dia seguinte era outro dia. Fui. Não, não, não lhe consigo identificar, nem para mim própria, que gostava de ter uma, uma linha, uma timeline mais objetiva de toda esta amálgama. Eu gostava de ter ali tudo certinho, dia um, dia dois, dia três e se eu quisesse eu teria feito uma coisa.

00:53:09:05 – 00:53:21:10
GRAÇA DE FREITAS
É verdade. A Direção-Geral da Saúde tem uma Unidade de Emergências em Saúde Pública há muitos anos, desde o tempo do Zacarias. Tem timeline da Premier, já deu dinheiro, funcionários técnicos, está.

00:53:21:10 – 00:53:22:09
JORGE CORREIA
Lá, está desenhado que.

00:53:22:09 – 00:53:39:24
GRAÇA DE FREITAS
Deviam todos os dias o que se passava e eu é que nunca tive. Enfim, é vontade de ir visitar. Esta também me visita e da Legionella sempre para aprender para a próxima crise das duas janelas me mas não visitei a pandemia de saber que vamos fechar.

00:53:39:24 – 00:54:10:24
JORGE CORREIA
Mas eu quero saber como é que Graça de Freitas reage a duas coisas. A primeira é aos familiares que, ao longo desta crise, telefonaram ou disseram olha que isto se calhar não é assim. Portanto, crítica directa daqueles de quem mais gostamos e, por outro lado, aos inúmeros memes ou piadas na internet que se fizeram à volta da persona da Graça de Freitas, não da pessoa, mas daquela pessoa que teve aquela exposição mediática tão grande.

00:54:11:01 – 00:54:38:03
GRAÇA DE FREITAS
Então os meus familiares tiveram muito pouca intervenção, os meus familiares mantiveram se presentes para o que desse e viesse, mas manifestaram a sua opinião a posteriori. Eu só soube verdadeiramente o que eles pensaram e algumas vezes não pensaram muito bem depois. Portanto, houve muito pouca interferência dos meus familiares. E quando digo, tento de volta milhares de diretos, nomeadamente do meu irmão.

00:54:38:05 – 00:54:54:08
GRAÇA DE FREITAS
Convivo com o meu marido, portanto foram duas pessoas que quando contribuíram contribuíram pelos próprios serem portadores de informação ou científica ou jornalística ou má notícia, ao dizer me olha que estás a apanhar da esquerda, ou da direita, ou da frente, ao.

00:54:54:10 – 00:54:55:12
JORGE CORREIA
Garantir.

00:54:55:14 – 00:54:55:16
GRAÇA DE FREITAS
Que.

00:54:55:16 – 00:54:58:15
JORGE CORREIA
Descansava e que estava alimentada e que voltava para a missão.

00:54:58:17 – 00:55:22:12
GRAÇA DE FREITAS
Basicamente era isto. É exactamente isso. Meu marido tornou se um perito em compras extraordinário compras de supermercado domina até hoje tudo e, portanto, foi fácil. A segunda questão que mesmo pessoas nas piadas, as piadas, eu achava piada e eu achava piada as piadas. Apesar de tudo, eu só não achei piada a uma coisa e digo lhe que não achei mesmo e continuo a não achar e acho que nunca vou achar.

00:55:22:14 – 00:55:46:10
GRAÇA DE FREITAS
Eu tolerei melhor mesmo as pessoas que disseram muito mal de mim o façam em função do que aquelas que me conhecendo não vieram. Um guia dizer Epá, calma que ela não é assim tão má. Houve ali uns meses em que eu senti essa necessidade. Pensei mas não há aqui uma alma que ache que eu não estou a fazer tudo mal?

00:55:46:14 – 00:56:12:15
GRAÇA DE FREITAS
Porque houve uma altura em que eu percebi que as pessoas estavam todas ali, que eu estava a fazer tudo mal. E eu pensei mas não há aqui uma alminha que venha dizer o contrário? E quando finalmente essas alminhas surgiram, não imaginas o sentimento de gratidão eterna que eu terei para com essas pessoas, porque elas de alguma forma contrariaram aquela onda incrível, negativa, com razão e sem razão.

00:56:12:15 – 00:56:32:11
GRAÇA DE FREITAS
Algumas vezes eu não estou a dizer que fiz tudo certo, nunca lhe direi nem que faria tudo da mesma maneira. Também nunca direi, mas senti mais a falta de alguém que dissesse bem, calma que não é assim tão má do que escreveu, é mesmo mais péssima isso. Certa forma estava a fazer o papel deles e custou me muito.

00:56:32:13 – 00:56:33:17
GRAÇA DE FREITAS
Isso Custou me.

00:56:33:19 – 00:56:51:04
JORGE CORREIA
Reservo a última pergunta para. Saber ou para pensar se alguém se sente mais útil quando ocupou o cargo de director geral da Saúde, tendo que lutar contra uma pandemia ou nos primeiros meses, como médica na periferia, no Alentejo, no início da carreira.

00:56:51:06 – 00:57:13:23
GRAÇA DE FREITAS
É tudo tão diferente, porque há aqui um fator que não se pode comparar é o fator idade. Eu quando fui para o Alentejo ainda acreditava que podia salvar o mundo, que podia fazer a diferença, a mudança e que o facto de estar ali a fazer consultas de planeamento familiar. As senhoras de Ponte de Sor e eu fazer uma revolução sexual planetária.

00:57:13:23 – 00:57:42:12
GRAÇA DE FREITAS
Quer dizer, é totalmente diferente porque é diferente o tempo e o sítio, a minha idade e sobretudo isso também a idade das grandes crianças. Mas há uma coisa que eu sei em relação àquela população lá de Ponte de Sôr é que eu fiz consultas sobre materna de planeamento familiar e de pediatria aos filhos. Eu sei que fiz bem as pessoas que me ouviram durante a família eu não sei.

00:57:42:14 – 00:57:46:15
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, em calhando, fui mais útil nos meses de pode ser.

00:57:46:21 – 00:58:13:19
JORGE CORREIA
Mudar o mundo ou simplesmente servir os seus concidadãos. Até nesta dicotomia está um dilema de comunicação sobrevivemos ou fazemos a revolução? A pandemia recordou nos a todos uma dupla verdade não controlamos nada e dependemos muito dos outros para responder aos problemas difíceis. E aqui a comunicação pode dar uma boa ajuda, apaziguando os medos e oferecendo uma perspetiva de caminho até para a semana.

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Há dois tipos de comunicação especialmente difíceis e arriscados.

Porque são complexos, porque acontecem em conta-relógio e porque a audiência está particularmente sensível nesse espaço de tempo.

Esses dois tipos de comunicação, são a comunicação de crise e a comunicação de risco.

Trocando por miúdos, a comunicação de crise é aquela que temos de usar quando algo correu mal: um acidente, um incêndio, um qualquer evento onde existe um dano real ou potencial a pessoas, ou bens. Principalmente pessoas.

A comunicação de risco em saúde pública é aquela que todos beneficiamos aquando da pandemia de COVID-19.

Essa comunicação teve como face principal Graça de Freitas, médica de saúde pública e ao tempo diretora-geral da saúde.

Esta conversa é sobre a dificuldade de planear, reagir e responder de forma credível a uma das maiores ameaças que vivemos na nossa vida coletiva.

Um manual do uso da comunicação tem tempos sem livro de instruções.

Todos sentimos:

A incerteza era o dia-a-dia.

Quando chega a pandemia?

Quando chega o vírus?

Vai matar-me?

Como me salvo desta?

Lembram-se?

Era este o ambiente que todos vivemos quando percebemos que a anunciada pandemia chegou.

Vivemos o receio, o medo, a dúvida.

Vivemos a angústia de ficar presos em casa por decreto geral.

Das escolas que fecharam. Dos lares com dezenas de idosos doentes.

Com hospitais cheios. Com ambulâncias em marcha.

Isto foi o que todos vimos em casa.

Mas no olho do furacão pandémico, no centro de crise e resposta está Graça de Freitas. Não está sozinha, mas tem uma equipa muito curta.

A ela cabe-lhe conseguir consensos entre cientistas e boas explicações e prognósticos para os decisores políticos.

No meio de tudo isto há que explicar aos cidadãos o que está a acontecer, como nos protegemos, como vivemos com isto.

No tempo das redes sociais.

Onde a opinião do mais sabedor dos cientistas parece valer tanto ou menos que o cidadão dedicado à arte nacional da opinião gratuita sobre tudo.

Mas mesmo no centro de comando, onde toda a informação chegava, onde todos os pensadores filtravam e tentavam entender o mundo, mesmo aí, havia demasiada informação, demasiadas contradições e um avassalador relógio que corria mais do que qualquer evidência.

Mais do que nunca o teste à credibilidade das fontes é critico. Mas a rapidez da comunicação digital e localizada não podia ser ignorada.

A pandemia deveria ser por si só um objeto de estudo detalhado da comunicação de risco. Eu já comecei a ler esse livro.

A Comunicação em Tempos de Informação Imperfeita

Um dos temas mais fascinantes abordados neste episódio é o desafio de comunicar quando a informação está longe de ser completa ou perfeita. “A informação era imperfeita, os dados mudavam a toda a hora”, lembra Graça Freitas, explicando que, muitas vezes, as diretrizes que comunicava ao público eram baseadas em informação que podia ser revista ou até desmentida pouco depois. “O grau de imperfeição era grande”, confessa, num tom honesto que caracteriza toda a sua participação no podcast.

Este cenário reflete um dos maiores dilemas da comunicação em saúde pública: como ser honesto e transparente quando as certezas são escassas? Graça optou sempre pela clareza e pela sinceridade. Reconhece que, em muitos momentos, teve de comunicar incertezas e explicar o que ainda não se sabia. Este equilíbrio entre a informação e a cautela foi uma linha ténue que teve de trilhar durante todo o período pandémico.

Medo, Resiliência e o Lado Pessoal da Pandemia

Outro ponto alto da conversa é quando Graça Freitas reflete sobre o medo. No início, confessa, não teve tempo para sentir medo pessoal, pois estava absorvida em compreender o que estava a acontecer. No entanto, à medida que o número de casos aumentava, especialmente em Itália, e o mundo começava a fechar as suas portas, o medo tornou-se uma realidade inevitável.

Mas talvez o relato mais surpreendente seja o momento em que a Dra. Graça começa a receber proteção policial devido a ameaças. “Nunca pensei que precisaria de proteção”, revela, descrevendo o choque de saber que um segurança estaria à porta da casa todos os dias. Este episódio mostra o lado mais humano da crise: a carga emocional e pessoal que quem esteve na linha da frente teve de carregar.

Memes e Piadas: Rir para Não Chorar

Num tom mais leve, Graça Freitas fala sobre os memes e piadas que circularam nas redes sociais a seu respeito durante os momentos mais difíceis da pandemia. Ela admite que achou graça a muitos deles. O humor, para ela, foi uma forma de a população lidar com a tensão constante, e, em alguns momentos, também serviu para ela própria aliviar o peso da responsabilidade. No entanto, Graça confessa que o que mais a magoou não foram as piadas, mas a ausência de defesa de algumas pessoas que a conheciam bem e que, durante os momentos de maior crítica, escolheram o silêncio. “Doeu mais não ouvir um ‘ela não é assim tão má’ do que as críticas em si”, diz com honestidade.

Lições sobre Comunicação em Saúde Pública

Este episódio deixa lições claras sobre o que significa comunicar em tempos de crise. Graça Freitas sublinha a importância de ser transparente, mesmo quando as respostas não são certas. A honestidade foi a sua bússola durante toda a pandemia, sabendo que esconder a realidade ou suavizar as mensagens poderia ser ainda mais prejudicial a longo prazo. Esta abordagem honesta, contudo, não foi fácil de manter. Graça admite que, se pudesse voltar atrás, teria dedicado mais tempo a refletir sobre as decisões, reservando momentos para pensar com mais calma e ouvir mais opiniões externas.

Outro ponto interessante que ela aborda é o equilíbrio entre as recomendações dos cientistas e as decisões dos políticos. Como Diretora-Geral da Saúde, Graça tinha a responsabilidade de fornecer as melhores recomendações científicas, mas reconhece que os políticos, ao tomarem as decisões finais, lidavam com uma pressão diferente. Eles não só estavam preocupados com a saúde pública, mas também com as implicações sociais, económicas e políticas. Esta tensão entre ciência e política é um elemento central nas crises de saúde pública e, segundo Graça, foi um dos grandes desafios da pandemia.

Fechar as Escolas: Uma Decisão Crucial

Um dos momentos mais dramáticos da pandemia foi a decisão de fechar as escolas. Graça Freitas descreve este episódio como um dos mais rápidos e intensos que viveu durante aqueles meses. Ela lembra que, num domingo, estava em casa de uma amiga quando recebeu o telefonema da Ministra da Saúde, Marta Temido. Poucas horas depois, já estava numa conferência de imprensa, anunciando uma das medidas mais duras e impactantes para o país.

Para ela, este é um exemplo claro de como as decisões políticas, mesmo quando baseadas em recomendações científicas, são tomadas de forma muito rápida e, por vezes, sem o tempo necessário para refletir sobre todas as implicações. No entanto, Graça reconhece que, em muitos casos, essa rapidez era essencial para salvar vidas e minimizar o impacto da crise.

Reflexões Finais

O episódio termina com Graça Freitas a refletir sobre o seu papel durante a pandemia e o impacto que teve no país. Ao olhar para trás, ela admite que faria algumas coisas de forma diferente, mas mantém a convicção de que fez o melhor que podia com a informação disponível. O legado que deixa não é só o de uma profissional de saúde pública dedicada, mas também de uma comunicadora que, mesmo em tempos de incerteza, soube manter a calma, a integridade e a transparência.

Este episódio do “Pergunta Simples” é uma verdadeira aula sobre comunicação em tempos de crise, repleta de momentos humanos e reveladores. As histórias e as lições de Graça Freitas oferecem uma perspetiva única sobre os desafios enfrentados por quem esteve na linha da frente da pandemia e, ao mesmo tempo, mostram o lado mais vulnerável e pessoal da comunicação em saúde pública.

LER A TRANSCRIÇÃO DO EPISÓDIO

00:00:12:23 – 00:00:38:24
JORGE CORREIA
Olá! Viva um Bem vindos ao Pergunta simples do vosso full cast sobre comunicação. Há dois tipos de comunicação especialmente difíceis e arriscados, mas necessários e importantes. São complexos porque acontecem em contrarrelógio e porque a audiência está particularmente sensível nesse espaço de tempo ou local. Estes dois tipos de comunicação são a comunicação de crise e a comunicação de risco.

00:00:39:05 – 00:01:11:01
JORGE CORREIA
Parecem a mesma coisa, mas não são exactamente a mesma coisa. Trocando por miúdos, a comunicação de crise é aquela que temos de usar quando algo corre mal um acidente, um incêndio, um qualquer evento onde exista um dano real ou potencial para pessoas ou bens, principalmente pessoas. Um outro tipo de comunicação difícil é a comunicação de risco, em particular a comunicação de risco em saúde pública é aquela que todos beneficiamos quando aconteceu a pandemia de Calvi 19.

00:01:11:03 – 00:01:34:12
JORGE CORREIA
Esta comunicação teve como face principal Graça de Freitas, médica de Saúde Pública e, ao tempo Directora Geral de Saúde. Esta conversa é sobre a dificuldade de planear, reagir e responder de forma credível a uma das maiores ameaças que vivemos na nossa vida colectiva. Não só responder à ameaça propriamente dita, mas também comunicar sobre aquilo que nos estava a acontecer.

00:01:34:14 – 00:01:52:03
JORGE CORREIA
No fundo, como escrever um manual de uso da comunicação de risco em saúde pública em tempos sem livro de instruções?

00:01:52:05 – 00:02:14:06
JORGE CORREIA
A incerteza era o dia a dia. Quando chega a pandemia, quando chega, o vírus Vai matar me com um salve desta. Lembram se? Estas eram as perguntas que todos fazíamos todos os dias. Era este o ambiente que todos vivíamos quando percebemos que a anunciada pandemia chegou. Vivemos o receio, o medo, a dúvida, a esperança e depois o conseguir passar à frente.

00:02:14:12 – 00:02:35:15
JORGE CORREIA
Vivemos a angústia de ficar presos em casa, por decreto geral das escolas que fecharam dos lares com dezenas de idosos doentes de uma só vez, com hospitais cheios, com ambulâncias em marcha. Isto foi o que todos vimos em casa, mas no olho do furacão Pandemic, no centro de Crise e resposta está a Graça de Freitas. Ela não está sozinha, mas tem uma equipa francamente curta.

00:02:35:20 – 00:03:04:04
JORGE CORREIA
A ela cabe lhe conseguir consensos entre cientistas e boas explicações e prognósticos para os decisores políticos. No meio de tudo isto, há que explicar aos cidadãos o que está a acontecer, como nos protegemos e como vivemos Com isto tudo no tempo das redes sociais, onde a opinião do mais sabedor dos cientistas parece valer tanto ou menos do que a do cidadão dedicado à arte nacional, da opinião gratuita sobre tudo e sobre nada ao mesmo tempo.

00:03:04:06 – 00:03:33:16
JORGE CORREIA
No centro de comando, onde toda a informação chegava, onde todos os pensadores filtravam e tentavam entender o mundo, mesmo aí havia demasiada informação, demasiadas contradições e um avassalador relógio que corria mais do que qualquer evidência. Havia fontes, mas as fontes muitas vezes contradiziam se. Mais do que nunca, o teste à credibilidade das fontes é crítico, mas a rapidez da comunicação digital é localizada e não podia ser ignorada.

00:03:33:18 – 00:03:46:09
JORGE CORREIA
A pandemia deveria ser, por si só, um objecto de estudo detalhado da comunicação de risco. E eu já comecei a ler este livro nesta edição.

00:03:46:11 – 00:04:15:19
JORGE CORREIA
Viva Dra. Graça de Freitas, Médica de Saúde Pública. Se calhar nem sequer é preciso apresentá la. Decidiu ser directora geral da Saúde no período mais assustador para a nossa saúde nos últimos anos. Para aquela pergunta que é onde é que estava no 25 Abril 1974, neste caso, e onde é que estava no dia E no momento em que leu a notícia ou alguém comunicou da OMS que a pandemia vinha aí?

00:04:15:21 – 00:04:42:24
GRAÇA DE FREITAS
Eu não sei onde é que estava nesse dia, porque para mim tudo começou muito antes e sei onde é que estava. No dia 31 de dezembro de 2019. Estava muito bem, muito contente e muito optimista em relação ao ano 2020. Estava com uma fezada que 20 20 ia ser um ano fantástico, números redondos repetidos, não era bem uma capicua, mas estava mesmo como uma, pois não acreditava que 20 20 ia ser um ano fantástico.

00:04:43:01 – 00:05:01:19
GRAÇA DE FREITAS
E depois, como sabe, no dia seguinte percebeu se que havia um novo vírus. Mas não é a primeira vez que havia o novo vírus. Nós que trabalhamos em saúde pública e quem tem acesso a estes dados vi emergirem. Vírus de uns nunca chegam a ser problemáticos, outros evoluem para pequenos problemas, outros são cometidos bem.

00:05:01:21 – 00:05:05:18
JORGE CORREIA
E era quase uma matemática certa de que um dia, um dia.

00:05:05:20 – 00:05:23:23
GRAÇA DE FREITAS
Chuvisca e eu já tinha passado. E noto bem, por uma pandemia como profissional de saúde, eu passei pela pandemia de gripe A, que estava à espera de uma coisa terrível e que depois, apesar de ter sido uma pandemia, ocupou todo o mundo. Foi ligeiro, o vírus não era assim tão agressivo e.

00:05:23:24 – 00:05:26:10
JORGE CORREIA
Isso, isso foi dez anos antes da pandemia, até.

00:05:26:11 – 00:05:55:04
GRAÇA DE FREITAS
Mais do que dez anos antes. A gripe A, creio, se a memória não me falha, foi em 2009 e, portanto, foram 11 anos antes. Mas de qualquer maneira, foi uma pandemia para a qual estávamos altamente preparados. Tínhamos feito um livro inteiro na DGS, escrevemos um livro para vírus respiratórios, para a temida gripe. O professor Correia de Campos, durante um ano, autorizou uma task force que ocupou um país inteiro da DGS, com gente da privada, do público.

00:05:55:05 – 00:06:29:24
GRAÇA DE FREITAS
Todos os sectores que só fizeram aquele livro trabalharam para aquele livro e muitos especialistas colaboraram connosco. Bem, dito isto, sei onde é que estava na noite da véspera do ano de 2020, muito satisfeita com o novo ano e sei onde é que estava no dia 21 de Janeiro. Foi quando criei as forças como diretora geral, Quando eu percebi que era irreversível, grande ou pequena, não sabia as características exactamente, Também não, mas que o melhor era internamente, com ascendente direcção da DGS da OMS, a DGS.

00:06:29:24 – 00:06:30:14
GRAÇA DE FREITAS
Preparar se.

00:06:30:18 – 00:06:39:11
JORGE CORREIA
O que se pensa nessa altura? Pensa se ok, vamos fazer isto porque estamos preparados para o fazer. Ou Ohmeudeus, saiu uma fava.

00:06:39:13 – 00:07:05:21
GRAÇA DE FREITAS
Não? Eu na altura ainda estava. Eu estava calma e controlada, mas tinha a sensação que podia ser pior do que nas outras alturas. Tanto isso que fiquei bastante desconfortável com a placidez com que alguns dos meus colaboradores estavam. Eu já estava em estado não plácido por isso e cortei. Decretei a criação daquela task force, mas havia muita gente que estava ainda muito a dizer o vai ser como é.

00:07:05:21 – 00:07:26:02
GRAÇA DE FREITAS
Já tivemos outras emergências, os Marburg, já sabes, não era a primeira emergência que tínhamos, não era a primeira vez que a ativava nos motores Force no meu tempo ou no Dr. Francisco Jorge e portanto, havia alguma calma. Olhe para mim nesse dia também. Nunca mais me esqueço. Foi a primeira vez que eu mandei vir comida para a DGS de levar por motorizadas e estafetas.

00:07:26:02 – 00:07:36:24
GRAÇA DE FREITAS
Nunca tinha usado aquele método, o mundo era outro e foi a primeira vez que me dei comigo a escolher comida para fazer uma refeição à noite nocturna na DG.

00:07:37:02 – 00:07:58:15
JORGE CORREIA
Há um choque mediático, lá está, para lidar com essa incerteza que é a pergunta, repete se quando começamos a saber que há um vírus algures lá no Oriente e é Rebanhão. A Dra. Graça de Freitas num sítio qualquer. E perguntam então a pandemia? É desta que vem aí que é séria? Eu lembro que a resposta foi, por um lado, tranquilizadora.

00:07:58:17 – 00:08:23:02
JORGE CORREIA
A minha perceção dessa altura foi calma, que ainda não é desta ou ainda não é agora, ou não é iminente que o vírus da vaca vai chegar. E isso, isso depende. Isso é porque não há informação suficiente, porque não é antecipada ou que aconteça, ou porque o raio destes cientistas teimosos da task force na realidade estavam a dizer calma que isto vai ser igual a sempre.

00:08:23:04 – 00:08:33:10
GRAÇA DE FREITAS
Não foram, creio eu, três coisas distintas. Pensando agora na sua pergunta, a primeira foi toda a experiência passada, nomeadamente de facto com a gripe.

00:08:33:15 – 00:08:34:16
JORGE CORREIA
A, o Pedrinho.

00:08:34:18 – 00:08:59:08
GRAÇA DE FREITAS
O Pedro e o Lobo. Nós estávamos preparados em 1997 com o professor Constantino Sartori. Despedimo nos quase na véspera de Natal. Eu dizia Deus queira que já não seja. Este Natal tinha sido a matança das gripes e das galinhas em Hong-Kong. Foi a nossa primeira proto pandemia. Portanto, estávamos à beira de um abismo e estávamos apavorados. O vírus era do pior, era o H5N1 aviário das galinhas.

00:08:59:08 – 00:09:00:00
JORGE CORREIA
E esse matava.

00:09:00:00 – 00:09:40:21
GRAÇA DE FREITAS
Me. Letalidade brutal. Matava mesmo. Matou muita gente em Hong Kong e, portanto, estávamos muito assustados e a partir daí não havia preparação nenhuma. Em quase país nenhum eu encontrei um plano contingência para a dita da gripe de duas páginas da Bélgica e foi uma coisa maravilhosa que nos guiou e ajudou a fazer um plano para Portugal. Tanto. Por um lado, tínhamos essa experiência toda do H5N1, gripe das galinhas, a gripe das aves, uma grande expectativa, enfim, aquela célebre comissão de acompanhamento da gripe aviária, cujo acrónimo o Jorge Correia fez o favor de me dizer, logo cinco minutos depois da nomeação em Diário da República.

00:09:40:21 – 00:09:42:21
JORGE CORREIA
E não era capaz de ser um nome bom.

00:09:43:00 – 00:09:48:23
GRAÇA DE FREITAS
Não era um nome bom, atendendo a circunstâncias bom CH. E portanto.

00:09:49:03 – 00:09:53:15
JORGE CORREIA
A comissão chamava se Caga Convenção, acrónimo Ipso facto, é verdade em termos de comunicação ninguém.

00:09:53:15 – 00:10:17:07
GRAÇA DE FREITAS
Reparou, atendendo que metia galinhas e que caca de galinhas não foi uma boa ideia. Bem, dito isto, havia esse passado o SARS. Não se esqueça que o vazar daí sim, um susto terrível. Este vírus se chamava Chaves, como dois já outros vídeos do SARS e o primeiro SARS verdadeiramente perigoso foi o de passar de 2003, mas esse apareceu.

00:10:17:09 – 00:10:28:12
JORGE CORREIA
Matou muita gente no lado oriental. De resto, o MS declara que é desta que era a pandemia a verdadeira pandemia. E subitamente o vírus desapareceu.

00:10:28:14 – 00:10:47:19
GRAÇA DE FREITAS
Não foi? Subitamente levou muitos meses. O que é que acontece com esse vírus? Houve aqui várias circunstâncias de sorte. Uma delas é que ele sai da China e vai para o Vietname usar um da pneumonia atípica. Ao deixar em Portugal, o Dr. Francisco gostava de batizar as coisas com nomes portugueses. Chamou lhe pneumonia.

00:10:47:19 – 00:10:49:03
JORGE CORREIA
Atípica e fazia de manhã.

00:10:49:05 – 00:11:09:24
GRAÇA DE FREITAS
E à tarde. O que é que acontece com cão com esse vírus? Ele sai de facto da China e vai para o Vietname, dá um soco no Vietname. E há aqui uma coisa importante morre o médico francês no Vietname e aí soam muitos alertas e depois os focos que houve no mundo. Passa se primeira fase dos planos de contingência que é conter?

00:11:09:24 – 00:11:39:19
GRAÇA DE FREITAS
É a fase da contenção. E aqui chegados, chegamos a pandemia da 19 e ao início do ano de 2020. Eu venho com este histórico H5N1 SARS que foi possível conter fazer os grandes planos de contingência, pois a pandemia da gripe A que se chamou a porque ninguém queria ficar com o ónus ter aquela gripe porque ainda foi do México e ainda foi dos Estados Unidos, depois era das Américas e acabou por ser gripe A porque o vírus lá há muito tempo.

00:11:39:19 – 00:11:45:02
JORGE CORREIA
Depois havia a dúvida onde é que o vírus pode ter nascido? Isso? Isso era uma gripe a.

00:11:45:03 – 00:12:10:18
GRAÇA DE FREITAS
Ficar com aquele vírus, Ainda por cima porque em material suíno, material aviário, tudo o que mete material suína, as pessoas não querem fama. O vírus fica. Ficou conhecido como gripe, o que não dá jeito nenhum, porque os vírus da gripe, alguns são mesmo vírus. Pronto. Mas a pandemia chamou se eu vinha desse passado e quando aparece o ser que se chamava Sasha, ele chamava se outra coisa.

00:12:10:18 – 00:12:46:19
GRAÇA DE FREITAS
No início da pandemia, quando aparece esse vírus no que nós, no Ocidente e em todo o mundo sabemos desde as primeiras horas de 2020, não era a primeira vez que nos acontecia. Havia variadíssimos desfechos possíveis o da gripe das galinhas, o azul do Mar Morto. E já só falando dos mitos respiratórios, havia vários desfecho de um dos desfechos podia ser um desfecho ou de contenção dos focos ou de contenção na China, ou de ser mais um dos vírus que aparecia depois de combater, dizia, desaparecia pelo menos aparentemente desaparecia e, portanto, havia muitos cenários possíveis.

00:12:46:19 – 00:12:53:01
GRAÇA DE FREITAS
Isto numa fase inicial. E depois tudo se precipita, porque depois tudo isto é muito rápido.

00:12:53:01 – 00:12:58:07
JORGE CORREIA
Aparece em Itália um caso, dois casos, dez casos em que havia que um perde se, perde o controle.

00:12:58:08 – 00:13:03:20
GRAÇA DE FREITAS
Perde se completamente o controlo. A Itália faz aquela importação da China.

00:13:03:20 – 00:13:07:18
JORGE CORREIA
Como consegue se perceber hoje como é que o vírus chega a Itália.

00:13:07:20 – 00:13:30:12
GRAÇA DE FREITAS
Como consegue se por viagens, por cadeias epidemiológicas. Ele não salta, nem o INEM vem sozinho. Habitualmente são pessoas, outras pessoas, outras pessoas. E depois descobriu se supostamente a pessoa, a pessoa chinesa, que foi transportando o vírus até que o vírus chega à Europa. Depois, a questão de Itália tem muito a ver com a preparação. E foi um impacto terrível nos serviços de saúde.

00:13:30:12 – 00:13:57:01
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, nós fomos dominados em simultâneo. Isto leva, enfim, a uma intensidade que gera, sim, de todo o fenómeno pandemia que é a China em Lockdown e em confinamento fechada. Milhões e milhões de pessoas, uma região inteira, uma cidade e depois as imagens de Itália. A partir daqui. Não era só uma questão do vírus, é como é que era o vírus que extravasou completamente.

00:13:57:03 – 00:14:02:02
JORGE CORREIA
Passamos aí a viver uma coisa. Todos em sociedade, que é o medo.

00:14:02:04 – 00:14:04:01
GRAÇA DE FREITAS
O medo. Exactamente.

00:14:04:04 – 00:14:27:22
JORGE CORREIA
E eu gostava de, Na crise anterior, no Vietname, morre o médico francês. É como é que a médica Graça de Freitas, perante um vírus que está a matar como matou na fase inicial em Itália e com os sistemas de saúde todos a estourar, que foi aquilo que nós vimos no norte de Itália. Tem medo? Se sente medo pessoal?

00:14:27:24 – 00:14:29:16
GRAÇA DE FREITAS
Bem, eu nesta fase.

00:14:29:17 – 00:14:31:11
JORGE CORREIA
Não há tempo sequer para pensar nisso.

00:14:31:13 – 00:14:52:23
GRAÇA DE FREITAS
Nessa fase inicial, mesmo no início eu não senti esse medo pessoal. No início eu só tinha uma, uma vontade enorme de perceber o que se estava a passar. E depois, quando comecei a ser chamado a explicar o que estava a passar, tinha uma preocupação imensa, porque eu sabia que tinha informação imperfeita e que tinha que comunicar a impressão imperfeita.

00:14:52:23 – 00:14:55:02
GRAÇA DE FREITAS
E sempre a informação é sempre imperfeita.

00:14:55:06 – 00:14:56:17
JORGE CORREIA
Falta lhes o quê? O que é que informação.

00:14:56:17 – 00:15:32:10
GRAÇA DE FREITAS
Imperfeita é exactamente isso. Havia muitas fontes de informação. Havia muito ruído, note bem os timings. O tempo da tecnologia, o tempo das redes sociais. Há um antes e o depois. Com a vida assim e desse e, portanto, o mundo de certa forma, até ao ano anterior, a comida era um mundo que nós de alguma forma percebíamos. As fontes de informação, o tipo de informação, os canais onde essa informação vinha, se era mais ou menos credível, se era científica ou não, era científica e de repente era uma verdadeira avalancha de informação.

00:15:32:12 – 00:15:56:06
GRAÇA DE FREITAS
Havia a informação da ciência e com os seus pergaminhos e requisitos. Depois havia tudo, tudo o resto do mundo, as imagens, todas aquelas imagens dos carros militares em Itália, dos caixões de ano fechado e depois de muita informação e que agora sabe se, não é para o lado, mas que a altura era quase paralela a das redes, a dos órgãos de comunicação.

00:15:56:06 – 00:16:18:19
GRAÇA DE FREITAS
Tudo um bocadinho perdido, portanto, com muitas, muito poucas certezas. E eu diria que o grau de imperfeição da informação era grande. Ao contrário do grau de preparação. O que eu quero aqui dizer na minha cabeça a preparação. Eu tinha feito tal livro com outra colega. Editamos o livro para a Direção-Geral da Saúde. Na minha cabeça existe achar se anterior à inicial.

00:16:18:21 – 00:16:47:10
GRAÇA DE FREITAS
Existia uma fase de contenção, existia uma fase de mitigação. Se a contenção falhasse, os hospitais de referência tanto do ponto de vista da preparação, eu não estava assim tão impreparada. O que não estava era à espera que a comunicação fosse tão complexa e a complexidade começava logo nas fontes. Eram fontes imperfeitas e imperfeitas. Isto tudo efémeras. Eu lembro me que eu acabava de saber uma coisa qualquer, uma novidade.

00:16:47:12 – 00:16:59:21
GRAÇA DE FREITAS
Fosse lá o que fosse. E dentro de minutos, 01h00, duas horas, era o tempo que eu levava a sair da DGS. Era um estudo de televisão, estava em todo o lado, não era assim ou estava em todo o lado, ou já não era bem assim. Era de outra forma.

00:16:59:21 – 00:17:02:06
JORGE CORREIA
Como é que se gere isso? Como é que geriu isso?

00:17:02:08 – 00:17:25:24
GRAÇA DE FREITAS
Bem, eu tentei fazer uma coisa e acho que isso se deve à minha formação médica e à minha formação como doente. Eu também sou uma doente bastante bem documentada, encartada em doenças, que é eu, quando eu tenho informei, me licenciei me sim e comecei a fazer clínica. Fui, tive bons mestres e um deles dizia me assim entre, estava por vir esse nível.

00:17:25:24 – 00:17:47:16
GRAÇA DE FREITAS
Gracinha, você não tem. Busque os doentes mais do que eu. Já estão, que os doentes já estão assustados, já estão mal e, portanto, não é preciso ser tarde, ainda mais vai morrer em 15 dias, vai morrer e eu? Aquilo para mim foi uma lição muito importante. Estas pessoas estão assustadas. Tem uma doença além da doença, tem o tal do medo.

00:17:47:18 – 00:17:55:13
GRAÇA DE FREITAS
Não sabem o prognóstico, portanto não estão aqui à espera que haja um médico que lhes diga isto é pior do que você pensa. E vai piorar tanto.

00:17:55:18 – 00:17:58:17
JORGE CORREIA
Ter tempo que muitas vezes o próprio médico, nalgumas circunstâncias, também.

00:17:58:17 – 00:18:20:23
GRAÇA DE FREITAS
Também não tem certeza se a tal comunicação, a tal informação imperfeita e, portanto, impensada. E daí? O que quer que eu diga, não posso mentir, tem de ser clara, nem tem grande vocação para mentir. Se quer que lhe diga isso das pessoas menos vocacionadas para dizer mentiras. Mas venha assim agora, para mentir assim, de propósito, não. E portanto, tinha a preocupação de não preocupar.

00:18:21:00 – 00:18:39:15
GRAÇA DE FREITAS
E depois, também pensando em mim própria, como alguém que recebe más notícias, também me lembrava de como é que eu gostava que as notícias me fossem dadas com verdade, com clareza, com algum prognóstico, mas com alguma serenidade. Também nunca gostei de doente, de receber notícias de supetão e drásticas.

00:18:39:18 – 00:18:58:21
JORGE CORREIA
Portanto, implicava alguma comunicação que preparasse o contexto que conseguisse explicar a realidade até ao ponto em que ela antecipava que fosse rigorosa e que, ao mesmo tempo fosse vertida nos media. Que tenha um filtro. Ele próprio é que tem uma forma de contar a história.

00:18:58:23 – 00:19:21:18
GRAÇA DE FREITAS
E tudo isso só foi tudo isso. E volto à mesma coisa, portanto. E eu não tive grande controlo sobre a situação, no sentido em que ela era muito e muito tensa. O que esta pandemia para mim teve de completamente diferente foi e quanto à idade? Eu era criança. Falar de informação e comunicação, a quantidade e a rapidez como tudo se passou.

00:19:21:18 – 00:19:34:03
JORGE CORREIA
E como é que se filtra, como é que se arranja um contexto, como é que se é, como é que se percebe o que é importante, do que é que o acessório ou até quando é que, quando o acessório está a contaminar a agenda pública?

00:19:34:05 – 00:19:59:01
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, eu vou lhe dizer que será com alguma intuição e com tudo o que se aprendeu até aí. E eu acho que, obviamente, eu fui o reflexo da minha educação, da minha preparação e do meu treino. E lembro agora há pouco tempo de uma amiga minha que um dia responder a uma pergunta desse género, dizendo assim, dizendo a pessoa que lhe perguntou há uns 40 anos, com bom senso e imaginação e diz lhe a pessoa está bem, mas então e o que é que O que é que baliza o bom senso?

00:19:59:01 – 00:20:20:15
GRAÇA DE FREITAS
Ela responderia imaginação. E perguntei lhe o outro Então e o que é que baliza a imaginação? Ela respondeu lhe o bom senso. Bem, e não saímos daí. Mas basicamente eu tentei fazer o que foi possível dentro de princípios que eu tinha de ser o mais rigorosa possível do ponto de vista técnico. Sabia de não ter de mentir, de ser transparente, não esconder.

00:20:20:17 – 00:20:35:18
GRAÇA DE FREITAS
Mas muito foi vir ao de cima o que eu tinha aprendido, a intuição. E hoje, hoje que já passou, tenho a sensação hoje que a maior parte do tempo que vive sem qualquer rede por baixo, portanto.

00:20:35:20 – 00:20:36:20
JORGE CORREIA
Era sentido isso.

00:20:36:20 – 00:21:00:06
GRAÇA DE FREITAS
Não estar na altura. Eu acho que nem senti na altura. Pragmaticamente, as coisas que tinham que ser feitas tem que ser ditas, tenham de ser comunicadas. Houve uma coisa que abonou a meu favor. Eu de facto não era uma pessoa. Como é que eu ia dizer, com pouca cultura de epidemias e de pandemias e de doenças infecciosas e de contágios, e isso, de alguma forma, dava me algum conforto.

00:21:00:06 – 00:21:26:18
GRAÇA DE FREITAS
O que eu pensava é mas eu não sou uma ignorante. Eu tenho um passado na área da saúde pública, na área das vacinas, na área das epidemias. Eu passei por todas as epidemias, desde 2000, desde 1996. Todas as que houve e passei na primeira linha da frente, eu vou para Diretora-Geral da subdirectora Geral, exatamente para tomar conta da questão pandemia, que o Dr. Francisco precisava de alguém que o ajudasse nessa matéria.

00:21:26:19 – 00:21:46:06
JORGE CORREIA
E então, como é que lidou com esta curva? No fundo, que é primeiro estamos todos assustados e sabemos que há uma má e uma gripe endémica e queremos saber o máximo de informação. Mas fundamentalmente temos aquela pergunta que é vamos morrer disto ou não vamos morrer disto? O que é que vai acontecer? Que é que não aconteceu? Portanto, estamos alguém com credibilidade.

00:21:46:08 – 00:22:13:01
JORGE CORREIA
Depois começamos a ouvir com esta graça de Freitas, que é, no fundo, uma cara e uma voz de uma instituição que nos vai salvar desta crise. É essa a sensação. E nessa navegação da incerteza, como é que se lida com o momento em que deixa de ser uma figura tão, tão popular e é tão, tão bem vinda a dizer Olha, lá está a Graça Freitas a dar nos más notícias.

00:22:13:01 – 00:22:20:08
JORGE CORREIA
Olha, lá está a decidir fechar as escolas. Olha lá, está a obrigar nos a usar o raio de uma máscara. Como é que? Como é que é?

00:22:20:10 – 00:22:51:08
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, eu ao contrário de algumas pessoas que dizem se eu olhasse para trás eu fazia tudo igual, eu não. Eu fazia muitas coisas de maneira diferente. E um dos problemas que eu acho que posso ter tido e que tive de certeza foi que me deixei de tal maneira pela intensidade das coisas na hora, no dito online que eu tive poucos inputs, poucos poucos momentos para reflectir no que verdadeiramente se estava a passar.

00:22:51:10 – 00:23:13:14
GRAÇA DE FREITAS
Se eu passasse por uma situação semelhante, obviamente que é muito fácil falar agora, eu reservaria uma parte, provavelmente da minha manhã e uma parte da minha tarde e uma parte da minha noite para pensar, para pensar e para ouvir algumas pessoas darem me. Enfim, o a sua opinião do que estava a passar à volta, o ter uma espécie de um conselho com pessoas.

00:23:13:14 – 00:23:14:17
JORGE CORREIA
Fora da bolha de.

00:23:14:18 – 00:23:41:22
GRAÇA DE FREITAS
Estado, fosse porque entre alturas estávamos, cada um de nós foi por nossa conta. Eu não sei o que é que as pessoas pensam que a Direção-Geral da Saúde e a Direcção Geral do Estudo e uma grande instituição, fez hoje 125 anos e uma instituição pela qual eu tenho uma admiração máxima, porque fiz coisas absolutamente extraordinárias, pois era uma instituição pequena em recursos de todas as formas, em recursos digitais e recursos humanos.

00:23:41:24 – 00:24:02:10
GRAÇA DE FREITAS
Tudo. Nós não éramos um nós, eu éramos os seres. Esse eu sei dizer não, não somos nada disso. Não éramos nem somos. Todos nós éramos uma casa muito mais pequena e, portanto, com tantas tarefas que nós tínhamos para fazer, uns tinham que estudar, outros nunca comunicar ou tinham de fazer campanhas ou tinham que exercer o papel de autoridade de saúde.

00:24:02:10 – 00:24:26:07
GRAÇA DE FREITAS
Eu sou a Autoridade de Saúde, era a Autoridade de Saúde nacional, tinha uma carga, uma responsabilidade nesse papel para o para os cidadãos, para os meus colegas, para as outras agências do ministério. Isso brutal. Se nós estávamos assoberbado nos cada um a tentar fazer a sua tarefa e poucas vezes tínhamos apoio uns dos outros, isto é, falar da fase inicial.

00:24:26:07 – 00:24:28:19
JORGE CORREIA
Como como é que eram, como é que era um dia atípico?

00:24:28:21 – 00:25:07:10
GRAÇA DE FREITAS
Era atípico, Não havia dia típico. A única coisa que nós sabíamos é que lutávamos contra o tempo para ter boa informação epidemiológica a melhor possível. Como? Enfim, com instrumentos rudimentares até a nível das tecnologias básicas da vida, da potência dos computadores e, portanto, e dos recursos humanos, lutávamos para ter boa informação e tempo. Mais ou menos. Lutávamos por saber o que é que os outros países estavam a pensar, porque era importante, sobretudo os europeus, as agências europeias, o MS, o órgãos de referência, CDC americano, enfim, todas essas coisas que nos davam também bons contributos para o estado da arte.

00:25:07:12 – 00:25:21:21
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, eram, eram de absolutamente alucinantes. Portanto, nós não sabíamos nunca como é que aquele dia ia ser e nada acontecia na hora programada. Vocês que estiveram do lado de lá, que eu não vi nunca nenhuma conferência de imprensa, amigas e nem hoje, Como.

00:25:21:21 – 00:25:24:04
JORGE CORREIA
É que é? Como é que foi aparecer todos os dias?

00:25:24:04 – 00:25:31:20
GRAÇA DE FREITAS
Não sei porque quando as pessoas me dizem isso, eu digo você viu me todos os dias, mas eu não vi todos os dias. Eu não sei como é ver me.

00:25:31:21 – 00:25:32:21
JORGE CORREIA
Não ir ver.

00:25:32:23 – 00:25:52:24
GRAÇA DE FREITAS
Eu não. Mas alguma vez eu ia ver gravação. Eu chegava a casa e continuava a trabalhar e as poucas horas e não me estou a queixar. Foi assim se factual e as poucas horas que restavam era uma luta para conseguir ler duas páginas que esquecia completamente e não lembrava, não saía da mesma do mês. Mas ao.

00:25:53:01 – 00:25:54:13
JORGE CORREIA
Ler outra coisa que não seja.

00:25:54:15 – 00:26:10:07
GRAÇA DE FREITAS
Mas não saía da mesma zona do livro, não progredia porque eu esquecia me, já estava a dormir e consegui e consegui dormir. Eu tinha depois um padrão de colaboradores que era noctívago até às 02h00. Mandava mensagens, sms a dizer um artigo não sei onde, mas na China não sei o quê.

00:26:10:07 – 00:26:12:01
JORGE CORREIA
E às 07h00, quando acordava.

00:26:12:03 – 00:26:33:15
GRAÇA DE FREITAS
Às sete, onde não desligava, eu tinha dois telemóveis ligados pipipi e via pessoas caching que meia da manhã começava a ver notícias e a mandar e dizia já morreram mais não sei quantos. Vou fechar a fronteira, vamos fazer assim, vamos fazer assado. O vírus sobrevive nas superfícies, não sobrevive. Era uma avalanche. Já gera uma avalanche de informação e, portanto.

00:26:33:17 – 00:26:35:22
GRAÇA DE FREITAS
Era uma avalanche pronta, uma forma de dizer como.

00:26:35:22 – 00:26:46:06
JORGE CORREIA
É que se lida com isso, como é que se lida com isso pessoalmente? Ou o enésimo telefonema e não sei quem é quem, aquilo que falava, mas imagino que toda a gente que falava.

00:26:46:08 – 00:27:11:02
GRAÇA DE FREITAS
Chega se a uma altura que eu tinha um colaborador que dizia Senhora diretora, já estou, vai ou vai aí e pronto. E chega só uma altura é que é mesmo o vai o vai ou nós meses que íamos e os quilos, dizíamos ao senhor doutor a senhora Ministra da Saúde e o senhor primeiro ministro, porque nós não temos capacidade para fazer isto, ou se era para fazer, tínhamos que.

00:27:11:04 – 00:27:12:11
JORGE CORREIA
Não era uma opção segura.

00:27:12:13 – 00:27:39:22
GRAÇA DE FREITAS
De mim. Não foi uma opção. Eu tinha o meu lugar à disposição sempre. E, portanto, sabia também que no dia em que me deitava duríssimo, podia não ser a diretora geral, mas pensava enquanto eu tiver alguma fé em mim própria, alguma convicção em mim própria de que tenho alguma preparação, se calhar maior do que da maior parte das pessoas, de que estou a fazer um trabalho honesto e, tanto quanto possível, bem feito.

00:27:39:24 – 00:27:48:19
GRAÇA DE FREITAS
Eu vou ficar aqui. E foi essa convicção que se calhar me manteve, sendo que tinha sempre lugar à disposição.

00:27:48:19 – 00:27:51:24
JORGE CORREIA
E como é que eram nos dias das neuras, nos dias em que aquilo.

00:27:52:01 – 00:28:18:12
GRAÇA DE FREITAS
Para os dias das neuroses, das neuras eram difíceis? Eram os dias em que e além daqueles minutos, num dia em que todos os dias, a certa altura, eu pensava amanhã vou me embora e sai. Mas pronto, já passava que eu passava os dias das neuras, as neuras passavam e não havia nada que no dia seguinte acordasse, porque havia outra neura diferente.

00:28:18:16 – 00:28:28:07
GRAÇA DE FREITAS
As neuras eram sempre diferentes, a neura com que eu me deitava, os grandes problemas com que eu me deitava já não eram exatamente as Eu não estou a exagerar. Foi assim que eu senti.

00:28:28:09 – 00:28:29:12
JORGE CORREIA
Já havia um outro problemas.

00:28:29:13 – 00:28:36:00
GRAÇA DE FREITAS
Que eu, por exemplo, gostava de dizer isso. Eu não tinha a noção de das redes sociais, do que estavam a dizer ou fazer, não tinha.

00:28:36:01 – 00:28:36:17
JORGE CORREIA
De grande ruído.

00:28:36:19 – 00:28:55:06
GRAÇA DE FREITAS
E um dia cheguei ao Ministério da Saúde e depois à conferência de imprensa. Se eram nascido Dona Marta Diniz, a senhora ministra está ali naquele gabinete e quando a senhora ministra sair, vai entrar a senhora directora já eu esperei. Não era o hábito, isso não era o padrão. Eu acabava a conferência e habitualmente ia para a direção de dar as conferências.

00:28:55:06 – 00:29:24:01
GRAÇA DE FREITAS
Era o ministério. Esperei que saísse a senhora ministra, que vinha com uma cara enfim, agreste, agreste e preocupada. E eu entrei e vi os senhores. E ai eu falo muito e fiquei sem palavras porque foi bonito. A senhora vai passar a ter proteção policial? A polícia eu disse.

00:29:24:03 – 00:29:26:02
JORGE CORREIA
Porque via havia uma ameaça.

00:29:26:04 – 00:29:32:09
GRAÇA DE FREITAS
Pois deve ter havido e eu não tive capacidade sequer.

00:29:32:11 – 00:29:34:05
JORGE CORREIA
Não partilharam detalhes, não disseram.

00:29:34:05 – 00:30:03:06
GRAÇA DE FREITAS
Disseram me algumas coisas e eu não tive nem capacidade de perguntar, nem capacidade de entender. E, portanto, eu cheguei a casa e vagamente perguntei E isso vai acontecer? Quando é disseram me a partir de amanhã vai estar sempre uma pessoa à sua porta, disse ao pé da garagem. Disseram não à sua porta. A senhora não sai à porta sem estar a acompanhar e eu vou aqui partilhar com os portugueses, porque é rigorosamente verdade.

00:30:03:10 – 00:30:04:24
JORGE CORREIA
Portanto, passou a estar um polícia.

00:30:05:01 – 00:30:27:04
GRAÇA DE FREITAS
Com um sentido prático que eu tenho da vida. E eu que nunca me atrasei até sair de casa cheia do axé de meia da manhã para ir trabalhar. Mas pensei então e se o senhor ou senhora que me vier esperar? E se eu me atrasar? Eu vou pôr aqui uma cadeira no hall de entrada? E eu caí no ridículo de pôr uma cadeira no hall de entrada, uma das cadeiras de abrir e fechar encarnada para.

00:30:27:04 – 00:30:27:21
JORGE CORREIA
A pessoa descansar.

00:30:27:21 – 00:30:30:00
GRAÇA DE FREITAS
Ela descansar como se aquelas pessoas descansassem.

00:30:30:05 – 00:30:30:18
JORGE CORREIA
Claro que não.

00:30:30:18 – 00:30:49:11
GRAÇA DE FREITAS
É como se eu me atrasasse, nem atrasava, nem elas descansavam e a cadeira foi retirada do solo já depois de eu estar reformada, porque eu deixei lá ficar a cadeira onde ninguém nunca se sentou. Mas é para ter a ideia de como os dias foram complexos e eu hoje até penso que não aconteceu comigo.

00:30:49:13 – 00:30:50:03
JORGE CORREIA
E portanto.

00:30:50:08 – 00:30:52:20
GRAÇA DE FREITAS
Que aconteceu comigo ter proteção policial.

00:30:53:00 – 00:30:57:07
JORGE CORREIA
Portanto. E sentiu o risco sentido de alguma maneira uma ameaça.

00:30:57:07 – 00:31:03:21
GRAÇA DE FREITAS
O tempo que um dia eu tinha dois senhores e uma senhora que eles faziam, que viam tudo, que.

00:31:03:21 – 00:31:04:14
JORGE CORREIA
Revezavam, que.

00:31:04:14 – 00:31:15:09
GRAÇA DE FREITAS
Revezavam. E eu, um dia, das pouquíssimas vezes em que num fim de semana eu resolvi ir andar um bocadinho a pé e sair um bocadinho de casa para mexer as pernas para fazer algum exercício.

00:31:15:09 – 00:31:17:16
JORGE CORREIA
Ainda sozinha. Hoje não.

00:31:17:16 – 00:31:38:09
GRAÇA DE FREITAS
Já está já com as pessoas já claras, com os senhores da PSP que foram já agora extraordinários ao ponto de eu nem me lembrar que eles existiam. Eram discretos e eram discretos. E eu assimilei aquilo muito bem. Era uma coisa que eu pensava que não, mas eram bastante. E eu saí e combinei. De manhã fui vindo a cobrir se de imprensa.

00:31:38:10 – 00:32:02:24
GRAÇA DE FREITAS
Distrair se Não se importa. Eu hoje preciso de ir andar um bocadinho até aqui ao pé do rio. Preciso de ir andar sozinha, sozinha e a senhora não vai andar. Mas eu vou andar consigo. A senhora não anda sozinha. A senhora era já. E eu disse Então tá bem, Então venha comigo. E assim foi e fomos andar um bocadinho e é um transeunte, um pião, uma pessoa normalíssima da vida.

00:32:03:01 – 00:32:08:08
GRAÇA DE FREITAS
Faz. Não havia ninguém na rua. Foi naqueles dias pós confinamento de deserto em.

00:32:08:10 – 00:32:08:24
JORGE CORREIA
Que dizem que.

00:32:09:00 – 00:32:30:06
GRAÇA DE FREITAS
Conhecem um cidadão que provavelmente quereria dizer alguma coisa. Não sei. Sei que o senhor vem vagamente na minha direção, sem mais ninguém. E a senhora que me estava a acompanhar, a proteger ele abre os braços para o senhor parar. Bloqueou para bloquear, mas longe dele não bloqueou. Em cima do acontecimento o senhor ainda tinha uma distância que logo.

00:32:30:06 – 00:33:06:01
GRAÇA DE FREITAS
O problema é que eu nem sequer tinha. Não tinha consciência, não tive tempo para interiorizar tudo e obviamente a senhora estava armada e eu nesse momento disse Olhe, eu vou voltar para casa, porque enfim, apanhei um enormíssimo susto porque não tinha nem sequer pensado que obviamente aquelas pessoas estavam armadas. Não tinha pensado só quando vim e que queria ir para casa e não voltar a sair de casa, a não ser fui para a Direcção-Geral da Saúde trabalhar, fazer o movimento pendular casa direção Geral, Direção Geral, Ministério.

00:33:06:01 – 00:33:07:24
GRAÇA DE FREITAS
Ministério, Direção Geral, Direção Geral, Casa.

00:33:08:05 – 00:33:41:00
JORGE CORREIA
Os jornalistas têm outro tipo de armas. Fazem normalmente perguntas. Noutro tempo em que eu fazia de jornalista. Fomos juntos. Lá estava quando se começou a falar da pandemia e já OMS pensava em mim, na nossa preparação, numa célebre reunião de Copenhaga em que fomos os dois subdirectora geral da Saúde, na altura já na preparação e eu como como novelista da rádio pública e temos uma conversa sobre a relação entre fontes e jornalistas.

00:33:41:02 – 00:33:46:13
JORGE CORREIA
E eu fiz, fiz, fiz. Ao contrário do médico que que que cria pânico na sua.

00:33:46:13 – 00:33:52:04
GRAÇA DE FREITAS
Forma de ver, o Jorge contribuiu para a minha formação, que também me fez o.

00:33:52:06 – 00:33:53:07
JORGE CORREIA
Meu. Senão você não.

00:33:53:09 – 00:34:12:15
GRAÇA DE FREITAS
Dorme. Naquele dia nós fomos do mesmo avião porque estão, creio eu, também para vocês, jornalistas, mas pelo menos é de poupança de dinheiro, porque o dinheiro é para ser bem gasto. É mais barato nós irmos passar o fim de semana em Copenhaga para a reunião de segunda feira do que depois de voarmos num dia de semana.

00:34:12:15 – 00:34:14:02
JORGE CORREIA
Bendita bendita poupança!

00:34:14:02 – 00:34:37:09
GRAÇA DE FREITAS
Fomos de facto para Copenhaga e Copenhaga. Não é assim uma cidade muito grande e tem aqueles que, pelo menos na altura, os bares das docas, onde as pessoas acabam todas por se encontrar a beber umas cervejas, sobretudo o trabalho só começar dois dias depois e já ficou noutro sítio do avião. E saiu o primeiro dia. E quando eu saí você estava à minha espera.

00:34:37:09 – 00:34:47:22
GRAÇA DE FREITAS
Na saída da porta da manga da porta da manha e disse com ar muito sério Doutora Graça, comigo não faz.

00:34:47:24 – 00:34:49:01
JORGE CORREIA
O que está dito, está dito.

00:34:49:01 – 00:34:50:05
GRAÇA DE FREITAS
O que está dito, está dito.

00:34:50:11 – 00:34:51:24
JORGE CORREIA
O que é diferente é ser bom.

00:34:52:01 – 00:35:06:24
GRAÇA DE FREITAS
Tal e qual. Se. Eu fui para o hotel e pensei eu não bebo cerveja este fim de semana porque eu tenho de estar completamente atenta para não dizer rigorosamente nada que não se possa ouvir. Diria umas horas.

00:35:07:04 – 00:35:07:11
JORGE CORREIA
Fora.

00:35:07:11 – 00:35:20:23
GRAÇA DE FREITAS
Daqui, fora daqui e portanto. Mas foi uma grande lição. Foi mesmo uma grande lição de vida, de contenção, de cuidado, de respeito e, portanto, e isso fez parte do tal aprendizado em como que eu chega a pandemia.

00:35:21:03 – 00:35:33:22
JORGE CORREIA
Como é que se faz isso? Depois, numa sequência de dias em que se está sempre numa conferência de imprensa, sempre a responder a perguntas, sempre com essa torrente de notícias que estão a aparecer aí.

00:35:33:22 – 00:35:55:24
GRAÇA DE FREITAS
As fronteiras não são nítidas entre o off e o one, o que é e o que não é para dizer. Depois há ali uma zona em que não há fronteiras nítidas. Quer dizer, eu não conseguia e ainda hoje, quando olho para trás e me lembro de alguns episódios das conferências, não conseguia fazer aquilo em estado puro, bem feito, como ensinou os livros para mim.

00:35:55:24 – 00:36:01:09
GRAÇA DE FREITAS
Ensinou a experiência como me ensinou o Jorge ou como me ensinava a Ariana Mendes, que era a minha.

00:36:01:11 – 00:36:03:22
JORGE CORREIA
Era sempre ela sempre fazer e sempre andar para a frente.

00:36:03:22 – 00:36:15:03
GRAÇA DE FREITAS
Era sempre a aprender. A sensação era exactamente isso. Quando estávamos naqueles tapete rolante a fazer as provas de força nos não para a menos que deu um grito e dizer para mim isto.

00:36:15:03 – 00:36:15:14
JORGE CORREIA
Ou vai ou.

00:36:15:14 – 00:36:22:09
GRAÇA DE FREITAS
Vai, vai, vai. Era um dos lemas que foi sempre o lado da minha Direcção Geral da Saúde. Ou vai ou vai.

00:36:22:11 – 00:36:43:19
JORGE CORREIA
Eu tenho um episódio muito curioso quando, quando todos nós estávamos a perguntar como é que raio este vírus pega tudo, se nós nas superfícies ou não, aquele cuidado que nós tínhamos nas garrafas de água, o que é que cada um bebia? Cada um tinha a sua garrafa de água e a uma imagem de uma conferência de imprensa Antes de começar, que é Dra.

00:36:43:19 – 00:36:47:15
JORGE CORREIA
Graça de Freitas, com um lenço de papel a abrir uma garrafa em Vilarinho.

00:36:47:15 – 00:36:48:10
GRAÇA DE FREITAS
Deprimente.

00:36:48:10 – 00:36:50:00
JORGE CORREIA
E eu pensei Sim, meu Deus.

00:36:50:02 – 00:36:51:00
GRAÇA DE FREITAS
Um tesourinho triste.

00:36:51:02 – 00:36:53:10
JORGE CORREIA
Pega se assim com essa facilidade.

00:36:53:12 – 00:37:21:17
GRAÇA DE FREITAS
Eu também digo eu disse mesmo. Eu tive os meus tesourinhos deprimentes e esse foi um deles. E vou lhe dizer porquê? Porque eu em determinada altura também tive os meus medos e eu em determinada altura também percebi que havia muita incerteza, sobretudo a questão das superfícies e vou partilhar consigo. Eu estava em fases de pleno medo e nós tínhamos água posta na mesa da da conferência de imprensa.

00:37:21:17 – 00:37:23:03
GRAÇA DE FREITAS
Tínhamos uma garrafa.

00:37:23:05 – 00:37:23:13
JORGE CORREIA
Cada um na.

00:37:23:13 – 00:37:42:11
GRAÇA DE FREITAS
Sua cama e tinha me dito garantido. Um dia tinha perguntado qualquer coisa, mas na altura havia mesmo ideias que nos deixavam. Eu lembro. O meu irmão deixava as compras à porta de casa da minha mãe dentro do saco e pois os sacos ficavam em quarentena e depois vinha toda aquela coisa de incerteza. Houve também essa fase das nossas vidas e eu também sou uma cidadã e uma pessoa.

00:37:42:11 – 00:38:04:02
GRAÇA DE FREITAS
E que tinha na altura também tive os meus medos de subir. Sobrevivia muito tempo na superfície e tinham me dito eu tinha perguntado inicialmente e tinham me dito não pode ter a vontade, as garrafas e os copos e está tudo sempre desinfectado e por aquelas coisas estranhas que acontecem naqueles milésimos de segundo, vamos começar a compreender alguém que eu não sei quem foi, Nem sei.

00:38:04:02 – 00:38:23:20
GRAÇA DE FREITAS
Na verdade, eles não eram eles. Mas olhe que as garrafas não estão desinfetada e estupidamente eu tenho aquele reflexo. Então como é que eu vou pegar numa coisa que não está desinfetada e que estas horas está cheia de vírus? Então eu aí portei me mesmo como uma pessoa normal, com os meus medos, com os meus fantasmas e pronto, tive o meu tesourinho deprimente.

00:38:23:22 – 00:38:42:24
GRAÇA DE FREITAS
Depois tive quase a ter um chorinho deprimente. E eu vou contar a primeira vez que eu consegui pensar que conseguiria ter um dia ou dois para ir ao Alentejo. Isso, o meu marido e olhe, vamos, vamos lá para o hotel pequenino onde costumamos ficar e eu arrumo o quarto e faço as camas e o meu marido está para aí.

00:38:42:24 – 00:38:54:10
GRAÇA DE FREITAS
Ficamos em casa. Porque eu não queria que alguém viesse a mexer nos coisas. Foi aquilo. Durou pouco tempo. Essa nossa fase durou pouco tempo, mas o certo é que existiu.

00:38:54:10 – 00:39:28:02
JORGE CORREIA
E a ligação entre a comunicação e o medo é muito claramente sentida quando quando nós não temos essa segurança ou quando alguém com autoridade, neste caso da Directora geral da Saúde, não é completamente assertiva a dizer um sim ou não. Nós, pelo sim pelo não, vamos lá esperar um bocadinho. Então estou a pensar, por exemplo, recentemente, recentemente, já um par de anos, quando quando houve esta crise importante da legionella nos arredores de Lisboa e quando não se sabia ainda qual era a origem de de ouvir políticos locais de dirá e o suspeito que se calhar é da água que bebemos.

00:39:28:02 – 00:39:30:10
JORGE CORREIA
Ou é isto ou aquilo e esse efeito.

00:39:30:12 – 00:40:03:05
GRAÇA DE FREITAS
Mas aí foi a ver e era uma coisa para nós, os profissionais, completamente controlada, porque nós sabemos tudo o que é possível saber sobre as janelas e desde o início, surto em Vila Franca desde as primeiras horas, duas ou 3/1 horas que todos sabíamos como é que tinha sido propagado. E vou dizer porquê? Porque o meu colega que fez os inquéritos epidemiológicos foi brilhante e percebeu que uma senhora que estava acamada num terceiro andar, que a única coisa que fazia era respirar o ar que lhe entrava pela janela e tinha contraído legionella.

00:40:03:07 – 00:40:22:09
GRAÇA DE FREITAS
E portanto aquilo era uma coisa, como se veio a confirmar mais tarde no ar, pelo o ar que saiu por uma toda reconhecimento. É que a nível do terceiro andar que são conhecidos os terceiros andares por estarem expostos a estes fenómenos, enfim, inalou as gotículas para entre nós e os graus de incerteza. Eram poucos os graus de liberdade e os graus de incerteza.

00:40:22:09 – 00:40:33:24
GRAÇA DE FREITAS
Aqui, os graus de incerteza numa doença conhecida sabe todo o padrão de comportamento que sabe são completamente diferentes, independentemente do que a população pensa. Estou a falar do ponto de vista profissional.

00:40:33:24 – 00:40:53:13
JORGE CORREIA
E como é que uma cientista, Graça Freitas, uma cientista, lida com o facto de a opinião mais relevante de um cientista que estudou um tema e tem toda a informação vale tanto, ou se calhar menos do que o Zé dos Bitaites, que acabou de escrever uma barbaridade no seu Facebook ou no seu Twitter.

00:40:53:15 – 00:41:18:18
GRAÇA DE FREITAS
Essa foi uma das grandes descobertas. Isto de facções da pandemia foi mesmo porque nós estávamos habituados. E quando digo nós, sou eu e os meus antecessores, quer a nível do directores gerais, subdirectores, mas também técnicos e activistas, todos nós estamos habituados a de facto tínhamos um conhecimento e uma autoridade, uma narrativa e uma autoridade. Exatamente. Era por esta ordem.

00:41:18:23 – 00:41:51:04
GRAÇA DE FREITAS
Conhecíamos as coisas, tínhamos uma narrativa e tínhamos uma autoridade. E era assim e a vir haveria outras pessoas que o saberiam. Mas isto era equilibrado. Era um ambiente de certa forma controlado e protegido. E depois nada. Foi assim, nada foi assim. Essa foi calhar. Isso foi à medida que foi percebendo o grande choque, habituara 40 anos quase de profissão, exatamente a isso.

00:41:51:06 – 00:42:06:22
GRAÇA DE FREITAS
E depois, de repente, qualquer pessoa, em qualquer latitude de como qualquer conhecimento, dizia qualquer coisa. E isso tinha mais ou menos o mesmo valor. Isso sim é um grande e um grande desconforto e um grande desassossego.

00:42:06:22 – 00:42:34:24
JORGE CORREIA
E eu tenho uma grande curiosidade que é saber no comité dos peritos, lá está, daqueles que sabem, que lêem, que pensam e pegam se uns com os outros, são teimosos quando defendem uma tese ou outras. Como é que imagino que é a função de Director geral da Saúde, Director geral da Saúde? É um bocadinho tentar o mínimo denominador comum, tentar mitigar, aliás, as birras dos cientistas.

00:42:35:01 – 00:42:50:03
GRAÇA DE FREITAS
Há alguma teimosia, mas há sobretudo argumentação e argumentação científica. E uma das coisas que acho que fiz bem é que eu identifiquei quem eram aqueles em que eu confiava acima de tudo.

00:42:50:04 – 00:42:53:14
JORGE CORREIA
Então, que características têm esses aí?

00:42:53:16 – 00:43:24:14
GRAÇA DE FREITAS
Primeira coisa por acaso tinham isto em comum? Que lhe vou dizer? Eram pessoas relativamente novas. Eram pessoas que dominavam as fontes de informação, as digitais e as analógicas. E todas têm uma capacidade de captar informação. Eram capazes de filtrar essas fontes. Tinham um respeito profundo pela ciência profunda, por tudo o que era evidência científica. Os estudos que iam saindo não quer dizer que não lessem outro tipo de literatura, as redes sociais.

00:43:24:14 – 00:44:00:00
GRAÇA DE FREITAS
Fosse preciso, mas eram pessoas altamente fiáveis do ponto de vista da procura do conhecimento, da forma como obtinham e da forma como me transmitiu e a partir dessa fase, já numa fase mais calma ainda durante o ano 2020, a minha vida sofreu um grande salto qualitativo, porque eu, de facto rodeei me de pessoas e que tem que mencionar uma está agora na Web MS, nos escritórios da Organização Mundial da Saúde em Atenas, e o Valter Fonseca e o Valter Fonseca era a pessoa do ponto de vista científico e técnico em que eu mais confiava.

00:44:00:00 – 00:44:02:07
GRAÇA DE FREITAS
E tive outros. Tive o Diogo Cruz que muita gente.

00:44:02:07 – 00:44:13:21
JORGE CORREIA
Portanto, era um mastiga dois da ciência que conseguiu encontrar nas fontes, conseguiam fazer uma transição. O que que é importante, o que é que não é importante? É criar, no fundo, a papinha toda feita para uma base numa decisão.

00:44:13:23 – 00:44:21:24
GRAÇA DE FREITAS
Mais ou menos a papinha toda feita, porque aí entrava, nem eu era uma receptora passiva, nem eles eram passivos.

00:44:21:24 – 00:44:23:08
JORGE CORREIA
Entrei alguns.

00:44:23:10 – 00:44:24:13
GRAÇA DE FREITAS
Fazíamos umas perguntas.

00:44:24:13 – 00:44:25:23
JORGE CORREIA
Era uma pergunta difícil.

00:44:26:00 – 00:44:56:03
GRAÇA DE FREITAS
Não, eu acho que não era difícil, sobretudo porque as pessoas a quem eu perguntava eram muito sabedoras e eu nunca fiz nenhuma pergunta que não fosse difícil. O que eles faziam, e eu acho que foi muito bom, foi ter um princípio de extrema cautela, ou seja, quando me transmitiam com algum grau de assertividade uma informação, estavam certos que a probabilidade, aquela informação ser correta do ponto de vista técnico e científico.

00:44:56:03 – 00:44:56:09
JORGE CORREIA
Estavam.

00:44:56:09 – 00:45:21:14
GRAÇA DE FREITAS
Escorados, estavam bastante escorados, eram muito cuidadosos. Vou dizer, eram todos mais novos que eu e eu ficava até nervosa com o que eu achava que era quase um excesso de cuidado. Mas não era. Porque rapidamente também se percebe, depois de passar aquela fase inicial, que há um fator muito importante, que é a segurança de todas as ações futuras medicamentosas e estão ecológicas, desde as vacinas.

00:45:21:16 – 00:45:35:13
GRAÇA DE FREITAS
E, portanto, eu, depois de outra lição aprendida, se algum dia tivesse hipóteses de andar para trás, era criar logo um conselho de pessoas muito sapientes, com muito bom senso, muita capacidade de procurar informação boa.

00:45:35:17 – 00:45:56:06
JORGE CORREIA
Bom, do outro lado, dum lado estão os cientistas. Deste lado estamos nós aqui, espectadores, pessoas, cidadãos que não dominamos o que está a acontecer, mas temos perguntas para fazer. De um lado estão os cientistas e do outro lado estão os políticos. E os políticos têm duas críticas principais. A primeira tem a responsabilidade fundamental de tomar as grandes decisões.

00:45:56:08 – 00:46:11:02
JORGE CORREIA
Tem uma intuição muito forte, mas nem sempre são muito científicos. Como é que foi essa tensão, essa, esse entre entre a necessidade dos políticos tomarem decisões e fazerem perguntas? E os cientistas?

00:46:11:04 – 00:46:31:13
GRAÇA DE FREITAS
Olhe, se você se lembrar, até a dita para Não se falava em linhas vermelhas. Havia um fio muito interessante americano sobre quão ténue é uma linha vermelha, mas não se falavam. Começou se a falar do ponto de vista epidemiológico e é tudo verdade. Quem toma as últimas decisões são os políticos. Quem vai ser eleito ou não eleito são os políticos.

00:46:31:15 – 00:46:40:14
GRAÇA DE FREITAS
Quem tem outras metodologias para avaliar riscos e impactos desses riscos. Impactos sociais Os impactos económicos não são só impactes. Não são os políticos.

00:46:40:16 – 00:46:50:07
JORGE CORREIA
Vai muito para além daquilo que é a epidemiologia, que aqui é um vírus que é diferente a economia. O que é que acontece na nossa vida? A nossa perceção é, no fundo, em que é que vamos votar ou não vamos votar.

00:46:50:08 – 00:47:15:10
GRAÇA DE FREITAS
Evidente e, em última análise, são os grandes decisores. Então estão legitimados democraticamente para serem os grandes decisores. Qual é o nosso papel? No outro dia, eu diria uma coisa engraçada que é que cada aranha na sua teia, cada aranha, tece a sua teia e cada uma deve ficar lá por ela e depois encontrar o que é que havia.

00:47:15:12 – 00:47:29:21
GRAÇA DE FREITAS
Havia uma grande preocupação em descodificar e passar a informação correta, tanto quanto possível e assertiva e clara. Quem ia tomar a decisão que eram os os os políticos?

00:47:30:00 – 00:47:33:09
JORGE CORREIA
E quando o político perguntava então é prognóstico?

00:47:33:11 – 00:48:02:17
GRAÇA DE FREITAS
Ora bem, então havia duas coisas. Havia uma, que eram as célebres linhas vermelhas que nós, digo nós são todos técnicos, médicos e não só médicos, epidemiologistas, farmacêuticos, enfermeiros, linha e que era inocente, não se sendo nós não fazíamos cedências, pedíamos que se todos demitidos numa noite, se houvesse um braço de ferro que não houve, felizmente. Mas nós não seguíamos na segurança das vacinas.

00:48:02:19 – 00:48:03:24
JORGE CORREIA
Estava lá. Era uma linha.

00:48:04:02 – 00:48:28:13
GRAÇA DE FREITAS
Era uma linha vermelha. E se há uma dúvida razoável, nós seguiremos. É uma linha vermelha que nos sentamos e daqui não passamos para onde havia de facto, essas linhas vermelhas? Em relação aos prognósticos, jogava se muito com as probabilidades, porque é isso que a ciência nos diz. A probabilidade e esta probabilidade é aquela. Em França foi assim, na Alemanha foi doutra forma.

00:48:28:15 – 00:48:46:02
GRAÇA DE FREITAS
Nos países onde já fizeram isto ou aquilo, começou se a trabalhar muito por analogia com os outros países. Portanto, aí foi muito importante o trabalho da academia, da retaguarda. Todas essas pessoas começaram a ter tempo para ver o que se passava noutros países e para digerirem essa informação comparativa.

00:48:46:07 – 00:48:49:20
JORGE CORREIA
E aprender com aprender com os erros e aprender com as coisas que foram feitas.

00:48:49:24 – 00:49:14:01
GRAÇA DE FREITAS
Porque a pandemia não estava no mesmo, na mesma fase, em todo o lado. Portanto, havia sítios onde aquilo estava aspire sítios estabelecidos. O tiro já estava na nova variante, Outros estavam na variante antiga. Portanto, se houvesse capacidade de varrer o mundo, isto ao fim de cinco, seis meses. Bem, não foi lá o início. Se houvesse essa varredura do mapa, nós conseguimos aprender com os erros e as virtudes de cada um.

00:49:14:03 – 00:49:32:06
GRAÇA DE FREITAS
Também é mais fácil dizê lo agora do que na altura, porque a mesma história e informação era demasiado, nem sempre. Das fontes também mais credíveis. Os países, nem todos também, ou quase nenhum, para dizer a verdade, tinha capacidade para estar a fazer e ao mesmo tempo publicar e informar os outros e disponibilizar.

00:49:32:09 – 00:49:33:03
JORGE CORREIA
Mas iam falando a.

00:49:33:03 – 00:49:41:12
GRAÇA DE FREITAS
Verdade, íamos falando Fartava nos de falar isso, as videoconferências e essas coisas todas. Foi um avanço.

00:49:41:14 – 00:49:48:07
JORGE CORREIA
Eu tenho uma curiosidade a propósito dessas decisões. E os prognósticos, quem é que tomou a decisão final de fechar as escolas?

00:49:48:09 – 00:49:59:10
GRAÇA DE FREITAS
Foi tudo muito rápido, muito rápido. Olhe, essa foi dos momentos mais rápidos que eu num domingo, estava eu em casa de uma colega que já tinha andado. Já agora.

00:49:59:10 – 00:50:01:02
JORGE CORREIA
Há escolas, empresas, escolas.

00:50:01:04 – 00:50:27:13
GRAÇA DE FREITAS
Escolas. Estava eu em casa de uma colega, médica, médica de saúde pública e, apesar de ter mais experiência de vida e ser mais velha que eu, tinha sido minha interna, tinha feito outras coisas na vida a acompanhar a evolução da região Norte a nível da população escolar e dos clubes nas escolas, a acompanhar a cientista com toda a calma, com os dados para a informação, juntávamos outros ao grupo da videoconferência.

00:50:27:13 – 00:50:54:06
GRAÇA DE FREITAS
Perguntávamos um parecer de um que sabia muito de uma coisa de outro doutor. Estávamos assim quando a senhora ministra Marta Temido, me disse que tínhamos que ir para o ministério fazer uma conferência para dizer o que é que fazíamos às escolas. E só me lembro bem disto porque eu estava vestida a domingo em casa de uma colega e portanto fiz aquilo que acabei por fazer umas semanas todas seguida para mim foi pegar no lenço, porque não?

00:50:54:06 – 00:51:13:23
GRAÇA DE FREITAS
Claro que não eram eles e pedir umas coisas assim e pus sobre uma roupa de domingo e fomos as duas. E curiosamente a ministra deve ter feito a mesma coisa porque não estava a mentir para mim. E depois em poucas horas todas aquelas decisões se atropelaram e a última acaba por ser sempre uma decisão política baseada nas coisas técnicas.

00:51:14:00 – 00:51:44:07
GRAÇA DE FREITAS
Há aqui uma coisa que é bom e é bom que assim seja, porque, de facto, há uma responsabilidade e um poder político que, baseado nas opiniões dos técnicos que temos a obrigação, o dever, lealdade e a obrigação de dar a melhor informação possível às últimas decisões serão sempre dos políticos. É evidente que às vezes os políticos podem quase delegar em nós que ninguém elegeu aí nesse assunto de vida, porque nós não conseguimos sair deste impasse.

00:51:44:07 – 00:52:04:06
GRAÇA DE FREITAS
O que é que você acha que deve fazer? Mas mesmo assim, e eu acho que que é certo é que é bem, porque, volto a dizer, foram eleitos e têm mais responsabilidades que os técnicos não têm. Os técnicos têm uma obrigação diferente da obrigação dos políticos e uma delas é ser leal aos políticos com quem se trabalha. E outra dar lhes a melhor informação possível.

00:52:04:08 – 00:52:08:16
GRAÇA DE FREITAS
A terceira ter lugar à disposição e quarta sair, se for caso disso.

00:52:08:18 – 00:52:18:15
JORGE CORREIA
Houve algum momento em que em que a demissão foi considerada não como uma fantasia, mas como uma decisão tomada?

00:52:18:17 – 00:52:46:23
GRAÇA DE FREITAS
Eu acho que houve aqueles pequenos momentos que eu lhe estava a dizer há pouco. Houve vários dias e foi mais talvez no início e era por por por ondas, olhar. E como eu me era por ondas. Havia uma altura em que estava tudo aparentemente calmo, pois precipitavam se acontecimentos. Eu por vezes digo lhe sou sincera, metia a cabeça na almofada e pensava Olha aí, amanhã de pronto o diga a ministra que arranje outro.

00:52:46:24 – 00:53:09:03
GRAÇA DE FREITAS
Ela diz mim qualquer coisa, mas depois, no dia seguinte era outro dia. Fui. Não, não, não lhe consigo identificar, nem para mim própria, que gostava de ter uma, uma linha, uma timeline mais objetiva de toda esta amálgama. Eu gostava de ter ali tudo certinho, dia um, dia dois, dia três e se eu quisesse eu teria feito uma coisa.

00:53:09:05 – 00:53:21:10
GRAÇA DE FREITAS
É verdade. A Direção-Geral da Saúde tem uma Unidade de Emergências em Saúde Pública há muitos anos, desde o tempo do Zacarias. Tem timeline da Premier, já deu dinheiro, funcionários técnicos, está.

00:53:21:10 – 00:53:22:09
JORGE CORREIA
Lá, está desenhado que.

00:53:22:09 – 00:53:39:24
GRAÇA DE FREITAS
Deviam todos os dias o que se passava e eu é que nunca tive. Enfim, é vontade de ir visitar. Esta também me visita e da Legionella sempre para aprender para a próxima crise das duas janelas me mas não visitei a pandemia de saber que vamos fechar.

00:53:39:24 – 00:54:10:24
JORGE CORREIA
Mas eu quero saber como é que Graça de Freitas reage a duas coisas. A primeira é aos familiares que, ao longo desta crise, telefonaram ou disseram olha que isto se calhar não é assim. Portanto, crítica directa daqueles de quem mais gostamos e, por outro lado, aos inúmeros memes ou piadas na internet que se fizeram à volta da persona da Graça de Freitas, não da pessoa, mas daquela pessoa que teve aquela exposição mediática tão grande.

00:54:11:01 – 00:54:38:03
GRAÇA DE FREITAS
Então os meus familiares tiveram muito pouca intervenção, os meus familiares mantiveram se presentes para o que desse e viesse, mas manifestaram a sua opinião a posteriori. Eu só soube verdadeiramente o que eles pensaram e algumas vezes não pensaram muito bem depois. Portanto, houve muito pouca interferência dos meus familiares. E quando digo, tento de volta milhares de diretos, nomeadamente do meu irmão.

00:54:38:05 – 00:54:54:08
GRAÇA DE FREITAS
Convivo com o meu marido, portanto foram duas pessoas que quando contribuíram contribuíram pelos próprios serem portadores de informação ou científica ou jornalística ou má notícia, ao dizer me olha que estás a apanhar da esquerda, ou da direita, ou da frente, ao.

00:54:54:10 – 00:54:55:12
JORGE CORREIA
Garantir.

00:54:55:14 – 00:54:55:16
GRAÇA DE FREITAS
Que.

00:54:55:16 – 00:54:58:15
JORGE CORREIA
Descansava e que estava alimentada e que voltava para a missão.

00:54:58:17 – 00:55:22:12
GRAÇA DE FREITAS
Basicamente era isto. É exactamente isso. Meu marido tornou se um perito em compras extraordinário compras de supermercado domina até hoje tudo e, portanto, foi fácil. A segunda questão que mesmo pessoas nas piadas, as piadas, eu achava piada e eu achava piada as piadas. Apesar de tudo, eu só não achei piada a uma coisa e digo lhe que não achei mesmo e continuo a não achar e acho que nunca vou achar.

00:55:22:14 – 00:55:46:10
GRAÇA DE FREITAS
Eu tolerei melhor mesmo as pessoas que disseram muito mal de mim o façam em função do que aquelas que me conhecendo não vieram. Um guia dizer Epá, calma que ela não é assim tão má. Houve ali uns meses em que eu senti essa necessidade. Pensei mas não há aqui uma alma que ache que eu não estou a fazer tudo mal?

00:55:46:14 – 00:56:12:15
GRAÇA DE FREITAS
Porque houve uma altura em que eu percebi que as pessoas estavam todas ali, que eu estava a fazer tudo mal. E eu pensei mas não há aqui uma alminha que venha dizer o contrário? E quando finalmente essas alminhas surgiram, não imaginas o sentimento de gratidão eterna que eu terei para com essas pessoas, porque elas de alguma forma contrariaram aquela onda incrível, negativa, com razão e sem razão.

00:56:12:15 – 00:56:32:11
GRAÇA DE FREITAS
Algumas vezes eu não estou a dizer que fiz tudo certo, nunca lhe direi nem que faria tudo da mesma maneira. Também nunca direi, mas senti mais a falta de alguém que dissesse bem, calma que não é assim tão má do que escreveu, é mesmo mais péssima isso. Certa forma estava a fazer o papel deles e custou me muito.

00:56:32:13 – 00:56:33:17
GRAÇA DE FREITAS
Isso Custou me.

00:56:33:19 – 00:56:51:04
JORGE CORREIA
Reservo a última pergunta para. Saber ou para pensar se alguém se sente mais útil quando ocupou o cargo de director geral da Saúde, tendo que lutar contra uma pandemia ou nos primeiros meses, como médica na periferia, no Alentejo, no início da carreira.

00:56:51:06 – 00:57:13:23
GRAÇA DE FREITAS
É tudo tão diferente, porque há aqui um fator que não se pode comparar é o fator idade. Eu quando fui para o Alentejo ainda acreditava que podia salvar o mundo, que podia fazer a diferença, a mudança e que o facto de estar ali a fazer consultas de planeamento familiar. As senhoras de Ponte de Sor e eu fazer uma revolução sexual planetária.

00:57:13:23 – 00:57:42:12
GRAÇA DE FREITAS
Quer dizer, é totalmente diferente porque é diferente o tempo e o sítio, a minha idade e sobretudo isso também a idade das grandes crianças. Mas há uma coisa que eu sei em relação àquela população lá de Ponte de Sôr é que eu fiz consultas sobre materna de planeamento familiar e de pediatria aos filhos. Eu sei que fiz bem as pessoas que me ouviram durante a família eu não sei.

00:57:42:14 – 00:57:46:15
GRAÇA DE FREITAS
Portanto, em calhando, fui mais útil nos meses de pode ser.

00:57:46:21 – 00:58:13:19
JORGE CORREIA
Mudar o mundo ou simplesmente servir os seus concidadãos. Até nesta dicotomia está um dilema de comunicação sobrevivemos ou fazemos a revolução? A pandemia recordou nos a todos uma dupla verdade não controlamos nada e dependemos muito dos outros para responder aos problemas difíceis. E aqui a comunicação pode dar uma boa ajuda, apaziguando os medos e oferecendo uma perspetiva de caminho até para a semana.

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