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Bailarina Mai-Júli Machado volta a homenagear “força da mulher”

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“Amelle” é o segundo projecto a solo da bailarina e coreógrafa moçambicana Mai-Júli Machado que invoca as suas memórias de passagem de menina a mulher e denuncia as restrições impostas às bailarinas cujos corpos não cabem em normas. A peça foi apresentada, este sábado, na 3ª edição do evento “1 Km de Danse”, na região de Paris e volta a falar da “força da mulher” e da necessidade de as artistas se expressarem “sem medo” e de quebrarem silêncios em palco.

Cerca de um mês depois de ter apresentado “Sinais Particulares” em Paris e quase um ano depois de se ter estreado em França na peça “Black Lights” de Mathilde Monnier, a bailarina e coreógrafa Mai-Júli Machado foi convidada pelo Centre National de la Danse para mostrar um novo projecto durante o festival "1 Km de Danse”, em Pantin. Foi neste sábado que a moçambicana levou a um jardim público a peça "Amelle" que fala sobre a “força da mulher” e a necessidade de se quebrarem silêncios em palco.

RFI: Como é que nos poderia descrever o espectáculo Amelle?

Mai-Júli Machado, Coreógrafa e bailarina: O espectáculo "Amelle" fala sobre a mulher – eu gosto muito de falar sobre as mulheres - e eu convido as mulheres a despertarem a "Amelle" que existe dentro delas.

O que é a Amelle?

"Amelle" [A.M.E.L.L.E] quer dizer Atitude, Maturidade, Elegância, Legado, Liberdade e Esperança. São seis palavras-chave em que eu me inspiro para convidar todas as mulheres a despertarem a Amelle que existe dentro delas.

Essas palavras são muito fortes e o espectáculo é também um manifesto pela liberdade, como têm sido até agora os espectáculos em que tem participado, sobretudo pela liberdade das mulheres. Neste espectáculo, você diz “porque não?” e repete a palavra “Não” constantemente. O que quer dizer este "Não"?

Este é o meu segundo projecto e eu sempre busco coisas ou experiências que aconteceram comigo. Realmente isto também me aconteceu…

É o seu segundo projecto em nome próprio, mas estreou-se em França num espectáculo de Mathilde Monnier, que esteve no Festival de Avignon e que já falava sobre a violência feita às mulheres…

Sim, talvez por ter sido a primeira peça em que eu participei, motivou-me sempre a falar da mulher. Não é que eu seja feminista, mas sinto-me inspirada. Eu começo o espectáculo a dizer que há uma pequena história no meu país, Moçambique, onde quando estás na fase da adolescência, quando estás a sair dos 11 para os 12 anos, começam a sair os peitos. Tem um mito que diz que a nossa irmã mais velha tem que nos varrer, com uma vassoura de palha mesmo, “varrer o peito”, que é para o peito não crescer. Eu fiz isso, por exemplo. Eu era bailarina e tinha esse complexo de ter que saltar e os meus peitos sempre a mexerem e olhava para o lado e a minha colega com os peitos pequenos estava à vontade.

Eu afirmo “porque não?”, ou seja, porque é que eu, com os meus peitos, não posso dançar à vontade e não posso saltar? Também a mulher africana que dizem que tem um corpo um bocadinho avantajado, que tem uns peitos maiores, a bunda também, quando salta, ela sempre tem os peitos a abanar. Então é por isso que eu digo “porque não?”. Porque é que não pode? Por que é que não pode ser normal dançar ballet, por exemplo, e os peitos também saltarem. É um jogo de pesquisa sobre porque é que não pode ser.

Porque é que a mulher não tem mais liberdade e porque é que a bailarina não pode dançar, seja que corpo tiver?

Exactamente, e sem nenhum complexo também. O projecto Amelle parte daí e ainda é um projecto que está a começar.

Como é que começou o projecto? Foi um convite para vir a este festival, “1 Km de Danse”, do Centro Nacional de Dança de Pantin, que levou ao nascimento do projecto ou já vinha de antes?

Este projecto começou no Senegal. Eu fiz uma formação na École des Sables, era um grupo de dez africanos e disseram-nos para cada um fazer qualquer coisa. As minhas peças sempre começam assim mesmo, alguém que diz “faz qualquer coisa”. Coloquei lá uma música de ópera e porquê ópera? Não sei. Tenho um amor pela música clássica e gosto também porque é um material diferente, para mim, sendo africana, que aprendi a fazer as danças tradicionais, de repente, estou a colocar uma ópera naquilo que é a minha técnica que não é clássica. Depois do Senegal, nunca mais fiz, mas as pessoas diziam para continuar. Então eu disse porque não buscar aquela ideia? E parece que foi interessante, as pessoas estavam mesmo concentradas, acho que foi uma boa experiência e motivação para eu realmente pensar em continuar.

Porquê ópera? Qual é a energia que essa música lhe traz e que a leva a querer dançar com ela?

A questão da música nos meus projectos é sempre um lugar muito sensível porque eu sempre penso que para criar um projecto tem que ter uma ligação. Se formos a ver, a letra não tem nada a ver com o que eu estou a falar, mas encanta-me muito. Tenho uma paixão imensa pela música clássica e não só. Também me desafia porque eu estou habituada a fazer movimentos sempre muito rápidos, muito batidos no chão, dança tradicional, e é uma música muito calma que me desafia a chegar a um material muito sensível que é esta coragem e força do “porque não”, mas também é a sensibilidade da mulher e não só.

A pergunta “Porque não?” surge antes de passarmos para uma música dos Madredeus. Porquê esta música?

Exactamente. Eu já tinha dito que há o enigma das músicas, também por ser um projecto que ainda está em andamento, ainda não tive nenhuma residência, pensei em casa e decidi fazer, ou seja, ainda não é definitivo. Mas porquê Madredeus? Porque descobri que amo muito o fado e escuto muitas músicas dos Madredeus. E encantou-me o material, a música. Ainda é um enigma, mas motiva-me… E tudo que fui fazendo ali, foi mesmo um improviso. Claro que eu tenho uma ideia, tenho uma motivação, mas depois o que acontece é mesmo ali. Se me forem dizer para repetir, não vou repetir exactamente como foi. É muito improviso. Por isso é que eu gosto muito de uma música que me motive, que me dê o impulso para poder criar ali.

E qual é a linha de força desse improviso?

A linha de força são as memórias da infância e também o público ajuda muito. Eu estava com muito receio, no início, porque cheguei e vi que era um jardim e que era um público com crianças, jovens, adultos. Quando comecei, estava meio com receio. Comecei como uma música moçambicana e percebi que assim que comecei a cantar as pessoas estavam mesmo em silêncio. As crianças olhavam. Então, para além de ser a música que me dá esse impulso, as pessoas também ao meu redor, a energia, a atenção que elas dão, sempre me dá esta força. Por isso é que eu digo que ainda é um projecto bebé, mas hoje foi uma experiência boa e esperamos que daqui a algum tempo possam ver a "Amelle" desenvolvida.

Na Amelle pergunta “porque não”, questiona porque é que as mulheres não podem dançar à vontade, seja qual for o corpo que tenham. Em “Sinais Particulares” já falava da questão da mutilação genital feminina. São temas sempre muito fortes que você leva para o palco. Isto é um manifesto através do corpo, através da dança, para fazer pensar nos problemas que a mulher enfrenta?

Sim, eu acho que tem um grande poder, especialmente aqui [em França]. Por exemplo, quando eu falo sobre a mutilação genital feminina [espectáculo “Sinais Particulares”] aqui é um enigma. As pessoas ficam tipo: “Mas isso acontece?”. E neste novo projecto também senti que as pessoas se questionavam muito. Então, sim, eu sinto que é um manifesto, sim. Eu não gostava de dizer que é uma linhagem que eu prefiro ter porque não é, mas as coisas têm esse sentido de sempre falar da mulher e aceitar que são motivações que vêm, são assuntos que talvez me perturbem ou que me dão vontade de pôr no palco. Como sou artista, tenho essa oportunidade de poder falar sem medo, sem nenhum receio e poder expressar aquilo que sinto.

Quando diz manifesto, é um manifesto de quê?

Da força da mulher, principalmente da mulher africana, porque eu venho de uma realidade completamente diferente e estou a actuar para outra comunidade que é também totalmente diferente. Vai fazer um ano que eu saí de Moçambique - não saí totalmente, mas tenho frequentado muito a França - e sinto que há uma diferença em relação à mulher. Por exemplo, eu agora aqui percebi que o tempo de “duração” da artista moçambicana e da artista aqui da Europa é diferente. As africanas quando chegam aos 35 já não dançam, mas aqui fui perceber que tenho colegas que dançam muito bem até aos 58 anos. Então me questiono também porquê? Este lugar da mulher é um assunto que eu sempre vou comentar nos meus projectos. Espero que não seja sempre, mas se eu sentir que é pertinente, vou mesmo abordar esses assuntos porque são assuntos que me preocupam. Preocupa-me também sendo uma mulher artista e também estou a caminho da idade avançada e tenho muitas questões sempre.

Está em França há um ano. Como é que França se tem inscrito no seu percurso? Como é que os palcos e as residências em França a têm ajudado?

Tem ajudado bastante. Houve “Black Lights” da Mathilde Monnier, cheguei aqui e era tudo novo. Mas comecei com “Sinais Particulares”, tive uma residência no Centro Nacional de Dança, eles gostaram bastante e convidaram-me de novo. Agora também acho que gostaram, então acho que vai ser muito bom. É bom ter um parceiro como o Centro Nacional de Dança de Paris que conhece o meu trabalho. É sempre bonito. A ideia é continuar a trabalhar para que mais pessoas me conheçam, para que eu saia da Mathilde Monnier bailarina e vire a Mai-Júli moçambicana e francesa também agora.

Bailarina e coreógrafa…

E coreógrafa agora! Eu nunca imaginei!

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“Amelle” é o segundo projecto a solo da bailarina e coreógrafa moçambicana Mai-Júli Machado que invoca as suas memórias de passagem de menina a mulher e denuncia as restrições impostas às bailarinas cujos corpos não cabem em normas. A peça foi apresentada, este sábado, na 3ª edição do evento “1 Km de Danse”, na região de Paris e volta a falar da “força da mulher” e da necessidade de as artistas se expressarem “sem medo” e de quebrarem silêncios em palco.

Cerca de um mês depois de ter apresentado “Sinais Particulares” em Paris e quase um ano depois de se ter estreado em França na peça “Black Lights” de Mathilde Monnier, a bailarina e coreógrafa Mai-Júli Machado foi convidada pelo Centre National de la Danse para mostrar um novo projecto durante o festival "1 Km de Danse”, em Pantin. Foi neste sábado que a moçambicana levou a um jardim público a peça "Amelle" que fala sobre a “força da mulher” e a necessidade de se quebrarem silêncios em palco.

RFI: Como é que nos poderia descrever o espectáculo Amelle?

Mai-Júli Machado, Coreógrafa e bailarina: O espectáculo "Amelle" fala sobre a mulher – eu gosto muito de falar sobre as mulheres - e eu convido as mulheres a despertarem a "Amelle" que existe dentro delas.

O que é a Amelle?

"Amelle" [A.M.E.L.L.E] quer dizer Atitude, Maturidade, Elegância, Legado, Liberdade e Esperança. São seis palavras-chave em que eu me inspiro para convidar todas as mulheres a despertarem a Amelle que existe dentro delas.

Essas palavras são muito fortes e o espectáculo é também um manifesto pela liberdade, como têm sido até agora os espectáculos em que tem participado, sobretudo pela liberdade das mulheres. Neste espectáculo, você diz “porque não?” e repete a palavra “Não” constantemente. O que quer dizer este "Não"?

Este é o meu segundo projecto e eu sempre busco coisas ou experiências que aconteceram comigo. Realmente isto também me aconteceu…

É o seu segundo projecto em nome próprio, mas estreou-se em França num espectáculo de Mathilde Monnier, que esteve no Festival de Avignon e que já falava sobre a violência feita às mulheres…

Sim, talvez por ter sido a primeira peça em que eu participei, motivou-me sempre a falar da mulher. Não é que eu seja feminista, mas sinto-me inspirada. Eu começo o espectáculo a dizer que há uma pequena história no meu país, Moçambique, onde quando estás na fase da adolescência, quando estás a sair dos 11 para os 12 anos, começam a sair os peitos. Tem um mito que diz que a nossa irmã mais velha tem que nos varrer, com uma vassoura de palha mesmo, “varrer o peito”, que é para o peito não crescer. Eu fiz isso, por exemplo. Eu era bailarina e tinha esse complexo de ter que saltar e os meus peitos sempre a mexerem e olhava para o lado e a minha colega com os peitos pequenos estava à vontade.

Eu afirmo “porque não?”, ou seja, porque é que eu, com os meus peitos, não posso dançar à vontade e não posso saltar? Também a mulher africana que dizem que tem um corpo um bocadinho avantajado, que tem uns peitos maiores, a bunda também, quando salta, ela sempre tem os peitos a abanar. Então é por isso que eu digo “porque não?”. Porque é que não pode? Por que é que não pode ser normal dançar ballet, por exemplo, e os peitos também saltarem. É um jogo de pesquisa sobre porque é que não pode ser.

Porque é que a mulher não tem mais liberdade e porque é que a bailarina não pode dançar, seja que corpo tiver?

Exactamente, e sem nenhum complexo também. O projecto Amelle parte daí e ainda é um projecto que está a começar.

Como é que começou o projecto? Foi um convite para vir a este festival, “1 Km de Danse”, do Centro Nacional de Dança de Pantin, que levou ao nascimento do projecto ou já vinha de antes?

Este projecto começou no Senegal. Eu fiz uma formação na École des Sables, era um grupo de dez africanos e disseram-nos para cada um fazer qualquer coisa. As minhas peças sempre começam assim mesmo, alguém que diz “faz qualquer coisa”. Coloquei lá uma música de ópera e porquê ópera? Não sei. Tenho um amor pela música clássica e gosto também porque é um material diferente, para mim, sendo africana, que aprendi a fazer as danças tradicionais, de repente, estou a colocar uma ópera naquilo que é a minha técnica que não é clássica. Depois do Senegal, nunca mais fiz, mas as pessoas diziam para continuar. Então eu disse porque não buscar aquela ideia? E parece que foi interessante, as pessoas estavam mesmo concentradas, acho que foi uma boa experiência e motivação para eu realmente pensar em continuar.

Porquê ópera? Qual é a energia que essa música lhe traz e que a leva a querer dançar com ela?

A questão da música nos meus projectos é sempre um lugar muito sensível porque eu sempre penso que para criar um projecto tem que ter uma ligação. Se formos a ver, a letra não tem nada a ver com o que eu estou a falar, mas encanta-me muito. Tenho uma paixão imensa pela música clássica e não só. Também me desafia porque eu estou habituada a fazer movimentos sempre muito rápidos, muito batidos no chão, dança tradicional, e é uma música muito calma que me desafia a chegar a um material muito sensível que é esta coragem e força do “porque não”, mas também é a sensibilidade da mulher e não só.

A pergunta “Porque não?” surge antes de passarmos para uma música dos Madredeus. Porquê esta música?

Exactamente. Eu já tinha dito que há o enigma das músicas, também por ser um projecto que ainda está em andamento, ainda não tive nenhuma residência, pensei em casa e decidi fazer, ou seja, ainda não é definitivo. Mas porquê Madredeus? Porque descobri que amo muito o fado e escuto muitas músicas dos Madredeus. E encantou-me o material, a música. Ainda é um enigma, mas motiva-me… E tudo que fui fazendo ali, foi mesmo um improviso. Claro que eu tenho uma ideia, tenho uma motivação, mas depois o que acontece é mesmo ali. Se me forem dizer para repetir, não vou repetir exactamente como foi. É muito improviso. Por isso é que eu gosto muito de uma música que me motive, que me dê o impulso para poder criar ali.

E qual é a linha de força desse improviso?

A linha de força são as memórias da infância e também o público ajuda muito. Eu estava com muito receio, no início, porque cheguei e vi que era um jardim e que era um público com crianças, jovens, adultos. Quando comecei, estava meio com receio. Comecei como uma música moçambicana e percebi que assim que comecei a cantar as pessoas estavam mesmo em silêncio. As crianças olhavam. Então, para além de ser a música que me dá esse impulso, as pessoas também ao meu redor, a energia, a atenção que elas dão, sempre me dá esta força. Por isso é que eu digo que ainda é um projecto bebé, mas hoje foi uma experiência boa e esperamos que daqui a algum tempo possam ver a "Amelle" desenvolvida.

Na Amelle pergunta “porque não”, questiona porque é que as mulheres não podem dançar à vontade, seja qual for o corpo que tenham. Em “Sinais Particulares” já falava da questão da mutilação genital feminina. São temas sempre muito fortes que você leva para o palco. Isto é um manifesto através do corpo, através da dança, para fazer pensar nos problemas que a mulher enfrenta?

Sim, eu acho que tem um grande poder, especialmente aqui [em França]. Por exemplo, quando eu falo sobre a mutilação genital feminina [espectáculo “Sinais Particulares”] aqui é um enigma. As pessoas ficam tipo: “Mas isso acontece?”. E neste novo projecto também senti que as pessoas se questionavam muito. Então, sim, eu sinto que é um manifesto, sim. Eu não gostava de dizer que é uma linhagem que eu prefiro ter porque não é, mas as coisas têm esse sentido de sempre falar da mulher e aceitar que são motivações que vêm, são assuntos que talvez me perturbem ou que me dão vontade de pôr no palco. Como sou artista, tenho essa oportunidade de poder falar sem medo, sem nenhum receio e poder expressar aquilo que sinto.

Quando diz manifesto, é um manifesto de quê?

Da força da mulher, principalmente da mulher africana, porque eu venho de uma realidade completamente diferente e estou a actuar para outra comunidade que é também totalmente diferente. Vai fazer um ano que eu saí de Moçambique - não saí totalmente, mas tenho frequentado muito a França - e sinto que há uma diferença em relação à mulher. Por exemplo, eu agora aqui percebi que o tempo de “duração” da artista moçambicana e da artista aqui da Europa é diferente. As africanas quando chegam aos 35 já não dançam, mas aqui fui perceber que tenho colegas que dançam muito bem até aos 58 anos. Então me questiono também porquê? Este lugar da mulher é um assunto que eu sempre vou comentar nos meus projectos. Espero que não seja sempre, mas se eu sentir que é pertinente, vou mesmo abordar esses assuntos porque são assuntos que me preocupam. Preocupa-me também sendo uma mulher artista e também estou a caminho da idade avançada e tenho muitas questões sempre.

Está em França há um ano. Como é que França se tem inscrito no seu percurso? Como é que os palcos e as residências em França a têm ajudado?

Tem ajudado bastante. Houve “Black Lights” da Mathilde Monnier, cheguei aqui e era tudo novo. Mas comecei com “Sinais Particulares”, tive uma residência no Centro Nacional de Dança, eles gostaram bastante e convidaram-me de novo. Agora também acho que gostaram, então acho que vai ser muito bom. É bom ter um parceiro como o Centro Nacional de Dança de Paris que conhece o meu trabalho. É sempre bonito. A ideia é continuar a trabalhar para que mais pessoas me conheçam, para que eu saia da Mathilde Monnier bailarina e vire a Mai-Júli moçambicana e francesa também agora.

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