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França enriquece com estudantes estrangeiros visados em nova lei sobre imigração

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Reitores de universidades, juristas, artistas e empresários protestam contra a nova lei sobre imigração aprovada na Assembleia Nacional francesa no início da semana. Várias petições públicas estão sendo publicadas em jornais e sites repudiando um projeto de lei "indigno" e "vergonhoso". Um estudo de 2022 da agência Campus France, subordinada ao ministério do Ensino Superior, mostrou que os estudantes estrangeiros dão um retorno financeiro de € 1,3 bilhão (R$ 7 bilhões) por ano à França.

A nova lei contém uma série de medidas para inibir a chegada de migrantes ao país e dificultar a vida daqueles que já moram aqui. Um dos artigos cria, por exemplo, um depósito em dinheiro, uma espécie de caução, para estudantes de fora da União Europeia, como os brasileiros. Um abaixo-assinado lançado por reitores pedindo a revogação desse artigo recebeu, em poucas horas, a adesão de mais de 60 universidades públicas em todo o país.

Outra petição, lançada pelo jornal L'Humanité, que pede ao presidente da República, Emmanuel Macron, que não promulgue o texto aprovado, já recebeu mais de 11 mil assinaturas, entre elas de dezenas de escritores e cineastas, assim como das prefeitas de Paris e de Lille.

Os presidentes das maiores escolas privadas de finanças, administração e engenharia, que formam dirigentes de multinacionais, executivos, a elite profissional e tecnológica do país, estão furiosos, dizendo que a França vai perder competitividade internacional. Criar entraves para universitários estrangeiros, que contribuem para a diversidade e a riqueza do debate acadêmico, é um "contrasenso", uma "aberração", dizem os reitores. Se a medida for mantida, os estudantes vão se direcionar para outros países.

A França acolhe hoje 5,1 milhões de estrangeiros legais, o que representa 7,6% da população, e abriga mais de meio milhão de refugiados. As autoridades do país estimam que existam entre 600 mil e 700 mil pessoas em situação irregular.

Essa lei foi aprovada porque o governo de centro-direita de Macron, sem maioria absoluta na Assembleia Nacional e com um Senado dominado pela direita, cedeu à pressão dos populistas. Um número considerável de artigos são considerados xenófobos, mas há anos eram defendidos por partidos de direita e extrema direita, sob o pretexto da “preferência nacional”, ou seja, a França para os franceses.

Diante da indignação generalizada, Macron reconheceu que um depósito de caução para estudantes estrangeiros “não era uma boa ideia”. A ministra do Ensino Superior, Sylvie Retailleau, chegou a pedir demissão, mas o presidente pediu a ela para ficar no cargo.

Uma das hipóteses para atenuar o impacto dessa medida é atribuir um valor simbólico para essa caução, de € 10 a € 20, ou seja, de R$ 50 a R$ 110 reais por ano. Mesmo assim, a estigmatização dos estudantes estrangeiros não passa.

Estudo desmente argumentação de populistas

Um estudo de 2022 da agência Campus France, subordinada ao ministério do Ensino Superior, mostrou que a França ganha ao atrair estudantes de outras nacionalidades, inclusive de fora da União Europeia.

As universidades francesas recebem por ano 400 mil estudantes estrangeiros, incluindo os que vivem aqui com suas famílias e aqueles que vêm, fazem a faculdade e vão embora. Somando o que eles gastam com matrícula, moradia, alimentação, transporte, lazer e até contribuição social quando trabalham as 20 horas autorizadas por semana, um universitário estrangeiro gasta em média, por mês, € 867 euros, cerca de R$ 4.600 reais. Ou seja: eles geram para a economia francesa € 5 bilhões, enquanto representam € 3,7 bilhões de despesa pública. O estrangeiro enriquece a França. Os argumentos da direita e da extrema direita são populistas, essencialmente demagógicos.

Juristas especializados em Direito Constitucional apontam problemas graves no projeto de lei aprovado. O próprio governo admite a existência de 20 artigos com viés de inconstitucionalidade. Bertrand Mathieu, professor da escola de Direito da Sorbonne, disse ao jornal Les Echos que era “surrealista” deputados do partido governista terem votado a favor de artigos sabendo que são inconstitucionais. Ele destacou que a questão da política passar por cima da Justiça é um perigo para a democracia.

Entre as medidas que podem ser retocadas ou invalidadas pelo Conselho Constitucional estão, por exemplo, a de filhos de estrangeiros nascidos na França. Eles precisarão entrar com um pedido de naturalização entre os 16 e os 18 anos, e podem ter esse pedido negado.

Outra medida controversa é a fixação de quotas anuais de imigrantes pelo Senado e a Assembleia, que discriminaria estrangeiros entre eles e fere o artigo 34 da Constituição.

A restrição imposta ao auxílio moradia (APL), que ficará mais difícil de obter, está sendo muito criticada. Será preciso justificar três meses de trabalho para quem tem emprego e cinco anos de vida na França para quem não trabalha.

O corte do benefício dado aos idosos estrangeiros também é um ponto muito controverso. Até agora, mais de 32 áreas governadas pela esquerda no país já anunciaram que não vão adotar a medida, em uma ação de desobediência civil.

Por que Macron decidiu encampar medidas da extrema direita?

Macron venceu a adversária de extrema direita Marine Le Pen nas duas eleições presidenciais, em 2017 e em 2022, mas com uma vantagem bem menor no ano passado. Neste segundo mandato, sem maioria no Parlamento, o governo decidiu se aliar com a direita e atraiu para si até pautas da extrema direita, para mostrar para seu eleitorado de base, conservador, que era capaz de tomar decisões pragmáticas. Mas com essa estratégia, ele acabou fortalecendo as ideias de Marine Le Pen.

No caso da líder de extrema direita, ela vive um momento privilegiado: pode dar as cartas na Assembleia, à frente de uma bancada de 89 deputados. Explora, com um discurso banalizado, as pautas históricas do partido que herdou do pai: a França soberana, dura com os imigrantes, principalmente muçulmanos, vistos como bodes expiatórios da violência, da insegurança e até do declínio do país.

Nesse momento, os dois rivais estão em campanha, já que em junho haverá eleições para o Parlamento Europeu. De tanto adotar um discurso semelhante ao da adversária, mas dizendo “eu farei melhor”, Macron está sendo acusado de servir de trampolim para a extrema direita.

Não foi à toa que Marine Le Pen pôde comemorar esta semana “uma vitória ideológica”, com a “preferência nacional” consagrada na nova lei sobre imigração.

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A nova lei contém uma série de medidas para inibir a chegada de migrantes ao país e dificultar a vida daqueles que já moram aqui. Um dos artigos cria, por exemplo, um depósito em dinheiro, uma espécie de caução, para estudantes de fora da União Europeia, como os brasileiros. Um abaixo-assinado lançado por reitores pedindo a revogação desse artigo recebeu, em poucas horas, a adesão de mais de 60 universidades públicas em todo o país.

Outra petição, lançada pelo jornal L'Humanité, que pede ao presidente da República, Emmanuel Macron, que não promulgue o texto aprovado, já recebeu mais de 11 mil assinaturas, entre elas de dezenas de escritores e cineastas, assim como das prefeitas de Paris e de Lille.

Os presidentes das maiores escolas privadas de finanças, administração e engenharia, que formam dirigentes de multinacionais, executivos, a elite profissional e tecnológica do país, estão furiosos, dizendo que a França vai perder competitividade internacional. Criar entraves para universitários estrangeiros, que contribuem para a diversidade e a riqueza do debate acadêmico, é um "contrasenso", uma "aberração", dizem os reitores. Se a medida for mantida, os estudantes vão se direcionar para outros países.

A França acolhe hoje 5,1 milhões de estrangeiros legais, o que representa 7,6% da população, e abriga mais de meio milhão de refugiados. As autoridades do país estimam que existam entre 600 mil e 700 mil pessoas em situação irregular.

Essa lei foi aprovada porque o governo de centro-direita de Macron, sem maioria absoluta na Assembleia Nacional e com um Senado dominado pela direita, cedeu à pressão dos populistas. Um número considerável de artigos são considerados xenófobos, mas há anos eram defendidos por partidos de direita e extrema direita, sob o pretexto da “preferência nacional”, ou seja, a França para os franceses.

Diante da indignação generalizada, Macron reconheceu que um depósito de caução para estudantes estrangeiros “não era uma boa ideia”. A ministra do Ensino Superior, Sylvie Retailleau, chegou a pedir demissão, mas o presidente pediu a ela para ficar no cargo.

Uma das hipóteses para atenuar o impacto dessa medida é atribuir um valor simbólico para essa caução, de € 10 a € 20, ou seja, de R$ 50 a R$ 110 reais por ano. Mesmo assim, a estigmatização dos estudantes estrangeiros não passa.

Estudo desmente argumentação de populistas

Um estudo de 2022 da agência Campus France, subordinada ao ministério do Ensino Superior, mostrou que a França ganha ao atrair estudantes de outras nacionalidades, inclusive de fora da União Europeia.

As universidades francesas recebem por ano 400 mil estudantes estrangeiros, incluindo os que vivem aqui com suas famílias e aqueles que vêm, fazem a faculdade e vão embora. Somando o que eles gastam com matrícula, moradia, alimentação, transporte, lazer e até contribuição social quando trabalham as 20 horas autorizadas por semana, um universitário estrangeiro gasta em média, por mês, € 867 euros, cerca de R$ 4.600 reais. Ou seja: eles geram para a economia francesa € 5 bilhões, enquanto representam € 3,7 bilhões de despesa pública. O estrangeiro enriquece a França. Os argumentos da direita e da extrema direita são populistas, essencialmente demagógicos.

Juristas especializados em Direito Constitucional apontam problemas graves no projeto de lei aprovado. O próprio governo admite a existência de 20 artigos com viés de inconstitucionalidade. Bertrand Mathieu, professor da escola de Direito da Sorbonne, disse ao jornal Les Echos que era “surrealista” deputados do partido governista terem votado a favor de artigos sabendo que são inconstitucionais. Ele destacou que a questão da política passar por cima da Justiça é um perigo para a democracia.

Entre as medidas que podem ser retocadas ou invalidadas pelo Conselho Constitucional estão, por exemplo, a de filhos de estrangeiros nascidos na França. Eles precisarão entrar com um pedido de naturalização entre os 16 e os 18 anos, e podem ter esse pedido negado.

Outra medida controversa é a fixação de quotas anuais de imigrantes pelo Senado e a Assembleia, que discriminaria estrangeiros entre eles e fere o artigo 34 da Constituição.

A restrição imposta ao auxílio moradia (APL), que ficará mais difícil de obter, está sendo muito criticada. Será preciso justificar três meses de trabalho para quem tem emprego e cinco anos de vida na França para quem não trabalha.

O corte do benefício dado aos idosos estrangeiros também é um ponto muito controverso. Até agora, mais de 32 áreas governadas pela esquerda no país já anunciaram que não vão adotar a medida, em uma ação de desobediência civil.

Por que Macron decidiu encampar medidas da extrema direita?

Macron venceu a adversária de extrema direita Marine Le Pen nas duas eleições presidenciais, em 2017 e em 2022, mas com uma vantagem bem menor no ano passado. Neste segundo mandato, sem maioria no Parlamento, o governo decidiu se aliar com a direita e atraiu para si até pautas da extrema direita, para mostrar para seu eleitorado de base, conservador, que era capaz de tomar decisões pragmáticas. Mas com essa estratégia, ele acabou fortalecendo as ideias de Marine Le Pen.

No caso da líder de extrema direita, ela vive um momento privilegiado: pode dar as cartas na Assembleia, à frente de uma bancada de 89 deputados. Explora, com um discurso banalizado, as pautas históricas do partido que herdou do pai: a França soberana, dura com os imigrantes, principalmente muçulmanos, vistos como bodes expiatórios da violência, da insegurança e até do declínio do país.

Nesse momento, os dois rivais estão em campanha, já que em junho haverá eleições para o Parlamento Europeu. De tanto adotar um discurso semelhante ao da adversária, mas dizendo “eu farei melhor”, Macron está sendo acusado de servir de trampolim para a extrema direita.

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